Bruno Garschagen
Foram os líderes considerados “moderados e
capazes” e seus antecessores os corresponsáveis pelo fracasso do atual modelo
político, não os populistas
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Obama e Merkel, foto: Mandel Ngan/AFP |
É preciso tomar muito cuidado
ao analisar fenômenos políticos como Marine Le Pen, Geert Wilders e Donald
Trump para que essa análise não pareça um endosso. E analisá-los é constatar
que existe um problema sério e profundo a partir do qual emergiram. Pois são
eles frutos da decepção de uma parcela numerosa da sociedade em relação aos
políticos e ao tipo de política que eles representam. São eles também filhos da
decadência civilizacional que ascenderam publicamente por se apresentarem à
sociedade como soluções de enfrentamento dessa própria degradação.
Sim, líderes políticos que
ascenderam publicamente sob os escombros do que resta de civilização podem
apresentar um diagnóstico parcialmente correto do problema. Isso não significa
que eles próprios sejam – ou tenham – as respostas. Também não significa que
sejam eles os causadores do problema ou sejam o próprio problema, como nos quer
fazer acreditar o establishment político, intelectual e jornalístico.
Políticos
do mainstream evitaram lidar,
enfrentar e até falar sobre problemas centrais
Em janeiro deste ano, escrevi
aqui na Gazeta do Povo sobre o relatório “Tendências Globais: Paradoxos do Progresso”.
As propensões apresentadas para os próximos anos (aumento do risco de conflitos
internacionais, terrorismo e baixo crescimento econômico) eram o atestado
público do fracasso dos políticos de hoje e da forma de fazer política.
Quem foram os artífices desse
estado de coisas? Os “populistas” que nunca antes estiveram na cadeia de
comando para definir os rumos da situação? Não. Foram os líderes considerados
“moderados e capazes” e seus antecessores, apoiados e legitimados por
intelectuais e pela grande imprensa, os corresponsáveis pelo fracasso do atual
modelo político e da forma de fazer política.
Políticos do mainstream,
por covardia, ignorância ou concordância, evitaram lidar, enfrentar e até falar
sobre problemas centrais, como os riscos advindos da imigração em massa de
muçulmanos. Ou porque não quiseram assumir o ônus político de enfrentar a
patrulha ou porque discordam que haja uma questão a ser resolvida. As pessoas,
entretanto, não são idiotas.
Concordo com o João Pereira
Coutinho quando ele afirmou em texto recente que “o populismo não nasce do
vazio. (...) Há pessoas reais, apesar de invisíveis, que procuram respostas
fáceis, enganosas, virtuosas, para estas vidas de naufrágio lento”. Os políticos
do mainstream provocaram o naufrágio e os líderes populistas não parecem
ser os comandantes mais indicados para salvar os náufragos.
Um exemplo recente e simbólico
é Marine Le Pen. A candidata da Frente Nacional perdeu a eleição presidencial
também para suas próprias fragilidades. A parte da sua agenda política que
poderia ser tida como benéfica (a defesa da cultura francesa contra seus
inimigos muçulmanos, banimento de todas as organizações ligadas a
fundamentalistas islâmicos, expulsão de pessoas ligadas ao terrorismo) foi
obscurecida por sua inabilidade de apresentar um plano que não parecesse um
projeto de poder autoritário. Culpar a grande imprensa não pode ser um álibi
permanente para eximir-se de suas próprias vicissitudes.
Como tanta gente pôde
considerá-la uma candidata adequada para, a considerar a razão do endosso,
lutar contra os muçulmanos nativos e estrangeiros que querem converter a França
numa sucursal da Tunísia? Simples: era ela ou o vencedor Emmanuel Macron. Não
foi uma escolha; foi maldição.
Por isso é que se colocar
nesse debate adotando ingenuamente um dos lados inviabiliza a criação de uma
alternativa intelectual e política substantiva e qualificada, de uma nova elite
que tenha coragem de identificar, de falar e de resolver as questões mais
difíceis.
Enquanto os incautos
limitarem-se a firmar posições e acusar quem não o faz de “isentão”, quem se
informa apenas pelas redes sociais terá seu imaginário político destruído ao
achar que quem esbraveja mais é o portador da verdade suprema. E, nessa disputa
por quem comete mais bravatas, a primeira baixa é a da inteligência.
Título e Texto: Bruno Garschagen, Gazeta do Povo, 15-5-2017
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