quarta-feira, 25 de março de 2020

[Pensando alto] Eu recluso, e Bolsonaro e Trump emparedados

Pedro Frederico Caldas

80 a 90% dos que pegarem o coronavírus terão um resfriadinho.
Dr. Drauzio Varella, médico

85% dos que pegarem o vírus terão uma gripe.
Dr. Rui Costa, médico e governador petista da Bahia

É a economia, estúpido.
James Carville

A bem da verdade, que sempre procuro não esconder, o Dr. Drauzio Varella, preocupado, emitiu novo vídeo, dando o dito pelo não dito. Esse trepidante recuo para mim nada muda porque isso é praticamente um consenso nos meios médicos, comprovado pela que vem acontecendo ao redor do mundo nos últimos meses. Todavia, não vou me ater a esses aspectos da pandemia porque médico não sou e minhas preocupações são outras.
Estando naquela faixa de risco de 10 a 15% da população, enclausurei-me.

Tinha passagem paga, hotel reservado, para ir ao Brasil no dia 19 deste mês. Cancelei porque assim o bom senso mandava e para atender ao apelo dos filhos que abdicavam, em nome da nossa segurança, da ânsia de reencontrar os pais. Há mais de duas semanas minha filha e meus netos não têm vindo aqui, para nos preservar de qualquer contágio. Para congraçar com os amigos e parentes usamos smartphones e computadores. Temos feito com filha, filhos, noras, genro e netos reuniões cibernéticas, chamadas pomposamente de “conference calls”.
               
Assim como para a maioria dos americanos em nossa faixa etária, nosso enclausuramento (quem vive confinado é gado, não eu) não é penoso, particularmente para mim que adoro ficar em casa fazendo o que gosto. Faz-me falta ir a um restaurante, à casa dos amigos ou aqui os receber. O resto não passa de pequenos incômodos.
               
Na faixa dos 65 anos ou mais, quase todos já estão aposentados e tem condições mínimas, por isso mesmo, de sobreviver sem o trabalho. Há os que, embora aposentados, precisam complementar a receita trabalhando fora. Entretanto, para os que estão na faixa de risco, o importante é sobreviver. Contas que não podem ser atendidas com a aposentadoria ficam para depois porque não estamos vivendo tempos normais e credores sabem das dificuldades à frente e, querendo ou não, vão ter que ser pacientes com os seus devedores. Tudo depois se resolverá.
               
Dito isso, vamos ao que interessa. É sensato emparedar, desligar, fazer o lockdown de toda atividade econômica por tempo superior a duas ou três semanas?
               
Ontem assisti a entrevista de dois ícones da gastronomia americana, os chefes Wolfgang Puck e Keller. Wolfgang Puck chamou atenção para o fato de o setor ser o maior empregador privado dos Estados Unidos com o número de 15 milhões e 600 mil pessoas. Esse setor agrega bem mais de um trilhão de dólares à economia americana. Está quase que completamente paralisado. Os inúmeros outros setores estão na mesma situação.

No meio de mais de uma centena de milhões, fiquemos num simples caso, que também se conta pelos milhões. Um garçom, pelo fechamento do restaurante, foi para casa com o pagamento da semana trabalhada no bolso. De ordinário o que um trabalhador desse ganha vai, como se diz no interior da Bahia, da mão para a boca sem passar sequer pelo bolso.
               
De que vai viver esse cidadão?
               
Um desavisado, ignorante das coisas e das leis da Economia, há de dizer que o governo proverá. Ledo engano, amigo, nenhum governo tem recursos para gastar com as emergências de uma epidemia e sustentar todas ou quase todas pessoas que estão paradas. Por sinal, breve os cofres públicos estarão vazios pelo fato de não haver impostos a pagar, como consequência da paralização das atividades econômicas, ou porque, quem tiver imposto a pagar, vai reter no todo ou em parte o valor pelo natural instinto de primeiro atender às necessidades da própria sobrevivência. Abril vem aí, o imposto de renda será declarado e quase ninguém terá condições de recolher o valor devido aos cofres públicos. O Estado ficará de chapéu nas mãos.
               
Isso é uma verdade tão cediça que não demanda maiores exemplos ou explicações. Se alguém acha que não será assim, traga seus argumentos que terei o maior prazer em analisá-los.
               
Alguém, já a esta altura, há de me indagar qual é a solução.
               
Não sei e ninguém sabe, mas uma coisa é certa: como está é insustentável e só fará dramatizar uma situação que se apresenta como um caso médico, mas com explosivo potencial de se transformar, pela paralização das atividades, numa hecatombe econômica.
               
Parece-me sensato que os esforços não só do governo, mas também da sociedade como um todo se devem dirigir aos verdadeiramente vulneráveis, ou seja, aos idosos e aos de saúde debilitada. Isso fará com que as medidas econômicas saiam do círculo do 100% da população para os limites dos 10 a 15% dos vulneráveis.
               
Há sempre o mau caráter que brandirá a chantagem moral (moral blackmail) com o argumento falacioso de que salvar um velhinho sequer já vale o desastre que se desenha.
               
Esse tipo de gente, ordinariamente movida por impulsos e interesses que não cabe ora aqui discutir, não merece a menor atenção num momento tão grave como este.
               
Bem sei que será praticamente impossível isolar todos os 10 a 15% vulneráveis, entretanto, isso será possível fazer com a grande maioria permanecendo em casa. Os leitos hospitalares, na medida do possível, atenderão àqueles, dessa faixa, atingidos pelos vírus.

Também bem sei que muitos vão morrer. Sei e todo mundo intelectualmente honesto sabe que sempre haverá, em qualquer hipótese que se apresente, numa tragédia como essa, um preço a pagar.
               
Poderia, sabendo que as pessoas de ordinário têm bom senso, parar por aqui. Todavia, se parasse, ficaria no ar o que Bolsonaro e Trump têm a ver com tudo isso.     

Outros, desatentos das sutilezas dos significados alegóricos da linguagem, diriam que Bolsonaro e Trump se emparedaram para afastar o risco de serem contagiados.

Não. Não se trata disso. Tanto Trump como Bolsonaro, a exemplo de muitos outros chefes de Estado, estão bravamente na linha de frente, expondo a própria saúde, eis que estão na faixa etária de alto risco, principalmente o mais velho Trump, para lutar bravamente contra essa adversidade.

A tentativa de emparederar Trump, vem de seus adversários políticos empedernidos, principalmente da manjadíssima turma da esquerda, usando argumentos falaciosos, completamente divorciados da realidade dos fatos, às vezes tolos, aproveitando-se de uma tragédia nacional, para obter, como sempre, dividendos políticos. Isso, sem tirar nem pôr, se repete no Brasil contra Bolsonaro.

A economia dos Estados Unidos que ia bem, dando quase que por garantida a reeleição de Trump, assim como a economia brasileira que já começava a se mover para cima, entrarão, por força da paralização econômica, por um tempo difícil de se prever, em recessão, ou, até, se as atividades não forem logo retomadas, em depressão, gerando uma coorte de miséria que a todos atingirá.

Trump, ontem, sempre atento ao conjunto dos problemas, que não é só epidemiológico, já sinalizou que as atividades deverão ser plenamente reativadas até o dia 12 de abril.

O Brasil, por ser, em todos aspectos, mais vulnerável que os Estados Unidos, acho que deveria voltar a trabalhar um pouco antes.

Considero que Bolsonaro está certo. Sua visão de chefe de Estado deve focar além do espaço focado por uma restrita visão médica.

Em qualquer das hipóteses ele deverá perder politicamente. Se determinar a volta ao trabalho, os mortos serão levados à sua conta; se perseverar na paralização das atividades, o desastre econômico lhe será debitado.

Para finalizar, quero realçar que eminentes especialistas, das mais diversas escolas médicas, têm endossado o que acima foi dito pelos dois médicos citados, tanto o médico repórter da Rede Globo, como o médico petista que, por descuido político ou pela responsabilidade de governador, tirou o chapéu de político e colocou o chapéu de profissional da medicina.
               
Por aqui me precavendo, desejo a todos muita precaução, muita sorte, um bom dia, e saúde.
Título e Texto: Pedro Frederico Caldas, 25-3-2020

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