sexta-feira, 2 de maio de 2014

Getúlio Vargas: 60 anos do Brasil sem rumo

Miguel Castelo Branco

Cumprem-se em 2014 seis décadas sobre a morte de Getúlio Vargas. Pediu-me um amigo, docente numa universidade brasileira, que sobre Getúlio escrevesse umas linhas, destacando as similitudes (hoje muito contestadas) entre o Estado Novo de Vargas e o Estado Novo de Oliveira Salazar. Contentar-me-ei em enviar-lhe dentro de dias umas quantas linhas sobre as relações luso-brasileiras no período que medeia entre o pré-guerra e a primeira saída de Getúlio do poder, em 1945.

Quando, por força das perseguições hitlerianas, Stefan Zweig se estabeleceu no Brasil, foi tomado de verdadeiro entusiasmo por aquele país de dimensões continentais e riquezas inexauríveis que o condenavam ao melhor dos futuros. Em homenagem ao país-irmão, escreveria Brasil, País do Futuro. O entusiasmo de Zweig era claramente suscitado por Getúlio Vargas, estadista a quem o Brasil terá ficado a dever a finalização jurídica e administrativa do Estado, até então jugulado pelo apetite das oligarquias localistas. Autoritário e ditatorial na sua fase inicial (1930-45), Getúlio - que gozava de apoio popular incontestado - voltaria ao poder democraticamente em 1950. Foi graças a Getúlio que o Brasil, até aí uma enorme plantação de café e borracha, ascendeu à plena independência económica. A criação da siderurgia e, mais tarde da PETROBRAS, caboucos da industrialização em programa de nacionalismo desenvolvimentista, permitiriam àquele país furtar-se da colonização económica norte-americana. Se as grandes realizações materiais incluíram as obras públicas, a criação da indústria pesada, a rede hidroeléctrica, a agro-indústria e a mineração voltadas para o mercado mundial, nas realizações imateriais ou intangíveis poderão elencar-se o modelo de ensino aplicado, o estímulo à investigação científica e tecnológica, a criação de um corpo de quadros técnicos que dispensaram a ingerência da assessoria estrangeira. Vargas assinalou o caminho. Infelizmente, o Brasil parece não ter tido capacidade para acompanhar o visionarismo daquele homem de excepção.

Perdeu-se o rumo, a racionalidade e, sobretudo, a voz de comando. De Getúlio parece só não terem gostado os paulistas, os integralistas e os comunistas: os paulistas, derrotados na Revolução de 1932, perderam o monopólio de poder que exerciam sobre o Estado desde a implantação da república; os integralistas de Plínio Salgado e os comunistas de Prestes por se lhes ter escapado a oportunidade de ouro para ali ensaiarem as respectivas utopias. Vargas foi o centro, o justo termo, congraçador de vontades, o protector dos pobres e o promotor de elites respeitadas e respeitadoras.
Título e Texto: Miguel Castelo Branco, Combustões, 02-05-2014

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