domingo, 11 de setembro de 2022

O tabuleiro da democracia brasileira: o que precisa mudar

O país precisa ser repensado - começando pelo Congresso

Maria Helena Santos

Se existe hoje uma certeza dominante no coração dos brasileiros, ela é a de que o Brasil precisa mudar. E mudar rápido. Gerações antes de nós – e mesmo a nossa própria – cresceram com a esperança de que o Brasil seria o país do futuro, ainda que, no presente de cada época, as coisas não corressem tão bem quanto todos gostariam.

Mas, infelizmente, a sociedade brasileira abraçou cada vez mais a ideologia da dependência do estado, esperando de forma exagerada que essa entidade abstrata cumprisse a obrigação de prover as necessidades humanas, mesmo quando isso superava os limites da viabilidade. Como resultado, surgiram entre nós lideranças políticas de caráter cada vez mais populista, com promessas impossíveis e absurdas, amparadas na ingenuidade do povo.

Com a Constituição de 1988, instaurou-se no Brasil uma democracia participativa. De fato, em seu artigo 1º, a Carta Magna garante que “todo o poder emana do povo”. Porém, o que temos visto nestas três décadas de redemocratização é uma distância crescente entre o povo e seus representantes. Tivemos pacotes econômicos desastrosos, confiscos, aumento da recessão e do desemprego, alguma expectativa e muita frustração. E a corrupção se institucionalizou.

A desigualdade econômica gerada por aqueles que usam suas conexões no governo para conseguir vantagens, proteção e subsídios é uma barreira que impede o progresso econômico da maioria da população. O filósofo francês Michel de Montaigne escreveu muitas obras sobre as instituições, e ao analisar o papel dos parlamentos numa sociedade, cunhou uma das suas mais célebres frases: “Nenhum governo está isento de legislar absurdos. O problema é quando tais absurdos são levados a sério”.

Em ano de eleições, os políticos discutem muitos disparates populistas em busca de votos. Entre os exemplos de propostas absurdas estão a revogação da reforma da Previdência, a anulação das privatizações e concessões realizadas, a volta do imposto sindical e muitos outros. Temos que ficar atentos para impedir que esses absurdos não sejam aprovados no Congresso Nacional. Não podemos andar para trás, nosso país tem de progredir! Daí a grande responsabilidade que temos na escolha dos nossos representantes. Nunca podemos esquecer que, formalmente, o Congresso dá a última palavra nas decisões, já que pode derrubar os vetos da Presidência.

O protagonismo da mudança, portanto, está nas mãos do eleitor. O governo geralmente só muda se é forçado a mudar. E o político em geral só muda de política quando sente que perde voto. O contraste da situação política e social brasileira em comparação com vários outros países gera uma incessante busca por respostas. Por que o Brasil é assim? Eu tenho uma série de conclusões, e a principal delas é que as lideranças que dominaram o cenário político nas últimas décadas sempre tiveram enorme desprezo pela liberdade econômica e preferiram acreditar que a saída possível para o desenvolvimento era o planejamento estatal da economia. Sabemos que não deu certo.

Enquanto a maior parte do mundo está se liberalizando, o Brasil continua do mesmo jeito. Temos alguns altos e baixos, mas em relação ao resto do mundo as coisas parecem não mudar tão rápido no nosso país. Praticamente o mundo todo se moveu na direção de menos impostos, mais privatizações, negócios mais livres, e o Brasil ainda tem muito a fazer em relação a isso. Por aqui, o maior violador da liberdade econômica das pessoas é o próprio estado. Quando o estado cobra impostos demais, quando faz regulações demais, torna nossa vida muito pior.

É sempre bom lembrar que o Brasil é um dos países mais protecionistas do mundo. Por aqui, chegam menos produtos e as informações circulam com mais lentidão que em outras economias. Sabe quando o brasileiro viaja e volta com a sensação de que no Brasil tudo é mais caro e com menos variedade? É porque a economia é fechada demais. Não é razoável que ter um carro “popular” (o modelo, e não o preço) ainda seja um símbolo de status no nosso país.

Sem contar o custo econômico de um parlamentar, reconhecidamente alto demais. Um senador custa, por ano, R$ 54 milhões. E um deputado federal custa R$ 11,3 milhões por ano. Mas o custo anual direto de cada parlamentar é o menor dos custos. Os piores e mais elevados são aqueles projetos aprovados ou não aprovados que possuem impacto no orçamento público. Projetos aprovados que agregam uma despesa recorrente, com viés estritamente populista, são o caminho para afundar uma nação.

Não podemos esquecer também do nosso Judiciário, que é sobrecarregado, moroso e ineficiente. A ação da Suprema Corte na legislação e a judicialização de casos que deveriam ser resolvidos em instâncias superiores prejudica o ambiente de negócios. Para piorar, há influências externas no Judiciário, o que nas cidades grandes é entendido como lobby, nas pequenas é intimidação.

O país tem dificuldade de implementar câmaras de arbitragem (uma instância para resolução de conflitos de forma não judicial) e fica preso na ineficiência sistêmica. É difícil decidir bem quando você tem que decidir sobre tudo. Para completar, o nosso Judiciário é um dos mais caros do mundo. Precisamos melhorar a gestão dos processos, automatizar tribunais, criar resoluções alternativas de litígios e reduzir o favoritismo na obtenção de sentenças e votos pode ajudar o Brasil a reduzir sua insegurança jurídica.

Essas são reflexões para termos em mente por causa do calendário eleitoral que se aproxima. E nunca podemos esquecer que quem manda no Brasil é o Congresso: ele virou um balcão de negócios de interesses particulares dos políticos. Se quisermos mudar o nosso país, mudar o Congresso é um bom ponto de partida.

Título e Texto: Marina Helena Santos é formada em Economia pela Universidade de Brasília, com mestrado na mesma universidade. Possui mais de 14 anos de experiência como economista no mercado financeiro em instituições como Itaú Asset, Banco Bradesco, Quest Investimentos, Mauá Capital e Bozano Investimentos. Foi diretora de Desestatização do Ministério da Economia em 2019 e também CEO do Instituto Millenium. É fundadora do Movimento Brasil Sem Privilégios. Revista Oeste, 11-9-2022, 16h45

Um comentário:

  1. Tudo. Inclusive o tabuleiro.
    Aparecido Raimundo de Souza
    de Vila Velha, no Espírito Santo ES

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