terça-feira, 20 de setembro de 2022

[Livros & Leituras] Le siècle des intellectuels

Au moment de l'Affaire Dreyfus, surgit la figure de "l'intellectuel" qui estime que son savoir et sa culture lui font obligation de prendre la parole pour dénoncer les injustices. Tout le long du siècle, des écrivains se veulent ainsi la voix publique de la conscience éthique et politique. Ce livre en dresse un panorama, à la fois instructif et agréable à lire.
André Gounelle, France, le 19 avril 2015


Esta história cronológica dos intelectuais (franceses) não é uma história de pessoas, de ideias, de obras, mas o relato dos seus confrontos, amizades ou ódios.
Através dos anos Barrès, os anos Gide, os anos Sartre, nos religamos à realidade – e o simbolismo – dos acontecimentos, redescobrimos a massa desses homens e dessas mulheres – grandes atores ou personagens secundários – que tentaram, com as suas ideias, seus manifestos ou seus gritos, influenciar a sua época.
Além das personagens desfila a história do século, desde o caso Dreyfus, que testemunhou o surgimento da palavra “intelectual”, à morte de Sartre ou de Aron, que pareceu marcar o fim para os intelectuais. Ainda que Michel Winock duvide…

O anticomunismo intelectual

Michel Winock

Na madrugada de 25 de junho de 1950, tropas da Coreia do Norte, de obediência soviética, transpõem o 38º paralelo e entram na Coreia do Sul, dirigida pelo pró-americano Syngman Rhee. A Coreia, libertada dos japoneses, tinha sido dividida em duas ao final da guerra, como a Alemanha, mas os Russos e os Americanos evacuaram suas forças armadas, instaladas de cada lado da “fronteira” desde janeiro de 1949.

A partilha da Coreia tornara-se um fato, as eleições livres não se realizaram na totalidade do território: se, no Sul, as urnas elegeram Syngman Rhee como presidente da República em 1948, no Norte, as eleições à “soviética” colocaram à frente do governo, Kim Il Sung.

Em 26 de junho, as tropas de Pyongyang estão às portas de Seul; o Conselho de Segurança da ONU (na ausência do delegado da URSS) ordena que recuem para o 38º paralelo. Pela primeira vez desde o começo da Guerra Fria, um confronto armado é deslanchado por uma autoridade política de um dos blocos contra um território do bloco adverso.


No dia seguinte, uma nova resolução da ONU, votada com sete votos a favor, um contra (Yugoslávia) e duas abstenções (Egito e Índia), convoca os membros da Nações Unidas a “enviar à República da Coreia toda a ajuda necessária a fim de repelir os assaltantes”.

No mesmo dia, 27 de junho, Raymond Aron alerta os seus leitores para “o acontecimento mais grave desde o fim da Segunda Guerra Mundial”. Acrescentando: “A agressão contra a Coreia do Sul não objetiva somente reconstituir a unidade coreana em benefício de Moscou, de estabelecer as posições soviéticas face às ilhas nipônicas, ela é um desafio lançado propositalmente aos Estados Unidos. Ela coloca os EUA perante uma alternativa grave: ou intervir numa guerra civil num país longínquo próximo de bases inimigas ou sofrer uma humilhação que acabaria por desencorajar os homens e os países aliados e redobraria a audácia do agressor. Na minha opinião, não duvido que a pior solução será a passividade.”

O desejo de Aron foi atendido. O presidente Truman decide fornecer armas ao governo de Seoul; o general MacArthur, no Japão, deve assegurar a entrega do material manu militari, depois apoiar as forças armadas sulistas pelas forças aéreas e navais. Truman pede a Moscou que interferira junto ao regime de Pyongyang para este recuar as suas forças armadas ao limite do 38º paralelo; os Soviéticos respondem que a agressão veio do Sul e que os norte-coreanos se obrigam a replicar. A guerra da Coreia vai durar três anos. Ela provoca uma intensificação da luta ideológica através do mundo, notadamente em França.

Para os comunistas e os compagnons de route, a tese da agressão sulista não se discute. Visto que a contraofensiva dos Sulistas, apoiados pelos americanos, resultou em outubro no atravessamento do 38º paralelo no sentido inverso, com a benção da ONU. A bandeira da paz é erguida pelos comunistas o mais alto que podem.

Desde março de 1950 todas as organizações comunistas foram mobilizadas para conseguir a adesão do maior número possível de pessoas ao Chamado de Estocolmo. Este, lançado pelo Movimento Internacional dos Combatentes pela Paz, teleguiado por Moscou, visava a “interdição absoluta da bomba atômica”. Os soviéticos explodiram a primeira bomba só em dezembro de 1949, um atraso considerável em relação aos Americanos.

Ao fustigar o horror nuclear, os comunistas pretendem criar um grande círculo de simpatia, enfraquecendo ao mesmo tempo a luta ideológica no campo ocidental. Os militantes se empenham desde o começo da primavera, coletando assinaturas nos meios das artes, das letras e do espetáculo: Pierre Benoit, Armand Salcrou, Marc Chagall, Marcel Gromaire, Pierre Renoir Gérard Philipe, Marcel Carné, Jacques Prévert, Maurice Chevalier…

A guerra da Coreia reforçando os temores de uma nova guerra mundial, o Chamado de Estocolmo se torna um sucesso, alguns milhões de franceses assinam (14 milhões, segundo a exagerada estimativa do PCF).

Laurent Casanova, encarregado em França dos intelectuais comunistas, teve a ideia de pedir um desenho a Picasso. Surgiu a famosa pomba que ilustrou os cartazes da campanha pela paz e se tornou o emblema universal. 



E melhor ainda, convenceu Frédéric Joliot-Curie, professor do Collège de France e prêmio Nobel de Química, a aceitar a presidência do Movimento pela Paz. Sedutor, sensível às honrarias, notável internacional dos congressos científicos, Joliot, cujo nome estava associado ao nome, ainda mais célebre, dos Curie, pelo seu casamento com Irène, era a melhor figura de proa que o PCF podia sonhar para conduzir pelos palanques seu Movimento, também aberto aos não comunistas.

Em 28 de abril de 1950, o governo Bidault exonerou o Alto Comissário da Energia Atômica, por este ter declarado anteriormente, no XIIº Congresso do PCF, em Gennevilliers: “Jamais os cientistas progressistas, os cientistas comunistas darão uma parcela da sua ciência para fazer guerra contra a União Soviética.” Joliot pôde se consolar ao receber, no ano seguinte, o primeiro prêmio Lénine da Paz.

A linguagem da Paz, mais mobilizadora do que qualquer outra, tornou-se o idioma veicular dos comunistas, uma paz, claro, ameaçada pela potência americana, demonizada incansavelmente.

Em 1951, os comunistas fazem campanha contra a instalação de bases militares da OTAN em França: «Não são latas de conservas que chegam da América, mas tanques, canhões e um exército de ocupação […]. Aos soldados americanos que ocupam a França, disseram que eles vinham “defender as liberdades e a civilização”. Como na Coreia, evidentemente. Os franceses estão indignados com esta nova ocupação. […]. As forças americanas de ocupação têm, certamente, a simpatia dos policiais, dos banqueiros e dos bilionários ao serviço do que ela é; no entanto, elas (as forças armadas) estão cercadas pela hostilidade nacional que não parará de crescer. Abaixo a ocupação do nosso país! Os americanos em casa deles, na América!»

Jean-Pierre Chabrol, em reportagem em jornal comunista, insiste na analogia entre a instalação de bases e a Ocupação: “O novo ocupante se conduz de uma maneira que lembra à população os dias negros de 1940-1945“.

Desde 1951, André Sil se lança num romance épico, Le Premier Choc (O primeiro choque), escrito à glória dos militantes franceses – os estivadores de um porto no Atlântico – que resistem á “nova ocupação”. Obra agraciada com o prêmio Staline em 1952: “A primeira obra importante, escreve La Gazette Littéraire de Moscou, sobre a luta do povo francês contra os colonizadores americanos.” Palavras de ordem simples, simplistas, maniqueístas: pela paz/contra a guerra, pelo socialismo soviético/contra o capitalismo americano, dualidades repetidas ad nauseam, e pichadas em todos os muros através de um slogan que diz tudo: “US Go home!


Foi ainda em 1951 que o Partido Comunista lançou a sua nova campanha, desta vez contra a guerra “bacteriológica” que os Americanos estariam conduzindo na Coreia, com bombas carregadas de insetos portadores de bactérias. Joliot-Curie é convocado para esta cruzada. Em 8 de março de 1952, sempre dócil, ele protesta contra a arma microbicida, endossado pelo seu colega Marcel Prenant, que se encarregou de contestar no L’Humanité (22-25 abril de 1952) os argumentos de três bacteriologistas do Instituto Pasteur que duvidavam dessa acusação: “Pessoalmente, estamos convencidos, disse Prenant, que os criminosos de guerra americanos desencadearam a atroz ação, no mínimo a título experimental.”

Dentro do mesmo movimento pacífico e antiamericano, Roger Vailland, apresenta uma peça de teatro, Le colonel Foster plaidera coupable (O coronel Foster se declarará culpado), que se tornará célebre porque foi proibida. Louis Daquin deveria ter sido o realizador, Pierre Asso e Loleh Bellon os intérpretes principais. Na impossibilidade de apresentar a sua peça, Roger Vailland se inscreve no Partido Comunista, em 28 de maio de 1952, dia da grande manifestação contra a chegada em Paris do general americano Ridgway – “Ridgway a peste”.

Jacques Duclos foi preso nesse dia, por ter transportado no banco traseiro do seu carro pombos, obviamente “correio”, prova irrefutável do complô tramado contra o regime. Duclos explicava que se tratava de um presente de pombos comestíveis com ervilhas… O resto é menos engraçado: os confrontos com a polícia são violentos, dois manifestantes morreram. É também a ocasião para Jean-Paul Sartre aderir à causa comunista. (…)

Título e Texto: Michel Winock, in “Le siècle des intellectuels”, Editions du Seuil, 2014, páginas 598 a 601 
Tradução: JP, 20-9-2022

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