quarta-feira, 12 de julho de 2023

Hospital de fachada? Na Barra, o paciente paga a emergência da grife Samaritano e recebe Hospital Vitória

A jornalista Bruna Castro conta suas peripécias durante uma crise de farmacodermia e sua tentativa de receber tratamento no hospital que escolheu, o Samaritano Barra


Na Avenida Jorge Curi, no coração pulsante da Barra da Tijuca, fica o grande complexo dos Hospitais Vitória e Samaritano Barra. Uma espécie de construção envidraçada que lembra um shopping típico do bairro. Me sentindo mal, decidi, dado o bom nome e reputação do Samaritano, escolher sua emergência para um tratamento. Parando o carro bem na frente de um totem onde diz “EMERGÊNCIA”, desço do carro. Um grande pátio leva à entrada do hospital, portentosa, com roletas como as dos aeroportos modernos, e uma recepção em mármores caros e ônix. Chegando lá, sou informada que “apesar de dizer emergência ali, não é ali, e sim numa porta à direita”.

Trata-se de uma porta dupla, com resquícios de um letreiro – arrancado sem cuidado – onde se leu um dia “EMERGÊNCIA”. Meto a mão na porta. Mas está trancada. Então saio do tal pátio e ando – me arrastando – até o verdadeiro pronto socorro, que não é onde o totem diz “EMERGÊNCIA” e nem onde um dia esteve escrito a mesma coisa. Lá, um lindo balcão de ônix retro iluminado – adoro, tenho nos banheiros de casa – com diversos atendentes. Uma delas insistentemente no celular, aparentando uns 20 anos. Ri bastante. Está feliz brincando com a colega ao lado. Mas eu não, pois estou com uma farmacodermia que toma meu corpo inteiro (alergia a um medicamento). Espero ela terminar de brincar. Uma senhora idosa cambaleante recém atendida pede para saber onde é o consultório 4. A moça que brinca no celular não sabe. Mas sabe usar o facebook. Jovens sabem dessas coisas.

Por fim, consigo me registrar. Me entregam um papel branco recortado para eu mesma preencher com meus dados, enquanto a atendente continua feliz no celular. Preencho. Recebo uma pulseira laranja e teoricamente serei atendida rapidamente. Estou coberta de brotoejas e com a língua inchando. 30 minutos depois, não sou atendida. Meu marido reclama, diz que eu devia ter ido ao Miguel Couto em voz alta, que em emergência eles são treinados. A atendente então chama ele “discretamente” e organiza finalmente o atendimento. Sou atendida por uma excelente médica. Exatamente o que eu esperava de um bom nome como o Samaritano. Ela ouve tudo, faz uma ótima anamnese; por sorte, ela é dermatologista, e entende o problema. Chega a me explicar que vai dar uma pioradinha antes de melhorar. E me indica a internação.

No ato da internação, sou informada que vou ficar “uns minutinhos” no Hospital Vitória, vizinho de porta, enquanto me arrumam um quarto. Sou enviada para o leito 8 do Vitória. Tudo bacaninha, mas eu vim ao Samaritano – meu plano me dá este direito. Entro no leito 8 do Vitória exatamente as 14h com meu marido, que trabalha no Centro, e tem trabalho a fazer, mas combinou de me acompanhar até eu chegar no meu quarto. Às 14:30 informam que meu quarto – 225 – está pronto e que “já, já” vou ser transferida. As horas passam. Muitas. Do lado de fora do leito 8 ouço os funcionários conversando, eles vêm e vão. Nada acontece. Abordo duas vezes o rapaz que fica exatamente na porta do meu leito numa mesinha com computador. Ele responde as 2 vezes que “o quarto está pronto”, mas que ele “precisa ter tempo de preparar a internação”. As horas se passam, mas ele não tem tempo nunca. E vai embora. Entra o outro plantão. O novo plantão desdiz o rapaz anterior: diz que não está pronto o quarto. Eu continuo lá, com meu marido. Mais horas passam; e a paciente/cliente do Samaritano acaba ficando no Vitória. Resta saber se meu plano vai pagar a conta do Vitória ou a do Samaritano!

Os amigos vêm me visitar; perguntam por mim na recepção do Samaritano. Lá dizem que eu não estou internada no hospital. Eles então vão ao Vitória, onde eles também dizem que não estou. Uma amiga brinca comigo que quando não quiser pagar as contas ou ser encontrada devo me internar lá novamente. Penso: esse Samaritano Barra existe mesmo ou é só um hospital de fachada? Peço para ir ao banheiro da emergência do Vitória. Os funcionários gentis me direcionam para o banheiro. Na porta diz “Banheiro para Colaboradores”. Entro – lembra que estou toda ardida e com locomoção difícil – e o banheiro é na verdade um cubículo, onde sequer minha perna cabe entre o vaso e a parede. Meu marido é da área de imóveis, ele me explica que se o banheiro fosse para pacientes, não poderia ser tão pequeno e teria regras mínimas, então eles podem ter posto a placa que é “pra colaboradores” para evitar fiscalização. Ah, bem. Que mundo a gente vive, e o colaborador não tem que ter espaço para sentar direitinho? Enfim, estou mais preocupada em ir para o meu quarto no hospital que escolhi.

Quase 6 horas depois, sou finalmente levada para o meu quarto no Samaritano, onde tenho outras histórias para contar, mas…fica para outro dia, ainda estou toda me coçando! Todos os procedimentos de emergência – que duraram cerca de 6 horas – foram executados no Vitória, exceto o atendimento da excelente médica do Samaritano que me atendeu por 20 minutos. É como pagar uma viagem de classe executiva e receber uma viagem de econômica. Ou ser encaminhada à rodoviária, que aliás tem um banheiro bem melhor que o “dos colaboradores”.

Uma sopa de erros, que não consegui expor a ninguém nos dois hospitais, pois sequer fui atendida por ninguém com condições de apresentar a justificativa de toda esta confusão. Sequer atendem o telefone. Talvez leiam jornal.

Título, Imagem e Texto: Bruna Castro, Diário do Rio, 11-7-2023

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