segunda-feira, 4 de agosto de 2014

Os estranhos silêncios de um Papa tão loquaz

Nem uma palavra para as estudantes nigerianas raptadas, nem pela paquistanesa Asia Bibi, condenada à morte pela acusação de ter ofendido o Islã. E também as audiências negadas ao ex presidente do IOR, Gotti Tedeschi, dispensado por ter desejado fazer limpeza.

Sandro Magister
No dia de Sant’ana, padroeira de Caserta, o Papa Francisco visitou esta cidade. Tudo normal? Não. Porque apenas dois dias depois, Jorge Mario Bergoglio voltou a Caserta, em visita privada, para encontrar seu amigo italiano, que conheceu em Buenos Aires, Giovanni Traettino, pastor de uma igreja evangélica local.

Mais ainda, em um primeiro momento, o propósito de Francisco era ir se encontrar somente com este seu amigo, com o bispo de Caserta sendo deixado totalmente às escuras, e se quis convencer o Papa a duplicar o programa, para não descuidar das ovelhas de seu redil.

Em Francisco, a colegialidade de governo é mais invocada que praticada. O estilo é o de um superior geral dos jesuítas que, ao final, decide tudo por si só. Depreende-se isso por seus gestos, por suas palavras e por seus silêncios.

Por exemplo, há semanas que, por detrás dos bastidores, Bergoglio cultiva relações com líderes das poderosas comunidades “evangélicas” dos Estados Unidos. Na casa Santa Marta, passou horas e horas na companhia deles. Convidou-lhes para almoçar. Em um desses momentos de convivência, fez-se imortalizar fazendo um high five, entre grandes risos, com o pastor James Robinson, um dos tele-evangelistas americanos de maior êxito.

Quando, no entanto, ninguém sabia de nada, foi Francisco quem lhes antecipou seu propósito de ir a Caserta encontrar seu colega italiano e a explicar o motivo: “oferecer as desculpas da Igreja Católica pelos danos que lhes ocasionou ao obstaculizar o crescimento de suas comunidades”.

Argentino como é, Bergoglio conhece “ao vivo” a avassaladora expansão das comunidades evangélicas e pentecostais na América Latina, que continua arrebatando da Igreja Católica enorme massa de fiéis. Contudo, decidiu não combater seus líderes, mas, antes, fazer-se amigo deles.
Trata-se da mesma linha que adotou com o mundo muçulmano: oração, invocação da paz, condenações gerais do que se está fazendo de mal, mas muito atento para se manter longe dos casos específicos relacionados a pessoas determinadas, sejam vítimas ou carrascos.

Francisco tampouco abandona esta atitude reservada quando o mundo inteiro se mobiliza em defesa de certas vítimas e todos esperariam dele um pronunciamento.

Não pronunciou uma só palavra quando a jovem mãe sudanesa Meriam estava presa com seus filhinhos, condenada à morte somente por ser cristã, porém, recebeu-lhe uma vez que foi libertada graças às pressões internacionais.

Não disse nada quanto às centenas de estudantes nigerianas raptadas por Boko Haram, apesar da campanha promovida por Michelle Obama com o tema: “Bring back our girls” [Devolvam nossas garotas].

Cala-se sobre o destino de Asis Bibi, a mãe paquistanesa presa há cinco anos, a espera da apelação contra a sentença de morte que recebeu, acusada de ter ofendido o Islã.

Também a campanha pela libertação de Asis Bibi tem o mundo católico comprometido por todos os lados e foi divulgada, no início deste ano, uma dolorosa carta escrita por ela ao Papa — que não a respondeu.

São silêncios que causam muitíssima má impressão uma vez que são praticados por um Papa de quem se conhece sua generosíssima disponibilidade para escrever, telefonar, levar uma ajuda, abrir as portas a qualquer pessoa que toca a campainha, não importando se pobre ou rico, bom ou mau.

Por exemplo, sua demora em se encontrar com as vítimas de abusos sexuais, cometidos por representantes do clero, havia levantado algumas críticas. Porém, no último 7 de julho, remediou essa situação, dedicando toda uma jornada a seis dessas vítimas, trazidas a Roma desde três países europeus.

Nestes mesmos dias, Francisco avançou com a reorganização das finanças vaticanas, com algumas substituições nos cargos máximos e a demissão do inocente presidente do IOR, o alemão Ernst von Freyberg.

Inexplicavelmente, em dezesseis meses de pontificado, este funcionário jamais conseguiu obter uma audiência com o Papa.

Porém, mais inexplicável é a “damnatio” que atingiu seu predecessor, Ettore Gotti Tedeschi, despedido em maio de 2012 justamente por ter levado adiante a obra de limpeza, demitido precisamente pelos maiores culpáveis pela má administração.

Seus pedidos ao Papa Francisco para ser recebido e escutado jamais receberam resposta.
Título e Texto: Sandro Magister
Tradução: Fratres in Unum.com – Roma, 1 de agosto de 2014

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