terça-feira, 26 de agosto de 2014

Lucubrações

Francisco Vianna
Sobre a lucubração filosófica do senhor Rocha, de fato honesta e sincera, quero acrescentar comentário que considero pertinaz.

A Criação de Adão, de Michelangelo, Capela Sistina, Vaticano

O reconhecimento de uma inteligência inicial, criadora do universo, pode ser sentido e atingido por diversas ocasiões da vida, mas a noção de espiritualidade decorre principalmente do fato de que a cada resposta que a humanidade consegue dar aos seus questionamentos, por si só, dá origem a um número ainda maior de mistérios e dúvidas que precisam ser respondidas... Assim, supomos que, enquanto o nosso conhecimento cresce em progressão aritmética, as nossas dúvidas e mistérios surgem em progressão geométrica!

As dúvidas, e as angústias que elas causam ao espírito humano, são de fato as forças que levam o homem a pensar através da ciência, mas, ironicamente, quanto mais respostas a humanidade consegue para dissipar suas dúvidas e mistérios, mais esses sentimentos se multiplicam. A atitude científica é pois altamente angustiante e o máximo que ela consegue fazer é deixar questões pendentes para que mais tarde possam ser respondidas. A crença, a fé, são altamente apaziguadoras. Quando se crê, pode-se dormir tranquilo...

Por outro lado, Lavoisier nunca disse que "na natureza, nada se cria e nada se perde, mas tudo se transforma", um erro corriqueiro que muita gente boa comete. Quem disse isso pela primeira vez foi o filósofo grego Thales, de Mileto. O Teorema das Massas, enunciado por Lavoisier, diz que "num sistema químico isolado, a soma das massas dos reagentes é igual à soma das massas dos compostos". Com a sua Teoria da Relatividade, Albert Einstein disse, bem mais tarde, que "nesse mesmo sistema químico isolado, a soma das massas dos reagentes difere para mais ou para menos da soma das massas dos compostos dependendo de haver ganho ou perda de matéria sob a forma de energia e que a balança capaz de medir essa variação teria que ter uma sensibilidade de acusar variações de 1/106 gramas", noção que deriva de sua famosa equação e=mc2, ou seja, a energia liberada pela matéria é igual ao produto da massa pelo quadrado da velocidade da luz...

Se considerarmos a Teoria do Big Bang (ou da Pulsação Universal), segundo a qual o universo em que vivemos está em expansão, ou "diástole", podemos pressentir - apenas pressentir - a imensa variedade de formas de energia que deve existir e das quais conhecemos apenas uma meia dúzia delas. Gosto muito de citar, como prova da pré-existência dessa inteligência inicial criadora (mesmo porque a mente humana não consegue acomodar na lógica e na razão a noção de eternidade, ou seja, de que algo que exista tenha existido desde sempre e que existirá para sempre sem fazê-lo dentro de uma noção de espiritualidade e de crença), da existência de Deus, como se possa querer, o questionamento seguinte:

"Qual o tipo de energia que faz com que o núcleo de uma meia célula, que teria apenas algumas horas de vida, ao se juntar com o núcleo de outra meia célula, que também teria uma existência extremamente fugaz, produz uma célula inteira com um potencial biológico de tal ordem que é capaz de produzir um indivíduo completo formado de bilhões de células que formam tecidos altamente especializados e ógãos e sistemas que permitem que esse novo indivíduo dure quase um século, como no caso do homem?"

Imaginem que, se um dia descobrirmos que tipo de energia é essa, quantos mais mistérios e dúvidas tal descoberta trarão à tona!

Sob o ponto de vista físico, nada é apenas estático ou o movimento é apenas cinemático, mas tudo é dinâmico, ou seja a massa (ou energia concentrada) em movimento, em ação. Daí procede a noção enunciada por Thales de Mileto, e depois corroborada por Lavoisier, Ostwald e Einstein, cada qual à sua maneira científica de apreciar a mesma fenomenologia. Essa permanente movimentação e transformação da matéria e da energia é que garante o devir, o vir a ser, que também é momentâneo, principalmente se comparados aos números universais. 

Considero, como diz o Rocha, o predicado de ser honesto, primeiro para com a sua própria consciência, e segundo para com os demais seres vivos e o ambiente, algo essencial para a nossa vida gregária, em sociedade, e se considerarmos a pequenez de nossa dimensão no universo, a atitude ateia, eminentemente materialista, alijando da nossa vida a noção de espiritualidade (não de religião, veja bem) me parece antes de tudo uma atitude desonesta com relação aos nossos próprios sentimentos, emoções e capacidade de lucubrar filosoficamente, ou seja, de pensar em busca da verdade.

Espero que o devenir, ou o devir, ou o vir a ser, próprio da dinâmica da existência, venha a mostrar ao senhor Rocha como a existência de Deus é algo tão evidente e como há pessoas que, mesmo assim, não conseguem perceber tais evidências e são até capazes de construir sistemas religiosos de tal forma capciosos que justificam o extermínio de quem não pensa da mesma forma, em nome e pela "glória" de Deus... 

Num deus assim, criado pelo homem como justificativa moral de dominação e hegemonia, eu também não acredito!
Título e Texto: Francisco Vianna, 26-08-2014

3 comentários:

  1. Senhor Vianna,
    Creio que chamei-lhe às turras, o que me deixa lisonjeado.
    Bem, EU, o Rocha sou um ateu diferente, não frequento sociedades ateias que manipulam tanto quanto as religiosas.
    Há ateus que confundem o ateísmo com uma religião ou associação contra a existência de um deus.
    Eu não discuto a existência de deus, é tão difícil provar-se o sim e o não, e isso leva a celeumas que são de discutíveis razões como o clubismo futebolístico.
    Eu não acredito em almas e espíritos.
    Se você crê em deus, porque destruímos sua maior criação que é a natureza.
    Digamos que nosso planeta seja uma aeronave de voo infinito, voando pelo espaço sideral, com recursos finitos, que teimamos em transformar em seres humanos. Cada ser humano é fruto dos recursos naturais e utiliza eles por cerca de 70 anos.
    Ao mesmo tempo que os humanos crescem e se multiplicam, outras espécies desaparecem, poluem-se os oceanos e rios, desmatam-se florestas, e a água desaparece dos grande centros. Nossos rios estão morrendo.
    Matando a mãe natureza conflitamos com a célebre frase:
    Deus está morto.
    Fiz uma tentativa, como disse de iniciativa filosófica de que poucas coisas importam quando somos honestos, e temos altos conceitos morais e éticos.
    Sou simplesmente um descrente de almas e espíritos, e como digo aos ateus:
    No dia que eu crer em almas e espíritos acreditarei num deus pro-forma.
    No momento considero tudo ciências, digamos não muito coerentes, tais como, horoscopia ou numerologia para citar algumas.
    bom dia...

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  2. Bom texto para reflexão. Levo muito em conta a teoria do evolucionismo darwinista como explicação plausível para os fenômenos biológicos e o dinamismo da vida. É claro que ela não explica a origem da vida em si, mas dispensa um Criador como sendo o causador da origem do universo e dos organismos vivos. Talvez possamos anuir a um 'elan vital' (segundo Henri Bergson) - um impulso vital - que estaria no devir das coisas, impondo sua ação criadora. Tudo estaria em movimento criador, e se a isto pudermos chamar de Deus, Deus estaria inacabado e se fazendo infinitamente, cavalgando no lombo do movimento evolucionista criador. Ao meu ver não podemos antropomorfizar um Deus Criador, segundo as religiões, mas aceitar a Natureza como força viva na qual estamos inseridos. O 'Deus sive Natura' de Espinosa nos traça esta perspectiva metafísica. Era ele ateu? Muitos o tem como ateu, mas, em verdade, ele era teísta, um teísta da Natureza.
    Valdemar Habitzreuter

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  3. Eu então vou me considerar com tal Valdemar, se existe um deus para ser adotado e não dispersado é GAIA. Ela não precisa de orações, pastores, papas e santos, ela precisa de ações, de atitudes para preservá-la dos danos humanos.
    Escrevi ADOTADO, não adorado. Muitos defendem os animais de estimação, eu adoro animais, mas ao contrário do que alguns pensam, alem de uma super população humana, estamos a produzir duas outras, os animais de de estimação e os de criação alimentar.
    E nós humanos mais os outros dois produzimos cerca de 20 bilhões de quilos de lixo orgânico por dia, além de USUFRUIR DOS RECURSOS NATURAIS NECESSÁRIOS.
    As árvores que controlam a temperatura do planeta são destruídas, e os plânctons, produtores do oxigênio dos oceanos e rios são destruídos pela poluição.
    Já há estudos científicos sobre a utilização dos aquíferos, que leva a acomodação das camadas e ao aquecimento das regiões.
    Gostei das palavras "teísta da natureza".
    natura deus est,


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