sexta-feira, 22 de agosto de 2014

Ferocidade

Luís Naves
 
Há leitores que recebem as opiniões alheias com uma ferocidade particular, dispostos a tresler o que foi escrito e sem qualquer tolerância para a simples tarefa de ler com atenção. Se o autor não é vedeta da TV ou poeta fofinho, a assinatura é provavelmente irritante.

Falando do meu caso, o que escrevo não é dirigido a leitores incapazes ou que partem para a leitura com preconceitos inabaláveis. Li um texto muito inteligente de uma autora que escreve no Jornal de Negócios, Eva Gaspar, e ela falava deste maldizer pouco informado que tomou conta do espaço mediático e que se espalha nas redes sociais como uma infestação de cogumelos tóxicos. (Texto abaixo).
 
Há pessoas que não entendem a diferença entre discordar com argumentos e discordar sem eles. Há comentadores que dão palpites sobre tudo e mais alguma coisa, com sentenças definitivas sobre temas que desconhecem, ideias vagas sobre coisas complexas; há também muitos que contestam o outro apenas pela cor da gravata, pelo respectivo lado na trincheira e por julgarem o opositor irritante ou ainda porque lhes apetece, por terem acordado com os pés fora da cama e com azia no estômago.



Não faltam razões para a maledicência superficial e cruel, mas julgo que um dos motivos da crispação é razoavelmente racional: foi criado um clima pessimista e negativo, as notícias trazem sistematicamente o lado mau da sociedade e visam sempre a vertente escandalosa dos supostos factos. Algumas pessoas acreditam ingenuamente que, sendo o mundo assim, a liberdade de expressão deve funcionar como valor absoluto, incluindo apenas a irresponsabilidade e o vazio.
Título e Texto: Luís Naves, Fragmentário, 20-08-2014

Bem-digo

Eva Gaspar
Muito se maldiz. Dá gozo, rende aplausos, não compromete e, acima de tudo, é muito fácil maldizer. Mais ainda quando feito em matilha - todos a ladrar e a morder sem correr riscos demasiados.

Para não destoar, vou maldizer – os maldizentes. O que me move é ajudar a esclarecer. E começo por esclarecer que nunca estive com ela. Nunca sequer respirei o mesmo ar que ela. Conheço-a basicamente a partir do que me mostram os seis écrans de tv que rodeiam o ponto em que me sento neste momento (lá em casa, tv é quase só para mostrar futebol).

Há uma mentira que se lhe cola há mais de um ano por causa dos contratos swap.  Diz-se  que mentiu porque disse que tinha "começado do zero" quando, afinal, o anterior Governo já tinha reunido e entregue ao actual alguma informação sobre o assunto.

Bem sei que, nestes tempos de redes sociais, o que está a dar é ter opiniões rápidas e impiedosas. Não consegui ter opiniões rápidas (embora não tão lentas que demorassem um ano a formar) nem tirar conclusões definitivas pelo que ouvi e li (ainda na semana passada, o Expresso escrevia que as suas contradições levaram à instauração de uma comissão de inquérito pela Assembleia da República). Na dúvida, acabei a ler as longas actas da comissão parlamentar de inquérito que, de facto, existiu: a Comissão Eventual de Inquérito à celebração de contratos de gestão de risco financeiro por empresas do sector público. E, na longínqua página 76, o que está lá é isto:

"O Sr. Paulo Sá (PCP): - A Sr.a Secretária de Estado quase que disse que teve de começar o trabalho do nada, que não vinha do anterior Governo nenhum trabalho feito nesta área. É isto que quer dizer?

A Sr.a Secretária de Estado do Tesouro: - Sr. Presidente, Sr. Deputado, de facto, relativamente a esta matéria e para lidar com o problema, não havia nenhum trabalho feito e ele começou do zero, sim. Confirmo isso. Tirando o reporte da informação, que tinha já sido estabelecido na vigência do Governo anterior, tirando o reporte da informação nos relatórios da DGTF, de facto, nada mais estava feito."

Omitir parte do que é dito para, com a restante, alimentar acusações de mentira pode ser má-fé, preguiça, distração, vai-na-onda, ou tudo junto. Bom serviço público, é que não é.

Sobra o sentido de Estado de Maria Luís Albuquerque.
Bem-digo, portanto.
Texto: Eva Gaspar, Jornal de Negócios, 20-09-2014

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