Assad já foi denunciado por
crimes contra a Humanidade por um dos principais líderes da OLP. Será que a
esquerda que o defende não vai abrir os olhos?
Uma importante parcela da
esquerda mundial continua a sustentar as virtudes anti-imperialistas do coronel
Khadafi, o líder da revolução líbia (como ele oficialmente se intitula), e a só
ver nos acontecimentos naquele país a mão da agressão da Nato. O povo está com
Khadafi, asseguram, e a oposição é toda comprada pela CIA.
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Líbios celebram a queda de
Kadhafi nesta sexta-feira (26), após as orações, na região central de Trípoli,
foto: AP
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A argumentação não é nova. Foi
usada, sem procurar ser exaustivo, na Checoslováquia em 1968, e em geral em
todas as revoluções que derrubaram os regimes do chamado “socialismo real” a
partir da queda do Muro de Berlim.
Khadafi é diferente? Vejamos:
– O regime de Khadafi era uma
ditadura. Isto é incontestável. Não havia a mais mínima liberdade de expressão,
de organização, de manifestação, de formar sindicatos. Nada. Na “Jamayria” não
havia partidos. Ao simular um sistema político que seria uma espécie de
“assembleia permanente”, o que o coronel impunha de facto, com mão de ferro,
era uma ditadura policial onde quem mandava era ele e os filhos. Um bom teste
que proponho aos defensores de Khadafi: seria ou não possível formar na Líbia
um partido que defendesse as vossas ideias? Já sabem a resposta: em poucas
horas estariam todos presos se o tentassem, por mais que se desfizessem em
elogios ao “Grande Líder”.
– Há muito que Khadafi tinha
deixado de ser independente do imperialismo. A revolução de Khadafi fez parte
das revoluções nacionalistas árabes dos anos 50 e 60, que se inspiraram na de
Gamal Abdel Nasser do Egipto. Durante alguns anos, apesar das suas
excentricidades e megalomania, o “líder da revolução” aplicou uma política que
em nada agradava aos Estados Unidos. Mas depois mudou.
Nos últimos dez anos, Khadafi
abriu a exploração de petróleo às grandes empresas petrolíferas estrangeiras
como Repsol, Total, Eni, Occidental, PetroCanada. Depois disso, os governantes
europeus pareciam fazer fila para visitar o “grande líder”: Schröder,
Berlusconi, Blair, mais recentemente Sarkozy, Sócrates... Colaborou activamente
com a política “anti-terrorista” de Bush depois do 11 de Setembro. Em 2008, a
Líbia assinou com os EUA um acordo de cooperação que abriu o mercado líbio às
grandes empresas norte-americanas, para além das companhias de petróleo. Então,
o mito de um Khadafi anti-imperialista não passa disso mesmo: um mito.
– Aliás, na argumentação desta
esquerda que apoia Khadafi parece que há uma espécie de buraco, negro que isola
os regimes de Khadafi e de Bashar al-Assad da Primavera árabe. Não se ouviu
esta esquerda dizer que os manifestantes anti-Ben Ali ou anti-Mubarak eram
pagos pela CIA. Na Tunísia e no Egipto, viva a oposição, vivam as revoluções,
bem como no Iémene ou no Bahrein. Na Líbia e na Síria, não.
Mas, então, por que a Nato
decidiu intervir militarmente? Porque não pode dar-se ao luxo de deixar uma
revolução seguir o seu curso sem influenciar os seus líderes e garantir o
controlo do futuro governo. Ainda assim, são conhecidas as reservas de Obama e
a resistência a que as tropas americanas encabeçassem a força. E as tentativas
de negociação que foram promovidas e, ao que tudo indica, só fracassaram porque
Khadafi não aceitava qualquer solução que passasse pela sua saída do poder.
Não tenho dúvidas é preciso
condenar a intervenção da Nato e que deve haver líderes de forças do CNT pagos
pela CIA. Mas isso invalida o carácter da mobilização anti-Khadafi? Claro que
não. Também o facto de o CNT ter sido felicitado e reconhecido pela Autoridade
Palestiniana e pelo Hamas não o transforma em progressista e defensor da causa
palestiniana. O que será o próximo regime da Líbia ainda está para se ver e
depende sobretudo do curso da revolução.
Mas Khadafi, ao que tudo indica, já é passado. O pior ainda vem pela frente: Bashar al-Assad, o homem
que usa tanques e navios de guerra para massacrar a sua própria população. A
oposição da Síria continua a usar as mobilizações de massa, e não a luta armada,
para o denunciar. E não desiste, apesar dos massacres - pelo menos 2.200
mortos.
Assad já foi denunciado por
crimes contra a Humanidade por um dos principais líderes da OLP. Será que a
esquerda que o defende não vai abrir os olhos?
Título e Texto: Luís Leiria, Jornalista, Dirigente
do Bloco de Esquerda, 28-08-2011
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