domingo, 23 de setembro de 2012

Construir ou Paralisar? Você decide...

Valfrido M. Chaves
Nas fronteiras do Sul, herança de uma época em que os limites da Nação eram traçados e defendidos a patas e lanças da cavalaria, argentinos e brasileiros ainda hoje trocam farpas, através de piadas e chistes. Vamos, pois, a uma “piada de argentino”: - “Você sabe qual é o melhor negócio do mundo?... Não sabe? É comprar qualquer coisa pelo preço que o argentino diz que o brasileiro vale, e vendê-la por quanto o argentino acha que ele próprio vale”.
Humor à parte, este chiste tem por pressuposto a noção de que nossos vizinhos, ao Sul, exibindo uma autoestima exagerada, usam e abusam do direito de se engrandecerem. Ao mesmo tempo, nele fica clara a idéia de que, por lá, não seriamos objeto de maior apreço ou consideração. Sem entrar no mérito da pretensiosa autoestima argentina e de nossa desvalorização embutidas na piada, trago ao leitor algumas reflexões a partir da mesma...
Do ponto de vista psicológico, todos nós abrigamos um lado “argênteo”, ou seja, “narcísico”, que nos leva a uma autoestima exagerada, à super valorização de nossas qualidades e à ausência de autocrítica. Trata-se do lado infantil que temos em nossa interioridade, o qual se crê o umbigo ou a sétima maravilha do mundo. Por outro lado, coabitando em nossa alma com esse “argentino”, temos em nós outro infante marcado por sentimentos de abandono, insignificância e dor que foram vivenciados num ou noutro momento. Tal criança se sente como um ninguém, um “coisa pouca” no mundo. Vou me abster, por motivo de espaço, de adentrar nas possíveis raízes familiares do “Argentino” e do “Coisa Pouca” que trazemos na alma, enfocando apenas o modo como lidamos com esses personagens internos e como eles interferem em nossa vida social. 
Ilustração: Mario Pinto
Esopo, com sua fábula “A rã e o touro”, nos acompanhará neste passeio para nos introduzir na dialética desses nossos já referidos contrários, o Argênteo e o Coisa Pouca: “Uma pequena Rã, num banhado, viu próximo dela um grande touro, que viera beber água. Sentindo-se apequenada diante do gigantesco intruso, começou a se inflar, e foi inchando, inchando, até... estourar!”. Do mesmo modo, quando a criança vive intensamente o sentimento de desamparo e dor, diante de pais que pouco a admiram e que passam a lhe parecer tão grandiosos quanto o touro do banhado, ela infla, infla o seu ego, se apegando aos momentos fugazes de grandiosidade que tenha experimentado. Com tal apego, fica ela então pronta para trilhar o mundo carregando, em seu alforje psíquico, um pretencioso “Argentino” e um deprimido “Coisa Pouca”!
Ao longo de nossas jornadas, fazemos com as dores e os incômodos provocados pela presença do nosso “Coisa Pouca” em nossa alma, o mesmo que o aparelho digestivo faz com o que lhe é indigesto: colocamos para fora, vomitamos no outro e, assim o fazendo, ficamos só com o lado grandioso dentro de nós. Não é difícil identificar essa “defesa” contra a dor que advém da própria “coisapouquice”: ela está sempre presente nas tentativas de desmerecer, desqualificar, paralisar, no outro, os méritos e possibilidades que não julgamos possuir, ou ações que não consigamos executar.
Mas qual seria o ganho do “Coisa Pouca” em promover a maledicência sobre o outro, ou a paralisação de suas ações criativas ou produtivas? É justamente colocar fora, produzir no outro a própria impotência, paralisação, mal-estar e, ao fazer isso, se sentir parte de uma “militância argêntea” e poderosa. Tendo depositado fora a própria coisapouquice, o “militante” fica só com a “coisagrandiosa” dentro de si. Ou seja, o sentimento de onipotência, poder ilimitado. Esse mecanismo de defesa tem até nome: “projeção”!
Exemplos? O Vírus de Computador, que surgiu justo quando escrevia este artigo, e freudianamente denominado “Status”! Qual seria o status (prestígio) interno de alguém que tenta destruir programas e memórias que têm a cara limpa (nada contra os barbudos!) e que podem ser mostrados e usados de modo produtivo? Seu objetivo? Disseminar, plantar fora o seu próprio sentimento de impotência e, feito isso, sentir-se infantilmente poderoso.
Outro exemplo? Na discussão regional da Agenda 21, uma cientista de nossas Universidades relatou que um de seus projetos de pesquisa, feito com carinho e competência, foi indeferido pela burocracia porque a pesquisadora não tinha pedido, em seu projeto, papel e lápis! Já imaginaram o quanto o burocrata que fez isso se sentiu poderoso? E os que tentaram, no grito e com subterfúgios ambientais, paralisar o escoamento dos produtos brasileiros pela Hidrovia Paraguai-Paraná e assim impedir nosso desenvolvimento hidroviário? Ainda dentro dessa linha reacionária e obscurantista, convém lembrar que a proposta oficial do PT na Agenda 21, com relação aos transgênicos, foi a de proibição de suas pesquisas no Brasil.
Nessa linha, apontaríamos ainda a tentativa de impedir a substituição de gramíneas não palatáveis, que só acumulam biomassa e alimentam grandes incêndios no Pantanal, por outras cultivares que melhor alimentam o gado, protegem o solo e inibem os incêndios. Seria interessante assinalar nessas ações pseudo-ambientalistas, a sistemática união de organizações ligadas às grandes oligarquias transnacionais, com grupos de esquerda mais radicais, presentes em MS. Embora os pantaneiros venham promovendo a melhoria de suas pastagens há mais de 30 anos, entendendo que com isso conciliam a sustentabilidade econômica e a ambiental do Pantanal, nunca apareceu ninguém, com uma pesquisa séria, para apontar como e onde a experiência pantaneira impactaria negativamente a qualidade ambiental da Planície. Pelo contrário, os pesquisadores testemunham, naquela prática inovadora, a conciliação entre a promoção da qualidade ambiental e melhores índices zootécnicos. Afinal, melhores pastos, gado e bons manejos fazem das queimadas coisa do passado!
Tudo se passa como se houvesse uma programação ideológica a cumprir, ou seja, levantar suspeição, desmerecer e desqualificar o trabalho produtivo na Planície Pantaneira. No plano psicológico, seria destruir a autoestima do outro, paralizando-o em sua criatividade e produtividade. E ao fazer isso, sentir-se um maravilhoso “defensor do meio ambiente”, com um Ego resplandecente! Fim ao cabo, a motivação dessa prática se deve a que as pessoas com reduzida autoestima e sem produtividade se sintam bem quando conseguem deixar o outro nas suas mesmas condições... Aqueles com tais características são cooptados facilmente por interesses tanto ideológicos quanto geopolíticos, para as atuações perversas já apontadas.
O messianismo é uma das atuações que expressam essa “gangorra” interna em que brincam conosco o nosso “ eu maravilhoso” e o “coisa pouca”. Nele, há um supremo prazer em anunciar a salvação, o “novo paradigma” para as massas, tornar-se “o messias” e ter o poder. Por outro lado, aqueles com menos talento, porém com o mesmo sentimento de insignificância do “messias”, se realizam na submissão ao líder grandioso ou doutrina salvacionista, se sentindo partícipes da magnitude do líder ou da causa. “Identificação projetiva” é como a Psicanálise nomeia este mecanismo.
As grandes tragédias do século passado tiveram em seu bojo a dinâmica a que estamos nos referindo: o totalitarismo fascista, nas suas versões nazista e comunista, trouxeram o holocausto, os expurgos, os assassinatos em massa, enfim, a crueldade contra a pessoa humana numa expressão massiva tal que se imaginava impossível em nosso estágio civilizatório.
Ambas as ideologias subjacentes àquelas ações degradantes que deverão sempre envergonhar nossa espécie e nos servir de advertência, anunciavam “boas novas” para a humanidade. O nazi-fascismo trazia a redenção da humanidade através da “higiene racial”, com a supressão das idéias ou “raças inferiores”: comunistas, judeus, ciganos, eslavos, etc. Por outro lado, o totalitarismo marxista-leninista anunciava a “boa nova” através da “supressão da sociedade de classes e do Estado” e o que, na prática, foi instrumentalizado pela “ditadura do proletariado”. Tal como na Terra Prometida, onde nos riachos correria leite e mel, sob o novo regime jorraria abundância e liberdade, com plena “liberação das forças produtivas”.
Os grandes timoneiros daqueles processos massivos de degradação humana foram Hitler, Lênin, Stálin e Mao Tse Tung. Todos, personalidades paranóides, extremamente cruéis, amantes do poder e absolutamente fascinados pelo papel que eles próprios e as massas lhes outorgavam, como “redentores da humanidade” ou “messias prometidos”. Não é por acaso que todos eles se eternizam no poder: Hitler, Stálin, Mao, Fidel. Todos eles construíram um sistema ideacional ou ideológico que viabilizava e justificava, historicamente, a crueldade e o desprezo contra o indivíduo e a humanidade. Todos esses messias demonstraram possuir Egos frágeis, incapazes de administrar as suas pulsões primitivas, as quais liberavam, atendendo ainda suas necessidades narcísicas: mandavam milhões de seres humanos para os fornos crematórios ou para os expurgos siberianos, e ainda se consideravam, por causa disso, mais maravilhosos! As cinzas que saiam das chaminés dos fornos crematórios, caiam como lantejoulas sobre o Ego dos executores da carnificina.
Não suportar as próprias contradições na alma é o determinante subjacente daqueles que se empenham na eliminação da diversidade e pluralidade em seu ambiente. O aparato ideológico, seja nazista ou marxista-leninista, apenas agilizaram e justificaram as práticas antidemocráticas e degradantes levadas a efeito, as quais correspondiam a necessidades individuais de seus executores. Se não houvesse aquelas ideologias para os justificarem, eles criariam uma, aliás, como criaram.
Espero que o leitor perceba o “mecanismo chave” que apontamos: mandamos o “coisa pouca” para o forno crematório, “paredon” ou Sibéria, e ainda inflamos o “ego-maravilha” dentro de nós. Aí entra o “culto da personalidade” que, estimulando a identificação das massas com o Grande Líder, as tornam dependentes do mesmo. É uma simbiose perfeita, engendrada no caldeirão do diabo e que, historicamente só ocorreu nas sociedades em que a autoestima coletiva entrou em colapso, como na Alemanha e Rússia pós Primeira Guerra e na China enxovalhada pela dominação Ocidental e imperialista.
A percepção de tais mecanismos, à luz do conhecimento dos fatos históricos, da Ciência Política, da Psicologia Social e da Psicanálise, nos parece de crucial importância neste início de século, em nossa sociedade. A evolução dos meios de comunicação de massas e das técnicas de manipulação da opinião pública estão postas à disposição de Partidos Políticos, Ideologias e interesses Geopolíticos contemporâneos atuantes entre nós. Não é difícil identificar suas raízes, heranças e herdeiros, pois o diabo não consegue esconder o rabo e o chifre por muito tempo.
Neste momento, só não vê entre nós quem são os herdeiros ideológicos daqueles que, por quase um século, ensangüentaram e atrasaram meio mundo com seu messianismo redentor, quem não quer ou está cooptado.
E que bom futuro nos aguarde, mercê de nossa lucidez e ações que possamos desenvolver e compartilhar. Que nossa “rãzinha” não tenha necessidade de inchar muito e que possamos nos lembrar que felizes são os povos que não precisam de salvadores messiânicos e nem se disponham a ouvir o canto de sereias redentoras, ultrapassadas e relançadas por “rãzinhas” e “argentinos”. E que Deus nos conserve a autoestima, a pluralidade, as imperfeições e o bom senso.
Título e Texto: Valfrido M. Chaves

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