Alberto Gonçalves
Seria esquisito que, após
reduzir Roma a cinzas, Nero resolvesse organizar um seminário de proteção
civil. Mas não só Nero nunca empreendeu semelhante coisa como, muito
provavelmente, não teve responsabilidades no episódio do fogo. Esquisito de
facto é que alguns dos principais responsáveis pelo estado do País apareçam a
dar lições sobre a melhor maneira de o governar.
Augusto Santos Silva, por
exemplo, confessa-se preocupado com a “turbulência” na coligação governamental.
Pedro Silva Pereira declara as novas medidas de austeridade um “disparate
econômico” e incita o PS a liderar a contestação popular. E António Costa
considera as medidas “ofensivas” e sentencia o falhanço das políticas seguidas.
Não discuto a pertinência dos
comentários. Acho que se devia discutir imenso a legitimidade de quem comenta.
Se não me engano, as personalidades referidas pertenceram, enquanto ministros,
aos dois governos que mais contribuiram para esfarrapar a economia e as
finanças nacionais (o dr. Costa, duvidosa honra lhe seja feita, pertenceu
apenas a um). Em condições normais, essas eminências passariam o ano e pouco
decorrido desde as “legislativas” fechadas em casa, de preferência com a luz
apagada para atenuar o embaraço delas e o rancor alheio. Em condições normais,
as eminências estariam decididas a não sair de casa nos próximos três lustros,
talvez acendendo a luz a meio do segundo.
![]() |
Pedro Silva Pereira, foto: Pedro Elias |
Em Portugal, onde o descaramento
constitui uma reserva sem fundo, as eminências andam literalmente por aí, a
aliviar-se de palpites e sermões a propósito do buraco que ajudaram a
construir. De acordo com o Correio da
Manhã, até o principal obreiro do buraco regressou momentaneamente do
exílio parisiense para jantar em Lisboa com uma fracção dos comparsas no restaurante O Poleiro. É
provável que o nome traduza certas expectativas. É plausível que as
espectativas tenham razão de ser, e que, além da memória e vergonha, isto
também não tenha remédio.
Título e Texto: Alberto Gonçalves, Sábado, nº 438, de
20 a 26-9-2012
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