Rogério Furquim Werneck
A condução da política
econômica vem sendo marcada por duas dificuldades: improvisação e prevalência
do imediatismo sobre preocupações mais permanentes, de prazo mais longo. São
tantos os exemplos que não há como dar conta de todos neste artigo. Mas basta
mencionar alguns deles para que a extensão dessas dificuldades possa ser
percebida.
1. Desde meados do ano
passado, o governo vem fazendo grande alarde com a desoneração da folha de
pagamentos da indústria. O que começou como um projeto-piloto, que favorecia
quatro setores, assumiu agora proporções bem maiores.
Desonerar a folha é, em
princípio, uma boa ideia. Mas, em vez de simplesmente reduzir a contribuição
patronal, o governo partiu para desastrada mudança de base fiscal. Contribuição
sobre faturamento e não mais sobre a folha, com alguma desoneração embutida na
troca.
O problema é que a mudança
reintroduz, pela porta dos fundos, a famigerada tributação cumulativa sobre
faturamento, uma deformidade fiscal desnecessária da qual o país havia
praticamente se livrado, graças ao louvável esforço de reforma tributária do
primeiro governo do presidente Lula.
2. Desonerar a energia
elétrica também era uma boa ideia. Mas, para que houvesse redução significativa
da brutal carga tributária que recai sobre as tarifas, era essencial que os
governadores fossem engajados no esforço de desoneração, já que boa parte da
carga advém das escorchantes alíquotas de ICMS impostas pelos Estados. Não
seria fácil, mas a União teria muito o que oferecer numa negociação séria com
os Estados sobre a questão. Em vez de tentar avançar nessa linha, o que fez o
governo? Preferiu uma redução arbitrária de preços pagos ao produtor de
energia, que desincentiva investimentos na expansão da oferta e deixa a conta
da desoneração nas costas do contribuinte.
3. Desde pelo menos 2008, o
governo parece empenhado num esforço metódico de demolição da construção
institucional que redundou na Lei de Responsabilidade Fiscal.
Especialmente lamentável nessa
demolição foi a violação da regra de estrita separação entre contas do Tesouro
e das instituições financeiras federais. Nos últimos anos, montou-se no BNDES
um gigantesco orçamento fiscal paralelo, alimentado por fartas transferências
diretas do Tesouro, não contabilizadas nem no Orçamento e nem nas estatísticas
de dívida líquida e de resultado primário. Com o avanço da demolição
institucional, tal esquema foi agora estendido à CEF e ao Banco do Brasil, que
passaram a ser também nutridos, nas mesmas bases, com generosas transferências
do Tesouro.
4. Políticas improvisadas
costumam ser marcadas por pouca reflexão prévia e percepção incompleta dos
prováveis desdobramentos de medidas supostamente bem-intencionadas. É o que se
observa com especial nitidez nas impensadas restrições que o governo decidiu
impor à exploração do pré-sal. De um lado, exige-se que a Petrobras tenha
monopólio da operação dos campos do pré-sal e participação de pelo menos 30% em
cada consórcio que venha a explorar tais campos. De outro, que os equipamentos
utilizados no pré-sal tenham nada menos que 65% de conteúdo nacional. Está a
cada dia mais claro que tais restrições vêm impondo enorme ônus à Petrobras,
sobrecarregando em demasia suas necessidades de investimento e trazendo atrasos
inaceitáveis à exploração do pré-sal. A questão agora é como livrar a Petrobras
e o pré-sal dessa estapafúrdia camisa de força, sem que o recuo imponha custo
político excessivo ao governo.
5. Na condução da política
comercial, o governo achou que o Brasil poderia, impunemente, esquecer sua
estatura e passar a se comportar como uma Argentina. Agora, queixa-se da perda
do respeito internacional que, a duras penas, o país havia conseguido angariar
nessa área, ao mostrar, durante anos, que estava seriamente engajado num jogo
cooperativo de combate ao cerceamento do comércio mundial. Bastaram poucos
meses para que tal reputação fosse destruída. Agora é tarde. E não adianta
esbravejar.
Título e Texto: Rogério Furquim Werneck, O Globo,
28-9-2012
Colaboração: Rafael Picate
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Não publicamos comentários de anônimos/desconhecidos.
Por favor, se optar por "Anônimo", escreva o seu nome no final do comentário.
Não use CAIXA ALTA, (Não grite!), isto é, não escreva tudo em maiúsculas, escreva normalmente. Obrigado pela sua participação!
Volte sempre!
Abraços./-