domingo, 10 de março de 2013

As histórias do dr. Soares

Alberto Gonçalves

Não sou monárquico, mas dado o gabarito dos nossos republicanos praticamente não sobra alternativa. Mário Soares, um dos mais notáveis representantes da espécie, decidiu avisar o Governo que, se não se demitir "a bem" (cito), sairá "a mal, com o povo indignado, como sucedeu no fim da monarquia".
Nem mais. É do conhecimento geral que a república não foi um motim concebido por umas dúzias de rústicos do Rossio. E que a população se levantou em peso para festejar o advento da democracia autêntica. E que o partido dominante do novo regime se perpetuou quase ininterruptamente no poder sem a ajuda de fraudes. E que a liberdade de expressão, a tolerância e o progresso constituíram os pontos fortes dos senhores que tomaram conta disto. E que a estabilidade política e social então iniciada influenciou um século de prosperidade de que ainda beneficiamos.
Agora a sério, é rara a semana em que o dr. Soares não se esforce por provar que a sabedoria da idade é uma força de expressão e, com frequência, uma completa patranha. Nesta e noutras questões, a pergunta que se impõe é: o dr. Soares pretende enganar quem? E a resposta é: descontados três ou quatro fervorosos da Carbonária, provavelmente apenas a si próprio. Por mim, gosto que a imprensa corra a ouvi-lo a pretexto de diversos assuntos, e só lamento que não o faça a pretexto de todos.
Julgo ser consensual a expectativa em ouvir a opinião abalizada do dr. Soares acerca de: receitas de sushi, campeonatos da bola, o bosão de Higgs, a sucessão de Ratzinger, aromoterapia, energia nuclear, séries do canal HBO, candeeiros do Ikea, o novo álbum de John Grant, depressão pós-parto, técnicas de betonagem e literatura russa. Em tempos de crise, duvido que rir seja exactamente o melhor remédio. Porém, é um óptimo paliativo.
Título e Texto: Alberto Gonçalves, Diário de Notícias

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