José Milhazes
Não se vai assinalar o 40º aniversário do
25 de Novembro da mesma forma que se celebrou o do 25 de Abril. Cabe perguntar:
porque quer o PS fazer-nos acreditar que o PCP é hoje diferente do de então?
Enquanto o 25 de Novembro não
possuir o mesmo estatuto do que o 25 de Abril, andaremos a admitir a existência
de meias verdades na História recente de Portugal. Se celebramos a queda
de uma ditadura de direita, por que razão é que não fazemos o mesmo em
relação à data em que foi travada a imposição de uma ditadura da
extrema-esquerda?
Não há dúvida que a maioria
dos portugueses deve muito ao movimento dos capitães de Abril, que entrou na
História como uma forma exemplarmente pacífica de pôr fim a uma longa ditadura
de direita, dando origem à construção da democracia no país. Mas também é
verdade que alguns desses militares, apoiados por um grande leque de forças
políticas, travaram a queda de Portugal no precipício da ditadura comunista
opondo-se a outros militares “de Abril”.
Livrámo-nos de uma ditadura e
alguns de nós queriam meter-nos noutra (aqui emprego nós porque, naquela
altura, eu estava do lado dos que queriam lançar Portugal numa perigosa
experiência política e social). Só por isso, o 25 de Novembro merecia igual
tratamento do 25 de Abril. Mas como há alguns que continuam a considerar que
não é assim porque fascismo e comunismo são coisas diferentes, tendo este
último regime um “carácter mais humano”, até “progressista”, coloco a pergunta:
qual a ditadura comunista do século XX menos sanguinária do que o regime que
caiu em Portugal com o 25 de Abril?
Podem acusar-me de querer
rever a História de Portugal e aceito essa acusação se se considerar que é
preciso pôr fim a esta e outras meias verdades, acabar com o “partidarismo” da
História, conceito defendido pela extrema-esquerda comunista para deturpá-la e
justificar as maiores barbaridades. Aqui deve apenas haver um critério: a
verdade dos factos.
Outra das meias verdades é o
papel do Partido Comunista Português na nossa História. Ninguém põe em dúvida
que essa força política esteve na vanguarda da luta contra o Estado Novo, mas
isto é apenas metade da verdade porque, como é sabido, esse partido sempre
lutou e continua a lutar por uma sociedade totalitária e nunca se demarcou de
muitas posições vergonhosas tomadas no passado. O PCP nunca condenou a
existência do Muro de Berlim, mas lamentou e lamenta a sua queda; nunca levantou
a voz contra os crimes internos e externos da URSS, mas lamentou e lamenta a
sua queda, como se ainda existissem dúvidas acerca de qualquer regime
totalitário de extrema-esquerda.
Por coincidências ideológicas,
e também por dinheiro, o PCP e o seu dirigente máximo, Álvaro Cunhal, estavam
dispostos a sacrificar Portugal em prol do imperialismo soviético. E por falar
em Cunhal, o critério de análise da vida e obra deste homem não deve também
ficar por meias verdades. Era um antifascista, um tradutor de Shakespeare e um
escritor; mas, por outro lado, era um político demagogo, autoritário e
narcisista. Não suportava ninguém que lhe fizesse sombra na direcção do PCP.
Mas tudo isso poderia ser tema
de discussão apenas para historiadores, não fosse a importância de alguns
factos no momento actual. E o mais importante é que não se vai assinalar o 40º
aniversário do 25 de Novembro da mesma forma que se celebrou o 40º aniversário
do 25 de Abril. Porque será que o Partido Socialista acredita, ou quer-nos
fazer acreditar, que o actual PCP é diferente, embora saibamos que os
comunistas nunca reconheceram erros na sua política durante o PREC e viram no
25 de Novembro o início de uma contra-ofensiva contra as “conquistas de Abril”?
Não duvido que haja
oportunismo da parte do PSD e do CDS-PP quando pretendem assinalar agora o 25
de Novembro — afinal podiam ter acordado mais cedo. Mas considero
que, também da parte do PS, nem tudo é claro e transparente. A proximidade do
poder parece cegar os políticos.
P.S.: Se em Lisboa existe uma Avenida Álvaro Cunhal, deveria também haver outra com o nome do dirigente soviético Leonid Brejnev, pois foi ele que mandou parar “a transformação da revolução burguesa em revolução proletária”.
P.S.: Se em Lisboa existe uma Avenida Álvaro Cunhal, deveria também haver outra com o nome do dirigente soviético Leonid Brejnev, pois foi ele que mandou parar “a transformação da revolução burguesa em revolução proletária”.
Título e Texto: José Milhazes, Observador,
25-11-2016
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