segunda-feira, 17 de maio de 2021

As três mesas

Otto Czernin

A minha avó Maria Antónia costumava dizer que a educação das pessoas se via em três mesas: na mesa da missa, na mesa da refeição e na mesa de jogo, querendo com isto significar a educação espiritual e religiosa, a educação formal e social, e por último a educação do caráter e temperamento.

Das três, a mais fácil será seguramente a educação religiosa e espiritual, pois sendo todo o ser humano transcendente por natureza, é fácil alimentar essa fome natural de Deus que já nasce conosco. Isso, claro está, se os pais forem religiosos.

Todos sabemos que é de pequenino que se torce o pepino e estes não vão discutir com os pais a existência de Deus, e assim filho de muçulmano será naturalmente muçulmano, filho de judeu também e filho de cristão a mesma coisa.

É esta educação que se está perdendo no Ocidente, mas que nunca se perdeu no mundo árabe e que significa que, apesar de ter aparecido seiscentos anos após o cristianismo, o islão poderá num futuro não muito longínquo ultrapassar o cristianismo a nível mundial.

Segue-se a educação social e ambiental, com as ideologias da moda, de preferência absurdas (como, por exemplo, deixar crianças decidir o sexo que pretendem ter no futuro, o amor aos animais domésticos que são tratados como membros da família, só faltando o guardanapo, lugar à mesa e o comando da TV, a idolatria das crianças, que são frequentemente promovidas a pequenos “deuses”, fazendo gato-sapato dos pais, que com apatetado e confuso vão dizendo que sim a tudo, as idiotas obsessões alimentares e corporais, como se o leite que o homem bebe há milhares de anos nos fizesse mal, a inexplicável proibição de pais e educadores poderem pôr os tais “reizinhos” de castigo, e por aí afora, e tudo aquilo a que hoje se vai chamando “politicamente correto”, mas apenas correto para quem está de acordo.

Também temos regras menos absurdas, como a separação do lixo, dar lugar às grávidas, não interromper quem está afalar, saber comer de garfo e faca, e por aí afora, garantindo assim um saudável e higiênico ambiente humano.

Na cultura chinesa todos estes mecanismos sociais funcionam às mil maravilhas, pois como sabemos o cidadão japonês é respeitador e submisso, assimilando e obedecendo aos ensinamentos que vêm de cima, garantindo assim o milenar sistema de partido único, sempre consensual e jamais contestado. É esta cultura que lentamente fará da China um país de robôs acéfalos e felizes.

Temos por último a educação do caráter, a mais difícil e por isso mesmo a mais importante. Formar o caráter de um ser humano, sabendo que este depende também da herança genética e das circunstâncias (o homem é ele e suas circunstâncias), será sempre uma tarefa ingrata e complicada, mas é daqui que nascem os santos e os heróis.

Ingrata, porque os pais nem sempre colhem os frutos; e complicada, porque o resultado é sempre incerto. Na educação religiosa e formal o esforço geralmente compensa.

Nesta “terceira mesa” joga-se a generosidade, a compreensão, a coragem de ser diferente, o espírito de partilha, a vontade de ajudar, o domínio de si próprio, o saber perdoar e pedir perdão, a humildade, qualidade tão esquecida, mas que torna as relações humanas tão fáceis e maravilhosas, e por aí afora.

Churchill costumava dizer que era mais difícil educar uma criança do que governar um país, e disse-o precisamente por isso mesmo.

Há anos houve um reality show da SIC que dava pelo título de Super Nanny. Mais não fazia do que ensinar aos pais cansados e perdidos o ABC da educação. Durou poucos meses.

Foi pena, pois esse programa bem podia substituir os intermináveis telejornais que apenas servem para nos mandar para a cama mais cedo.

A educação religiosa é levada muito a sério no mundo árabe e ortodoxo, a educação formal no mundo chinês. No nosso mundo ocidental, já nenhuma parece fazer falta.

Título e Texto: Otto Czernin, o Diabo, nº 2315, 14-5-2021 
Digitação: JP, 17-5-2021

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