sexta-feira, 28 de maio de 2021

FHC, Lula e a teoria dos tolos

Ao apoiar um criminoso, Fernando Henrique Cardoso desmerece a própria história

Guilherme Fiuza

Não é que seja embaraçoso para Fernando Henrique apoiar Lula a esta altura do campeonato. Ele parecia bem à vontade até. A coisa fica embaraçosa é para o país mesmo — pelo menos a parte dele que ainda quer ser chamada de país e não de bando. Como colocar lado a lado a regência do Plano Real e a lavagem de reputação de um ladrão sem se confundir entre mocinhos e bandidos na aula de História?

Esquece aula de História — que se tornou infelizmente um lugar perigoso. Quem há de negar? Em qualquer ponto do território nacional você pode achar que está numa aula de História e estar, na verdade, num comício de um simpático professorzinho do Psol. O problema é que as distorções não vêm só dessa panfletagem dominante. A tentação ao proselitismo fantasiado de conhecimento está em toda parte. E a prova disso é essa tese de que FHC e Lula são irmãos siameses num projeto de dominação “da esquerda”. O nome disso é ignorância.

Para levar essa tese adiante numa aula de História — talvez com um professorzinho “de direita” — seria preciso no mínimo jogar fora dez anos dela, a História. Isso nunca foi problema para os totalitários de Stalin e jamais será problema para panfletários de qualquer estirpe. O que importa é montar um clubinho de adeptos da sua apologia, seja ela qual for. Repetindo para quem não estava prestando atenção: apologia, não ideologia. Não há vestígios ideológicos no arsenal intelectual (sic) dos apologistas. Eles nem chegam lá.

A década que estamos te convidando a apagar da História do Brasil para ver se cola essa teoria tosca da armação Lula & FHC como um “mecanismo” de dominação “da esquerda” (haja clichê) vai de 1993 a 2003. O que aconteceu nesse período?

Aconteceu a maior reforma institucional do Brasil contemporâneo. Foi uma reforma LIBERAL — introduzindo responsabilidade fiscal, privatizações e saneamento monetário, tudo aquilo que está na cartilha da suposta esquerda como “neoliberal”, “de direita” etc. Agora tirem as crianças da sala: essa reforma foi regida por Fernando Henrique Cardoso e tinha como inimigo mortal o PT de Lula, que tentou de todas as formas sabotar o Plano Real. E agora? Onde estava o pacto, o mecanismo, o teatro, a ópera ou sei lá o que de Lula e FHC que “desde sempre foram caras-metades de um plano de hegemonia esquerdista” etc., etc., etc.?

Ah, mas o Plano Real foi do Itamar… não foi, não. FHC era o quarto ministro da Fazenda de Itamar Franco. Vamos repetir para os que estavam trocando figurinhas de direita/esquerda com o coleguinha ao lado no fundo da sala: FHC era o QUARTO ministro da Fazenda de Itamar Franco, que já tinha tentado no posto até Gustavo Krause (que pode ser gente boa, poeta, ecologista, mas não faria um Plano Real nem por receptação mediúnica). Ou seja: Itamar Franco estava perdido, perdidinho, perdidinho da silva, perdidão, perdidaço sobre o que fazer com a hiperinflação. Mas teve uma boa intuição política e depois teve coragem para blindar a equipe.

Cinco anos depois de lançado o Plano Real, Itamar passou a tentar sabotá-lo, juntando-se a Lula, Dirceu e companhia contra a “direita” de FHC. Quase conseguiram afundar o plano em 1999, quando a maxidesvalorização do real em meio à crise da Rússia representou risco real de volta da famigerada correção monetária. Mas os “neoliberais” de FHC, Pedro Malan à frente, conseguiram manobrar na guerra sangrenta contra o país e salvar essa moeda que mais de duas décadas depois está aí na sua mão protegendo o valor do que você ganha com o seu trabalho. Mas isso tudo foi só um teatro “da esquerda” para preparar o poder para o Lula? Fecha esse álbum de figurinhas e vai estudar, preguiçoso.

PS1: FHC está fazendo um papelão e se desmoralizando ao vivo ao apoiar um criminoso.

PS2: Toda vez que você chama um picareta de “esquerdista” ele sorri de orelha a orelha e renova o verniz humanitário que lhe permite viver no conforto do seu capitalismo avarento fantasiado de revolucionário.

Título e Texto: Guilherme Fiuza, revista Oeste, nº 62, 28-5-2021

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