A maioria dos jornalistas brasileiros tem certeza de que só acontece aquilo que eles publicaram; o resto não existe
J. R. Guzzo
Por que não saiu nada, ou
quase nada, na maioria dos órgãos de imprensa? Porque as manifestações públicas
eram de apoio ao presidente Jair Bolsonaro e às Forças Armadas, contra o STF e a
corrupção, mais o resto do programa que se cumpre em eventos assim. Nos manuais
de jornalismo em vigor hoje nas redações, esse tipo de acontecimento não pode
ser publicado, como notícias de disco voador e aparições de Nossa Senhora de
Fátima; os comunicadores decidiram que tais “conteúdos”, como se diz hoje,
podem iludir o público na sua boa ingenuidade — e, portanto, é seu dever ético
impedir que tais fatos cheguem ao conhecimento do povão. Imagine se as pessoas
acreditarem que há gente a favor de Bolsonaro e contra o Supremo? Não pode: é
um claro desrespeito à religião oficial da mídia. Não é notícia; é o mal. O mal
tem de ser combatido. E por aí vamos.
A partir dessas convicções, o
noticiário — e não apenas o político — passou a ser um animal diferente: só
devem ser passados para o conhecimento do público, segundo o regime hoje em
vigor nas redações brasileiras, os fatos que os jornalistas consideram
apropriados para o conhecimento do leitor, ouvinte ou espectador. Todo o resto
deve ser eliminado das edições. É uma das mais extraordinárias operações de
censura jamais montadas na imprensa nacional: quem faz a função dos censores
são os próprios jornalistas.
De mais a mais, segundo decidiram os meios de comunicação, o jornalismo de hoje tem de ser, obrigatoriamente, uma atividade política, e os jornalistas, em consequência, devem agir como militantes partidários ao exercer a sua atividade profissional.
Têm de obedecer aos
mandamentos desse partido único que apoia o STF, Lula e seus amigos, o Psol e
outros sócios do PT, o “distanciamento social”, o “fique em casa”, os
privilégios do alto funcionalismo público, a agricultura familiar, as invasões
de propriedade — mais o arrastão do racismo-feminismo-índios etc. etc. etc. que
todos conhecem tão bem.
Abolir as realidades por
decreto, como está fazendo a mídia brasileira, pode dar certo ou dar errado. Em
Cuba dá certo. Na campanha pelas eleições diretas no Brasil deu errado. O
problema para os novos censores, aí, é o complexo do galo — acha que o Sol
nasce porque ele canta. A maioria dos jornalistas brasileiros tem certeza de
que só acontece aquilo que eles publicaram; o resto não existe. Qualquer
despropósito vira verdade se aparece no noticiário, e nenhuma verdade existe se
não aparece. Tudo bem — mas, frequentemente, as realidades acabam mostrando a
sua cara. Na imprensa soviética, o Muro de Berlim não caiu. O problema, como se
sabe perfeitamente, é que ele caiu.
Título e Texto: J. R. Guzzo,
Gazeta do Povo,
via revista Oeste, 3-5-2021, 23h07
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