Henrique Pereira dos Santos
Hoje está em altas a afirmação
de que a ONU declara que há um genocídio em Gaza, um título que, com poucas
variações, se encontra em dezenas de publicações nacionais e internacionais.
Há um fundo de verdade nisto,
há um novo relatório que diz que Israel encaixa em quatro dos cinco critérios
para ser acusado de genocídio do povo palestiniano.
Só que não há, nem poderia
haver, nenhuma declaração da ONU sobre isso, quer porque as acusações de crimes
se resolvem em tribunal (no caso, no Tribunal Penal Internacional), quer porque
a ONU tem um pesado e rígido sistema de regras para tomar decisões (no caso, o
relatório ainda vai ser apresentado à Assembleia Geral da ONU, de outubro de
2025).
O relatório em causa é de uma comissão,
composta por três pessoas, nomeadas em 2021 pelo Conselho dos Direitos
Humanos da ONU e convém ter em atenção os resultados da votação para a criação desta
comissão, tendo em atenção que países votaram a favor, contra e se abstiveram.
A favor: Argentina, Armenia, Bahrain, Bangladesh, Bolivia (Plurinational State of), Burkina Faso, China, Côte d’Ivoire, Cuba, Eritrea, Gabon, Indonesia, Libya, Mauritania, Mexico, Namibia, Pakistan, Philippines, Russian Federation, Senegal, Somalia, Sudan, Uzbekistan and Venezuela (Bolivarian Republic of)
Contra: Austria, Bulgaria, Cameroon, Czechia, Germany,
Malawi, Marshall Islands, United Kingdom of Great Britain and Northern Ireland
and Uruguay
Abstenção: Bahamas, Brazil, Denmark, Fiji, France, India, Italy,
Japan, Nepal, Netherlands, Poland, Republic of Korea, Togo and Ukraine].
Olhando para a sólida
reputação dos países que votaram a favor desta comissão em matéria de direitos
humanos, não admira que a referida comissão siga os passos do Secretário Geral
da ONU na relativização do 7 de outubro de 2023 ("178. At the outset, the
Commission notes that these events in Gaza since October 2023 have not occurred
in isolation. They were preceded by decades of unlawful occupation and unlawful
settlement, with racial segregation or apartheid,403 under an ideology
requiring the removal of the Palestinian population from their lands and their
replacement").
O relatório é uma autêntica
palhaçada, como se pode ler aqui (ao contrário deste jornalismo confusionista, as
ligações para fontes primárias de informação existem neste post).
Não admira, por isso, que um
dos critérios para acusar Israel de genocídio seja tratado neste relatório de
uma forma completamente ridícula, que a BBC sintetiza melhor do que eu o faria
(mas podem ir ler o relatório original para verificar que a síntese da BBC
traduz o que está no relatório): "Imposing measures intended to prevent
births through the December 2023 attack on Gaza's largest fertility
clinic, reportedly destroying around 4,000 embryos and 1,000 sperm samples and
unfertilised eggs".
O que me interessa, neste
post, não é a lavandaria de informação do Hamas em que a ONU se transformou,
isso é um dado do problema e não seria de esperar outra coisa de uma
organização em que as ditaduras e estados que não respeitam o direito são a
esmagadora maioria, o extraordinário é a facilidade com que a imprensa
confusionista (desculpem o pleonasmo) de países em que há liberdade de
expressão resolve transformar um relatório ridículo de três pessoas
manifestamente anti-Israel, independentemente de terem sido nomeadas por um
conselho da ONU, numa declaração da ONU.
A estupidez disto tudo e a
forma como a imprensa se esforça por erodir a confiança dos seus leitores no
que produz é de ficar de boca aberta.
Título e Texto: Henrique
Pereira dos Santos, Corta-fitas,
16-9-2025

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