Ignorar o sucesso econômico da Argentina de Milei não é jornalismo, é militância ideológica. Portugal teria muito a aprender
Gianluca Ubrano
Em dezembro de 2023, o economista e professor catedrático Javier Milei assumia a presidência da Argentina. Riram-se dele. Apelidaram-no de “inexperiente”, “anarcopitalista louco”, “fascista” e até de “antissemita”, mesmo Milei sendo assumidamente pró-Israel. Hoje, muitos desses críticos estão em silêncio.
A dois meses das eleições legislativas na Argentina, nas quais o partido de Milei, La Libertad Avanza, estava isolado nas sondagens, a comunicação social voltou a publicar notícias sobre a Argentina, atinentes às acusações que envolvem Karina Milei, a irmã do Presidente da Argentina, no contexto de alegadas propinas na Agência Nacional de Deficiência.
Enquanto os media portugueses
insistem em enfatizar este ruído político, permanecem em silêncio perante o
milagre econômico levado a cabo pelo governo chefiado por Milei. A compreensão
do fenômeno econômico argentino sob a presidência de Javier Milei exige mais do
que uma análise superficial centrada em escândalos e nas polémicas mediáticas.
Sob a liderança do economista
libertário, a República da Argentina transformou-se num verdadeiro laboratório
de políticas liberais com resultados concretos, cuja compreensão requer
disciplina analítica e atenção aos indicadores econômicos, e não apenas aos
escândalos que facilmente dominam as manchetes dos jornais em Portugal.
Diagnóstico inicial da
Argentina em 2023, marcada pelo caos macroeconómico e um Estado asfixiador
Quando Milei assumiu a
presidência, herdou um país mergulhado numa crise estrutural profunda. A
inflação anual situava-se em 211,4%, corroendo salários, poupanças e poder de
compra. A pobreza atingia quase os 58% da população, e a indigência registava uma
percentagem de 18,1%, evidenciando a vulnerabilidade de milhões de argentinos.
O Estado, caracterizado pela
sua ineficiência e por uma burocracia excessiva, funcionava como um instrumento
de drenagem de riqueza, com despesas públicas elevadas e recurso à impressão
monetária para financiar o défice público, perpetuando as pressões inflacionárias
e dificultando a acumulação de reservas internacionais.
A dívida pública e os défices
fiscais limitavam consideravelmente a margem de manobra política, ao passo que
o setor externo enfrentava défices persistentes e uma moeda desvalorizada, com
o peso argentino a perder mais de metade do seu valor face ao dólar.
Internamente, o mercado de trabalho apresentava distorções significativas, com salários reais em declínio e crescimento da informalidade. Durante anos, muitos argentinos guardaram dólares em casa como proteção contra a inflação e a desvalorização do peso. Era comum encontrar notas escondidas em colchões, gavetas ou frascos de biscoitos, enquanto famílias e comerciantes improvisavam cofres caseiros para preservar o pouco que tinham.
A gravidade da situação exigia
medidas disruptivas para estabilizar a macroeconomia, para restaurar a
confiança doméstica e externa, equilibrar as contas públicas marcadas por
décadas de desequilíbrios fiscais e para criar condições para um crescimento
sustentável.
As reformas centrais do
plano Milei: consolidação tributária, reformas pró-mercado e reestruturação do
Estado
Desde o primeiro dia do seu
mandato, Milei definiu como prioridades a redução da dimensão do Estado, a
disciplina fiscal e monetária, a liberalização cambial e financeira, bem como a
desregulação económica e tributária — medidas que constituem o núcleo do seu denominado
“plano motosserra”.
O Estado argentino que outrora
apresentava uma dimensão excessiva, com dezoito ministérios e centenas de
secretarias e subsecretarias que drenavam recursos públicos sem gerar ganhos
significativos em eficiência ou qualidade dos serviços, foi alvo de uma
reestruturação. Ministérios como o do Género foram extintos, passando para
apenas nove ministérios, e aproximadamente 38 mil postos de trabalho no setor
público foram suprimidos, representando cerca de 5% do PIB em despesas
públicas.
Esta redução massiva não teve
como objetivo apenas a poupança de recursos, mas também o de sinalizar ao
mercado e à sociedade que o Estado deixaria de atuar como um agente predador,
tornando-se disciplinado e sustentável.
A disciplina fiscal e
monetária constituiu outro eixo central da reforma. Ao eliminar o financiamento
monetário do défice pelo Banco Central, Milei rompeu com décadas da monetização
da dívida pública, uma das principais causas da hiperinflação crónica.
Paralelamente, instituiu-se
uma flexibilidade monetária controlada, permitindo à economia ajustar-se sem
recorrer a intervenções artificiais que distorcessem os preços. A supressão de
subsídios generalizados obrigou os consumidores e empresas a adaptarem-se a preços
mais realistas, criando incentivos para uma utilização mais eficiente dos
recursos.
O resultado destas medidas foi
o primeiro excedente primário em catorze anos. Um sinal claro de recuperação da
saúde fiscal, estabelecendo alicerces para o crescimento futuro.
A liberalização cambial e
financeira teve impactos igualmente significativos. Com a eliminação do cepo
cambial, Milei permitiu que indivíduos e empresas tivessem livre acesso a divisas,
incentivando o investimento externo e reforçando as reservas internacionais,
que atingiram cerca de 36,8 mil milhões de dólares em abril de 2025.
Importa frisar que em abril de
2025, a administração argentina renovou o acordo de swap cambial
com a China no valor de 5 mil milhões de dólares. Apesar das fortes críticas ao
governo de Pequim, este mecanismo permitia ao Banco Central aceder a liquidez
em yuan para reforçar as reservas internacionais e assegurar compromissos de
pagamento externo.
O peso argentino valorizou aproximadamente
44% faces ao dólar, tornando-se uma das moedas com melhor desempenho global em
2024. Esta valorização não restaurou apenas a confiança na moeda nacional, mas
também beneficiou exportações agrícolas e energéticas, resultando num superavit comercial
recorde de quase 19 mil milhões de dólares em 2024.
Este fortalecimento da moeda e
da balança externa incrementou a confiança dos investidores estrangeiros.
Adicionalmente, estas reformas conferiram margem de manobra ao governo para
implementar políticas estruturais sem recorrer a endividamento externo.
Ademais, o governo promoveu
uma desregulação fiscal e tributária significativa. Foram eliminados impostos
como o Impuesto PAIS, tributações sobre cartões no estrangeiro e retenções
agropecuárias, enquanto as tarifas sobre eletrônicos e bens de consumo foram
reduzidas ou abolidas. Estas medidas aliviaram a carga fiscal sobre as famílias
e as empresas, mas também dinamizaram o comércio e estimularam o investimento
privado.
A abertura económica e o
Regime de Incentivos para Grandes Investimentos incentivaram empresas como a
Decathlon e a Stellantis a investir na Argentina. A Shell investiu no setor
energético em Vaca Muerta e a Ganfeng Lithium comprou projetos de exploração do
lítio.
Este rol de reformas gerou uma
reorientação estrutural do modelo económico argentino, capaz de criar condições
para a deflação, valorização da moeda, recuperação do PIB e aumento do poder de
compra real.
Resultados visíveis
(2024–2025): inflação, PIB, pobreza e moeda
As reformas implementadas por
Milei começaram a traduzir-se rapidamente em resultados macroeconómicos
tangíveis, oferecendo um contraste notório face ao caos deixado pelo
Kirchnerismo. A inflação, que no início do seu mandato se situava em níveis
astronómicos — 211,4% ao ano —, registou uma trajetória de queda sustentada. Em
2024, a taxa anual caiu para cerca de 117,8%. Enquanto a inflação mensal
atingiu, em maio de 2025, o nível mais baixo desde 2020, com apenas 1,5%,
estabilizando em 1,6% em junho.
É tempo de reconhecer que
Milei foi eleito sob a promessa de baixar a inflação, e em meados de 2026,
quase sem falhas, essa inflação já não será tema.
É legítimo apontar que o
aumento do desemprego formal se traduziu num crescimento expressivo do trabalho
informal. Contudo, esse fator não se traduz, por si só, a um retrocesso no
padrão de vida das pessoas. A estabilização monetária e o controlo da inflação
eliminaram a incerteza quotidiana sobre os preços dos alimentos, enquanto
a desregulação, com a consequente eliminação dos controlos de preços, permitiu
corrigir distorções no mercado habitacional.
A liberalização das rendas
atraiu nova oferta e contribuiu para reverter a crise imobiliária, traduzindo-se,
em última instância, numa melhoria concreta das condições de vida dos
contribuintes argentinos.
O impacto sobre a pobreza e a
indigência foi igualmente notório. Apesar de um aumento temporário no primeiro
semestre de 2024, quando a taxa de pobreza atingiu 52,9%, no início de 2025
apresentou uma redução significativa para 31,6%.
Estes números refletem a
recuperação do poder de compra e da capacidade económica das famílias, mas
também os efeitos de políticas sociais complementares, como a expansão da
Asignación Universal por Hijo (AUH), que permitiu reduzir a pobreza infantil em
mais de um milhão de crianças de acordo com os dados divulgados pela UNICEF.
No plano da produção e
crescimento económico, a economia argentina mostrou sinais claros de
recuperação após o choque inicial das reformas. Embora o PIB tenha registado uma
contração de 1,7% ao longo de 2024, o quarto trimestre apresentou um
crescimento de 5,5% em relação ao mesmo período de 2023, enquanto o primeiro
trimestre de 2025 já apontava para uma expansão anualizada de 5,8%.
Isto deve-se à diversificação
do tecido económico argentino. Além da aposta no setor agroexportador que é o
tradicional motor da economia argentina, o governo de Milei tem igualmente
sinalizado a intenção de diversificar os vetores estratégicos de
desenvolvimento. Neste sentido, destaca-se a re-aposta em energia
nuclear, área na qual a Argentina possui uma tradição tecnológica relevante, e
que poderá constituir um pilar de soberania energética e de competitividade
industrial.
Adicionalmente, o executivo
delineou medidas de desregulação orientadas para atrair capital e talento em
inteligência artificial. O objetivo passa por posicionar a Argentina como um polo
regional de inovação tecnológica, capaz de captar investimento externo, e
integrar-se nas cadeias globais de valor associadas à economia digital.
Estes resultados demonstram
que, ao contrário do que frequentemente destacam os media em Portugal, o
governo de Milei não se limita a uma narrativa de escândalos políticos.
Política externa e
diplomacia pragmática
A gestão de Javier Milei não
se limita à esfera económica. A sua política externa demonstra uma postura
pragmática e estratégica, especialmente no contexto das Malvinas, onde a
Argentina historicamente enfrentou impasses diplomáticos com o Reino Unido.
Contrariamente a abordagens
confrontacionais no passado, Milei optou pela diplomacia pragmática, mantendo
intacta a reivindicação de soberania argentina, mas criando canais de
cooperação tangíveis que geram benefícios imediatos para a população e a
economia.
Um exemplo notório foi o
acordo para restabelecer um serviço aéreo entre São Paulo, Córdoba e as ilhas
Malvinas, incluindo escalas mensais e a facilitação de visitas humanitárias de
familiares de soldados argentinos caídos. Estas iniciativas, embora aparentemente
técnicas, possuem elevado valor económico, pois permitem uma aproximação
gradual com o Reino Unido, promovendo um intercâmbio económico e turístico sem
comprometer a reivindicação soberana, que permanece constitucionalmente
protegida.
Além do caso Malvinas, Milei
demonstrou capacidade de articulação em fóruns internacionais de alto nível. A
sua presença no Fórum Econômico Mundial em Davos, onde se reuniu com figuras
como David Cameron, revelou uma estratégia baseada em realismo diplomático, em
que a Argentina procura maximizar oportunidades de investimento, cooperação tecnológica
e integração nas cadeias de valor globais.
Lições para Portugal
O percurso econômico da
Argentina sob a presidência de Javier Milei demonstra, de forma inequívoca, que
reformas estruturais podem gerar resultados concretos, mesmo em contextos de
desequilíbrios históricos severos. Até março de 2025 o governo registou treze superavits fiscais
nominais mensais em catorze meses de mandato.
Ignorar o sucesso económico da
Argentina de Milei não é jornalismo, é militância ideológica. Portugal teria
muito a aprender com quem, contra todas as probabilidades, devolveu esperança a
um país condenado ao fracasso. Mas a cobertura mediática portuguesa prefere
noticiar escândalos como o colapso da criptomoeda $LIBRA, promovida por Javier
Milei.
O caso argentino oferece
lições valiosas a Portugal. A experiência de Milei demonstra que políticas
fiscais rigorosas e a racionalização do Estado podem gerar resultados
benéficos. O governo tem evidenciado uma notável resiliência institucional face
a um Congresso que, de forma reiterada, procura obstruir e inviabilizar as
reformas estruturais em curso.
O próprio Estado argentino foi
mobilizado para difundir uma visão económica alternativa, como demonstra o
canal público Paka Paka ao exibir a série animada Tuttle Twins, que
visa introduzir às crianças os princípios do livre mercado, e a promoção do uso
de criptoativos. Este contraste torna ainda mais gritante o silêncio que
reina no seio da média em Portugal.
Milei é elogiado por
instituições internacionais como o FMI, e foi inclusivamente distinguido como
Economista do Ano pela Ordem dos Economistas do Brasil. Quem, então, se arroga o
direito de lhe apontar o dedo?
A erosão democrática começa
quando órgãos de comunicação social, financiados com capitais públicos ano após
ano, passam a ocultar factos, a manipular narrativas e a divulgar apenas aquilo
que lhes convém. Numa democracia, a comunicação social deve pautar-se pela
imparcialidade e transparência, servindo a informação e não a desinformação.
Título e Texto: Gianluca Lubrano, Observador, 31-1-2025
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