Cesar Maia
1. É uma unanimidade entre os politólogos que a relação de
representação entre o eleitor e o parlamentar é muito baixa. Aí estão as
pesquisas de memória do voto que demonstram isso. E as pesquisas que mostram
que os eleitores não se sentem representados pelos deputados e senadores.
2. Dizem os deputados federais seniores que o Congresso não vota
contra a opinião pública. Bem, se é assim, sempre que a opinião pública se
cristaliza em ampla maioria em torno de uma decisão, a relação de
representatividade dos parlamentares é muito alta. Não importa qual a causa e
qual o efeito. Nesses casos ocorre uma alta correlação.
3. O processo de impeachment é uma clara demonstração disso. Quase
milimetricamente a proporção de votos de deputados e senadores a favor do impeachment
é igual à proporção dos eleitores que apoiam o impeachment de Dilma. Os números
da Câmara 71,5% igualam os das pesquisas pró-impeachment. A projeção dos votos
dos senadores pró-impeachment é a mesmíssima.
4. Nesse sentido em relação ao impeachment há uma lua de mel entre
representantes e representados – nessa ordem ou na ordem inversa – não importa.
As voláteis redes sociais que se mobilizaram pelo impeachment se sentem
representadas pelo voto dos parlamentares e o impedimento de Dilma.
5. Mas a partir do dia seguinte ao impeachment o quadro certamente
não será o mesmo. A começar do PT/PCdoB/CUT/MST. A sincronização entre todos
está na campanha “é golpe” em defesa do mandato de Dilma e, é claro, de seus
empregos e subsídios. Mas estão longe de ter unidade em relação ao dia
seguinte. Uns querem se afirmar nitidamente à esquerda, voltar às origens e
radicalizar o discurso, a postura de oposição e mobilizarem-se nesta direção.
6. Outros, convencidos pela prazerosa experiência que tiveram no
governo, acham que o melhor é apostar na alternância de poder contando com o
desgaste do governo – deste ou do próximo. Ou seja, realizar uma oposição
parlamentar firme numa linha de centro-esquerda-esquerda. Claro, são posturas
nítidas, que na prática se subdividem conforme o momento e o tema.
7. E as divisões pós-impeachment não serão menores – quem sabe bem
maiores – entre os que defenderam – eleitores – e parlamentares – e apoiaram e
votaram pelo impeachment. O governo Temer é naturalmente híbrido. O núcleo
governamental é liberal liderado pela equipe econômica. Questões como rigor
fiscal, (que atinge servidores e estados e municípios), como privatizações,
como rigor anti-inflacionário, tenderão a se desdobrar em matizes políticas, a
favor e contra.
8. Como O PSDB vai se posicionar se esse núcleo prevalecer e dar ao
governo uma marca de centro-direita? Provavelmente dependerá dos resultados:
quanto mais sucesso, mais adesão, e vice-versa. Como os pré-candidatos a
presidente 2018 vão reagir? E como toda uma maioria de deputados pragmáticos, se
comportará, especialmente quando 2018 chegar e sinalizar riscos para seus
mandatos? O “Centrão” – que sugere ter uma maioria na Câmara de Deputados – manterá
a unidade que tem hoje, e que aumenta o seu poder de barganha, ou frente a
frente a um governo definitivo e a naturais conflitos de expectativa, se
fragmentará? E como o Temer-definitivo vai administrar essa relação?
9. Ou seja, o processo de impeachment dá uma enorme unidade aos que
estão a favor de um lado e os que estão contra de outro lado. E depois? Haverá
tempo até 2018 para se consensuar que o governo Temer deu certo? E se esse
sucesso for parcial quais serão os desdobramentos políticos – e
político-sociais – e nas redes sociais? Esse sim é um
bom exercício de cenários para os cientistas sociais.
Título e Texto: Cesar Maia, 30-6-2016
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