Carlos Guimarães Pinto
Catarina Martins, com a
profunda perspicácia que a caracteriza, decidiu apelar a que no 10 de Junho os
discursos oficiais reconheçam “a enorme violência da expansão portuguesa, a
nossa história esclavagista, a responsabilidade no tráfico transatlântico de
escravos”. Obviamente, isso já foi reconhecido há muito tempo. Ainda
recentemente, Marcelo, numa visita oficial ao Senegal, fez isso mesmo.
Claro que o que Catarina
Martins quer não é apenas o reconhecimento que o estado português já fez por
diversas vezes e que se encontra nos livros de história nas escolas públicas. O
que Catarina quer é uma sinalização de virtude, apostada na culpa do homem
branco, para continuar a fazer passar a sua agenda política.
O importante é ter Catarina
como voz da consciência de uns portugueses em constante autoflagelação por os
seus antepassados terem feito o mesmo que todas as potências da altura (mesmo
as potências regionais na África e Ásia) faziam. Mas antes de começarmos a dar
vazão ao chicote, convém esclarecer algumas coisas:
1. São todos os portugueses culpados? Por exemplo, os portugueses
de raça negra também deverão pedir desculpa ou esses estão isentos?
2. Se os portugueses de raça negra estão isentos, os mulatos podem
pedir só meia desculpa ou como têm antepassados nos dois lados a coisa cancela?
3. Se a descendência é o critério, os portugueses cujos
antepassados não se envolveram no tráfico de escravos também têm que pedir
desculpas?
4. Na medida em que boa parte dos traficantes de escravos se
estabeleceram no Brasil, não deveria ser o presidente do Brasil a pedir
desculpas? Alguém exigiu isso ao Lula?
5. Se os portugueses devem herdar por inteiro a culpa de algo feito
pelos seus antepassados há doze gerações, não deveriam poder herdar por inteiro
aquilo que os seus pais acumularam durante a vida. Ou isto das heranças só
funciona com as culpas e o resto deve ser taxado?
Espero que a Catarina Martins
nos ilumine para que a tão desejada autoflagelação possa finalmente começar.
Título, Imagem e Texto: Carlos Guimarães Pinto, Blasfémias, 11-6-2018
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