Alberto Gonçalves
Já chega que os eleitores brasileiros,
americanos, ingleses, italianos ignorem os alertas da esquerda e façam o que
lhes apetece. Não há direito que um jornal, para cúmulo, português, repita a
afronta.
Portugal é um lugar governado
por um caldo de leninistas e oportunistas, onde a corrupção reina nas altas e
nas baixas esferas, a economia afunda às mãos de irresponsáveis, o fisco
saqueia o que pode e não deveria poder, a Justiça é distorcida por interesses
medonhos, a oposição exprime-se em alemão, a bola adormece as massas, os
“media” servem os senhores e o presidente foge de qualquer sílaba que
comprometa os índices de popularidade. É natural que a “inteligência” caseira,
provavelmente o eufemismo do milénio, se dedique em simultâneo a debater,
perdão, a bater no maior flagelo nacional: a “direita”.
Em oito dias, publicaram-se
cerca de 174 artigos de opinião acerca dessa calamidade. Só na imprensa. Sem
“cabo”, esforço-me, não muito, por imaginar as centenas de comentadores televisivos
que se dignaram ceder um pouco do seu tempo, por regra dedicado a criticar
árbitros ou exaltar ministros, em prol de tema tão sujo. Todos juntos,
concluíram que, dado que não se demarcou suficientemente do sr. Bolsonaro e
antes não se demarcara suficientemente do sr. Trump, a “direita” é radical,
fascista e predisposta ao ódio. E eles odeiam gente assim.
A bem da verdade, noto que a
“inteligência”, bonito sinónimo de “esquerda”, não condena a “direita” em peso.
A esquerda exclui da condenação diversas “direitas”, a saber: a “direita
moderada”, leia-se a direita que era “radical” quando ganhava eleições; a
“direita democrática”, leia-se a direita que cala e consente os desvarios da
esquerda; a “direita civilizada”, leia-se a direita desejosa de fazer com a
esquerda as pontes e os viadutos que a esquerda não faria com a direita nem
morta; e a “direita decente”, leia-se a direita de comunistas e socialistas
que, sem que alguém acredite, se dizem de direita para usufruir da legitimidade
de insultar diária e obsessivamente a direita. As referidas direitas são
toleráveis e susceptíveis de serem convidadas a assinar alguma petição contra a
direita que falta, a alt-right, a direita intolerável, neoliberal, misógina,
xenófoba e racista e, agora em coro, fascista: a “direita do Observador”.
Mal percebi que a aflição da
esquerda conscienciosa e humanista se resumia à tal “direita do Observador”, a
minha primeira reação foi de entusiasmo revolucionário: “É varrer essa
cambada!”. A minha segunda reação foi reparar que escrevo no Observador, logo
integro a cambada a varrer. Acho estranho enfiar numa carapuça ideológica as
dezenas de pessoas que trabalham ou publicam no Observador, cuja vasta maioria
nem conheço. Principalmente, estranho que me atribuam uma característica em que
nunca reparei. Não sou religioso. Não aprecio patriotismos ou nacionalismos.
Não prezo especialmente os “valores da família”. Não desejo conservar grande
coisa. Não me perturbam (nem me excitam) o aborto, o casamento gay ou a
despenalização das drogas. Valha-me Deus (força de expressão): nem sequer
suporto touradas. E – vejam lá – aceito com bonomia a existência do Estado, na
medida em que, na respectiva ausência, não haveria quem recolhesse o dinheiro
indispensável à existência do Estado e dos que vivem a roçar-se nele.
De direita, eu? Jamais me
ocorreu semelhante ideia. Sucede apenas que detesto a fúria coletivista, o
fervor dogmático, a aversão à liberdade, a propensão para a generosidade com os
bens alheios, a prepotência, a hipocrisia, a alucinação, a ignorância e a
infantilidade que definem sobretudo a esquerda. Daí a marchar nas fileiras da
direita vai um salto considerável, possível unicamente num país em que
bancários financiam a Festa do “Avante!” e simpatizantes de totalitarismos sobem
(?) ao Banco de Portugal, ao Conselho de Estado e, em suma, ao “centro”.
Mas isto sou eu a falar.
Naturalmente, a opinião que interessa é a da esquerda, e a esquerda entende que
o Observador é um “projeto” (sic) maligno, destinado a controlar a Terra ou, no
mínimo, a desobedecer às diretivas da esquerda.
É um ultraje excessivo. Já
chega que os eleitores brasileiros, americanos, ingleses, alemães, italianos e
etc. ignorem os alertas da nossa esquerda e continuem a fazer o que lhes
apetece.
Não há direito que um jornal,
para cúmulo, português, repita a afronta. Aliás, “jornal”, vírgula. Com típico
pluralismo, alguma esquerda exige em público que se retire ao Observador o
estatuto de “órgão de comunicação social”. Com típica bondade, a esquerda que
sobra exige em privado a reeducação dos colaboradores em campos apropriados de
modo a que, um dia, o Observador alcance a isenção de um “Público”, de um
“Expresso” ou de cinco “DN” (paz à sua alma).
Não partilho a esperança ou o
altruísmo. Por um lado, sinto-me traído, visto que o Observador me convidou sem
me prevenir para os tenebrosos planos de infiltração ideológica. Por outro,
penso sinceramente que as panaceias são escusadas. É preciso agir com firmeza,
acender os archotes (simbólicos) e partir para as perseguições, os saneamentos,
as mocadas na cabeça (literais). Como na saudosa época do “macarthismo”, ou do
“gonçalvismo” para evitar importações, vamos começar a nomear nomes. Segue em
anexo, junto com a confissão de arrependimento, o meu. Os restantes estão na
ficha técnica.
Título e Texto: Alberto Gonçalves, Observador,
10-11-2018
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