quinta-feira, 22 de novembro de 2018

[Daqui e Dali] A origem do bolo-rei

Humberto Pinho da Silva

Tinha chegado a São Paulo em véspera de Natal. A tia Helena, convidara-me para passar a consoada, com ela e com a família. Cheguei a Alto de Pinheiros, moído por longa e maçadora viagem, às primeiras horas do dia 24. Era uma manhã inundada de Sol doirado e ameno. A pauliceia acabara de acordar. Levava, entre as prendas natalícias, majestoso Bolo-Rei.


Eu sabia que o avô Alberto, que abalara para o Brasil, em meados do século passado, havia de gostar de ver, na mesa, o tradicional bolo português.

Ao lado do panetone, que já se encontrava sobre a toalha adamascada, que cobria a mesa, coloquei o Bolo-Rei, repleto de apetitosas frutas cristalizadas.

Impaciente, aguardei a chegada do avô; e foi com entusiástica expectativa, que esperei a reação. Entrou ligeiramente curvado, na sala medianamente iluminada. O sol matinal, velado pela espessa cortina de algodão que cobria a janela, que dava para o jardim, mal conseguia penetrar. Ao ver o Bolo-Rei, perguntou-me atónito:
“Foi você que o trouxe?!”
Respondi-lhe que sim. Queria fazer-lhe uma surpresa…

Em breve, soube, que nunca vira tal bolo na casa de sua mãe, em Vila Nova de Gaia. Admirei-me. Desde que me conheço, sempre meus pais adquiriram-no, dizendo-me ser bolo tradicional.

Mais tarde, para satisfazer a curiosidade, investiguei a origem do “nosso” bolo-rei, e perante minha desilusão, averiguei o seguinte:

O proprietário da Confeitaria Nacional, de Lisboa, após viagem a França, nos últimos anos do século XIX, conheceu, em Paris, bolo de vistoso aspecto, confeccionado na Festa dos Reis. Trouxe a receita. Seguindo a tradição francesa. Confeccionou-o na véspera do Dia dos Reis, para ser comido ainda quente.

O saboroso bolo rapidamente foi adquirido pelos lisboetas, e chegou a ser quase imprescindível na mesa dos portugueses.

Entretanto, foi implantada a República. O nome de “Rei” não foi aceite pelos republicanos…

Os pasteleiros não tiveram outro remédio, senão mudar-lhe o nome. Passou a ser: “Bolo de Natal” ou “Bolo do Ano Novo”.

Com o correr dos anos, os ânimos acalmaram-se e tornou ao seu primitivo nome.

O primeiro Bolo-rei apareceu em França, confeccionado pelos cozinheiros do Rei Luís XVI, durante o almoço do Dia dos Reis.

Dizem que ao apresentá-lo, na corte, pretendiam lembrar as ofertas dos Reis Magos, ao Menino Jesus: ouro, era a côdea brilhante; a mirra, os frutos; e o incenso, o aprazível perfume que irradiava.

Precisei que o avô Alberto ficasse espantado ao vê-lo, para vir a saber que o tradicional bolo natalício, de português, só tem o nome… traduzido.
Título e Texto: Humberto Pinho da Silva, novembro de 2018

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