Se amizade prejudica, como é que alguns
ministros do STF foram indicados para a Corte?
Alexandre Garcia
Hoje é feriado de 1º de maio,
mas, como está tudo parado, é uma ironia dizer que hoje é feriado. Nos tempos
do ditador Getúlio Vargas, em que havia o círculo operário e ele fazia grandes
discursos no estádio de São Januário, que era o maior estádio do Rio de Janeiro
na época, poderíamos falar de feriado.
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Foto: Arquivo Nacional - via
LEHMT/UFRJ |
O que mantinha Getúlio no
poder era esse movimento trabalhista. Quando acabou a guerra, os militares o
depuseram e ele voltou ao cargo pelo voto, em 1950. E acabou se suicidando em
agosto de 1954.
O suicídio teve a ver com
estripulias dos seguranças de Getúlio. Naquele tempo seguranças eram pessoas da
confiança do presidente, não tinha nada a ver com as Forças Armadas e as
polícias como é hoje.
O trabalho livre liberta
O dia do trabalho existe
porque no dia 1 de maio de 1886 houve uma greve que foi combatida com tiros, em
Chicago, e assim se decidiu comemorar o dia. É uma homenagem a quem trabalha.
Eu comentei, nesta semana,
sobre a libertação dos campos de prisioneiros na Alemanha. Nos portões estava
escrito “o trabalho liberta”. Mas o trabalho que liberta é o trabalho livre e
hoje no Brasil a gente vê tanta gente precisando e querendo trabalhar sem
poder.
Os que hoje eu chamo de
“invisíveis” são mais de 50 milhões de brasileiros que trabalham de manhã para
garantir o almoço e o jantar de seus filhos.
Só não pode o amigo de
Bolsonaro?
O presidente Bolsonaro repetiu
que não engole a decisão do ministro do STF, Alexandre de Moraes, de impedir a
nomeação de Alexandre Ramagem de se tornar o novo diretor-geral da Polícia
Federal por meio de uma liminar. O pedido foi do PDT.
O ministro alega que é preciso
ter impessoalidade na indicação e o delegado é amigo de Bolsonaro e seus
filhos. O delegado e o presidente nem se conheciam até o dia em que Bolsonaro
foi eleito.
Ramagem havia sido designado
para fazer a segurança de Bolsonaro depois que o então candidato levou uma
facada. A indicação foi pelo trabalho brilhante que ele tem na Polícia Federal.
Alexandre Ramagem começou a acompanhar
o presidente 24 horas por dia. Bolsonaro disse que só não dormia com ele, mas o
dois tomavam café juntos e foi assim que surgiu uma amizade.
Se amizade prejudica, como é que Alexandre de Moraes foi
indicado pelo ex-presidente Michel Temer para o Supremo Tribunal Federal se
os dois são amigos? Ou Gilmar Mendes foi indicado por FHC se os dois
trabalhavam juntos no Palácio do Planalto?
Ou então Dias Toffoli, sendo amigo de Lula, foi indicado pelo
ex-presidente se ele era advogado do PT? Ou o primo de Collor de Mello,
Marco Aurélio, foi indicado para o Supremo?
É muito mais aceitável, no
mesmo poder, alguém indicar um servidor de carreira para fazer o seu trabalho
do que indicar um companheiro para ser ministro do Supremo Tribunal Federal,
que é de outro poder.
O art. 2° da Constituição
determina que existam três poderes independentes e harmônicos. Mesmo assim a
gente vê um juiz substituto do Ceará impedir que Bolsonaro nomeie um presidente
para a Fundação Palmares – decisão que foi derrubada.
Se o presidente nomear um
ministro cachaceiro e vigarista, ainda assim não se pode impedir. Mas, se
esse indicado aparecer bêbado no ministério e continuar fazendo vigarice,
pode-se entrar com um pedido de responsabilidade.
Mas foi o presidente que
nomeou e deu um voto de confiança para esse sujeito que não devia. Se fosse
isso, o presidente precisaria demiti-lo imediatamente ou se tornaria
responsável pelos atos desse ministro. É assim que funciona a separação de
poderes.
Bolsonaro vai insistir nessa
história porque ele acha que é uma injustiça. O pior é que com esse ato o
ministro Alexandre de Moraes pressupõe que há uma associação com intuito de
delinquir entre o presidente e Ramagem.
Parece que o ministro tem uma
bola de cristal, a qual mostra para ele que Bolsonaro vai cometer um crime, o
que é muito grave. É hora de a gente pensar nesses acontecimentos do
Brasil."
Título e Texto: Alexandre
Garcia, Gazeta do Povo, 1-5-2020
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