A festa dos impunes, a censura ao riso e o
fim dos hospitais de custódia estão entre os destaques desta edição
Branca Nunes
A sobriedade da camisa preta
de um contrasta com o paetê prateado da blusa do outro. E as hastes quase
invisíveis dos óculos colidem com o grosso traço avermelhado acima dos olhos do
parceiro. O septuagenário à esquerda exibe um sorriso malandro e tem os ralos
fios de cabelo caprichosamente penteados para trás. A gargantilha de couro
acentua o ar sadomasoquista do sexagenário à direita, com longos cabelos
grisalhos, desgrenhados como a barba. Abraçados, eles posam para a câmera
fazendo um “L” com o indicador e o polegar.
“A imagem do escárnio”, na
definição de Rodrigo Constantino, mostra o “consultor” José Dirceu
e o advogado criminalista “Kakay”, um dos mais agressivos inimigos da Operação
Lava Jato, comemorando em Paris a cassação do mandato do deputado federal
Deltan Dallagnol. “A cena é o retrato fiel da política brasileira de hoje”,
resume Silvio Navarro, na reportagem de capa desta edição. As
imagens lembram as celebrações ocorridas na capital francesa da Turma do
Guardanapo, formada pelo então governador Sérgio Cabral e empresários
envolvidos num cortejo de negociatas com o dinheiro dos pagadores de
impostos.
A foto que viralizou nesta semana “ilustra com perfeição a total inversão de valores em nosso país hoje”, afirma Constantino. “Os bandidos e defensores de bandidos estão à vontade, contentes, rindo de orelha a orelha e consumindo rios de dinheiro. Eles acham graça de quem tenta levar o Brasil a sério.”
Enquanto isso, quem deveria
fazer rir é ameaçado pelos que deveriam aplicar a Lei a criminosos de verdade.
Há alguns meses, o humorista Léo Lins foi proibido de contar piadas “com
conteúdo depreciativo ou humilhante em razão de raça, cor, etnia, religião,
cultura, origem, procedência nacional ou regional, orientação sexual ou de
gênero, condição de pessoa com deficiência ou idosa, crianças, adolescentes,
mulheres, ou qualquer categoria considerada como minoria ou vulnerável”.
A reportagem de Anderson
Scardoelli e Evellyn Lima demonstra que a decisão da
juíza Gina Fonseca Correa transformou-a em protagonista da ressurreição da
censura prévia no Brasil. Chico Anysio, Jô Soares, Ronald Golias e outros
comediantes geniais teriam sido condenados à morte na fogueira se vivessem
neste triste século 21.
A mesma Justiça que acha o
riso perigoso determinou a soltura, até maio de 2024, de centenas de
assassinos, estupradores e pedófilos mantidos longe da sociedade graças aos 28
hospitais de custódia existentes no país. A reportagem de Joice
Maffezzolli descreve o drama dos familiares de doentes mentais
criminosos ameaçados pela decisão do Conselho Nacional de Justiça. A libertação
de gente que, sem o tratamento adequado, voltará a cometer os mesmos delitos
amplia a inversão de valores que assusta o Brasil.
Boa leitura.
Branca Nunes, Diretora de Redação, 9-6-2023
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