Humberto Pinho da Silva
Quando faleceu meu pai, Santos Lessa escreveu, no
“Comércio de Leixões", de que era diretor: "Pinho da Silva há
muito que estava doente, praticamente imobilizado, devido a erro médico. Na sua
última missiva dizia-nos, talvez prevendo o desenlace para breve (que se
verificou): ‘Estou cada vez mais doente da intoxicação que o médico me
arranjou, estou quase safo, mas o coração?! Nem posso subir uma escada!
Valha-me Deus!’ 13-11-1987.
Não foi erro médico, como disse o jornalista, mas
descuido. Eu explico:
Certo dia foi consultar o clínico. Este
aconselhou-o a tomar determinado medicamento que, em seu entender, era indicado
para a idade. Meu pai era avesso a remédios. Não o queria tomar, mas
convenceram-no.
Decorrido semanas entumeceram-se as pernas. Leu a
"literatura", nas contraindicações, dizia: “raramente afeta os rins.” (1
a 2 por 1000)
Avisou o médico, mostrou-lhe as pernas
engrossadas; respondeu-lhe: "Não é nada grave".
Semanas depois, as pernas ficaram lustrosas e
húmidas. O médico disse-lhe: "Não se preocupe, continue a tomar o
medicamento."!
Receoso, consultou o urologista. Ao vê-lo,
afirmou: "O senhor tem grave intoxicação medicamentosa. Recolha já ao
hospital".
Outrora os médicos também erravam, mas alguns levavam a profissão como sacerdócio.
Ferreira Leite – Que após extenuante dia de trabalho, no
hospital, chegava a casa com vontade de desligar o telefone, mas a consciência
não lho permitia. Altas horas "tilintava", para acudir urgentemente a
doente.
Pedrosa Júnior – Tinha lugar cativo no cinema próximo da
residência (nesse tempo não havia telemóvel) para estar sempre disponível.
Salvador Ribeiro – Verificando que o enfermo não tinha posses para
adquirir o medicamento, deixava, muitas vezes, sob a receita, a quantia
necessária.
Rocha Paris – Que saía de casa para prestar assistência gratuita
a miseráveis, que viviam na escarpa da Serra do Pilar.
Conversando com jovem médico sobre o assunto,
respondeu-me: "Já não há necessidades de sacrifícios: há hospitais e
clínicas..."
Agora entra-se na Faculdade para ganhar dinheiro.
Não há, na maioria, vocação. O que se pretende é curso com saída e bem
remunerado.
Ainda há, felizmente, quem não pense assim.
E então: "Fica – como disse Frei Luís
de Sousa – mau letrado o que fora bom sapateiro e não é bom soldado o que
fora bom religioso.", in "Vida do Arcebispo".
Título e Texto: Humberto Pinho da Silva,
outubro de 2023
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