Humberto Pinho da Silva
Machado de Assis, num dos seus encantadores
romances, narra a curiosa história do Sr. Custódio, deveras preocupado com a
mudança do regime, no Brasil – Monarquia para República. O Sr. Custódio mandou
pintar no estabelecimento o nome da pastelaria:
CONFEITARIA
IMPÉRIO
Com a mudança do regime político, em 1889, ficou
preocupadíssimo. Seria afronta à República?! Para solucionar o intricado
problema, pediu parecer a amigo, que lhe sugeriu:
CONFEITARIA
DA REPÚBLICA
Mas o Sr. Custódio não ficou sossegado. Se a
monarquia voltasse?
O Imperador era figura grata do povo; Deodato,
respeitava Dom Pedro II; o General Hermes da Fonseca, irmão de Deodato, era
leal ao Imperador; melhor era repintar o letreiro assim:
CONFEITARIA
DO CUSTÓDIO
Nessa época começou no Brasil o "baile das
casacas": escritores, militares, jornalistas e artistas, não perderam
tempo, louvando "convictos" a República, na ânsia de benesses.
As placas das ruas andaram em roda-viva: a Praça
Dom Pedro II, passou a Marechal Deodato; o Largo da Imperatriz, a Quintino
Bocaiúva; a Rua da Princesa, Rui Barbosa.
O que aconteceu no Brasil, acontece em quase todo o mundo, em nome da liberdade e da democracia...
Também em Portugal houve caso semelhante ao do Sr.
Custódio, só que foi verídico, e não fictício, como o de Machado de Assis.
O proprietário da Confeitaria Nacional, no
final do século XIX, foi à França e conheceu o bolo confecionado na "Festa
dos Reis".
Trouxe-o para o seu país e deu-lhe o nome de
"Bolo-Rei". Logo, os lisboetas o adotaram nas festas
natalícias.
Entretanto, mudou o regime e os republicanos não
gostaram do nome “Rei".
Mudou-se para "Bolo de Natal" ou "
Bolo de Ano Novo".
No correr do tempo, acalmados os ânimos, voltou a
ser "Bolo-Rei".
Como no Brasil, igualmente, as placas das praças e
ruas foram substituídas, na 1ª, 2ª e 3ª República.
A Ponte Salazar passou a ser "25 de
Abril". Hoje, o povo batizou-a de “Ponte Sobre o Tejo".
O estadista já o previa, quando disse que o nome
devia ser aparafusado para não terem trabalho de o arrancarem (Pedro Mexia -
Revista Expresso, 10/9/2016).
No Porto, a Rua 31 de Janeiro (coitadinha!) [foto] desde que me conheço, uma vez é de Santo António, outra vez de 31, consoante o regime que se instala em Lisboa.
Tudo se fez e se faz em nome da liberdade... e da
democracia.
Título e Texto: Humberto Pinho da Silva, outubro
de 2023
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