quinta-feira, 26 de outubro de 2023

[Daqui e Dali] Como interpretar factos históricos

Humberto Pinho da Silva

Conversando com professora do 1º Ciclo, esta narrou-me curioso episódio, ocorrido na sala de aula:

Corriam os primórdios dos anos oitenta. Os símbolos nacionais haviam caído no esquecimento - bandeira e hino.

Fora educada em colégio que exaltava o amor à Pátria e respeitava, diria melhor, venerava os símbolos que a representam e a enaltecem.

Ardendo de amor patriótico, assentou levar para a escola bandeirinha e letra do hino oficial da nação.

Após colocar a bandeira na secretária, começou a ler-lhes trecho patriótico, acessível à idade dos ouvintes, para lhes avivar o amor à Pátria.

Silêncio augusto. A acriançada entusiasmada, arregalava os olhos de curiosidade. Ninguém bulia. Terminada a fascinante leitura, a professora mostra a bandeira e pergunta-lhes:

- Quem conhece esta bandeirinha?

Menino expedito, de imediato ergue-se, estica o braço, e de indicador apontado para o céu branco de estuque, responde com sorrisinho maroto:

- É a bandeira da seleção!...

Não se enganara, mas desconhecia que era a bandeira do seu país!

O desconhecimento era devido à mass-media ter evitado, durante anos, invocar símbolos e factos patrióticos que, na época, eram, em geral, mal interpretados.

Havia, até, quem fosse de parecer, recontar a nossa História. Julgava-se ser necessário expurgá-la, e ensiná-la de harmonia com as ideologias em voga.

As atitudes dos homens do passado, modo de sentir e agir, devem ser sempre enquadrados na época em que acorreram.

Meu pai, quando frequentava a escola, o ensino era feito de palmatória. Chegava a casa com as mãos num cepo. Os familiares riam-se e diziam: "Estuda que ninguém te bate!"

Trindade Coelho, na autobiografia, assevera que lhe batiam nos nós dos dedos com régua-régua em esquina, e o pai concordava com a barbaridade!...

No meu tempo do bê-á-bá, apesar de ser proibido, ainda se ensinava a tabuada à palmatoada!

Num importante colégio, alunos que não soubessem a gramática, na ponta da língua, ficavam de joelhos, sobre as carteiras... e estávamos já nos anos cinquenta!

Eram os professores e os pais sádicos? De modo nenhum. O castigo físico era considerado a melhor pedagogia.

É, portanto, absurdo criticar figuras que viveram em séculos passados, pela forma como pensavam e agiam.

Os acontecimentos históricos devem ser analisados, consoante a mentalidade corrente no tempo em que ocorreram, e não à luz dos tempos atuais, se quisermos ser honestos, caso contrário será pura ignorância.

Título e Texto: Humberto Pinho da Silva, outubro de 2023

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