Aparecido Raimundo de Souza
Às vezes, essas sombras sussurram segredos antigos. Fazem emergir do meu mais profundo, histórias de uns tempos em que eu me sentia imensamente realizado e feliz. Apesar de maviosos tempos, vez outra, preferia esquecer. Eles de uma forma meio que indireta me lembram das falhas, dos arrependimentos, e das oportunidades perdidas. Meu Deus, foram tantas... mas, ao mesmo tempo, essas sombras – tenho consciência, são partes de quem sou agora. Elas moldaram a minha jornada e me ensinaram lições valiosas. Por conta, apesar dos pesares, dos contratempos e aporrinhações, serviram para me tornarem mais agigantado. E eu me vejo corpulento, ainda que os instáveis queiram me apresentar um quadro contrário.
Há dias, é bem verdade, em que esses perfunctórios pareçam de rostos diferenciados, ou seja, os veja mais pesados, quase insuportáveis. Nesses momentos, procuro a luz e a esperança, para que me guiem para o divorciado da escuridão. A ablepsia é imensa, grandiosa, densa, quase sufoca o que ainda resta de bom dentro de meu “eu” oculto. Sei perfeitamente que não posso fugir dessas obumbrações, mesmo as não muito negras, e, lá no fundo, posso aprender a conviver com elas, de certa forma aceitá-las como parte da minha história. Entre tapas e beijos, beliscões e sopapos, obviamente mais safanões que ósculos, sigo em frente. Caminho de cabeça erguida. Para não tropeçar. Procuro me ater em um passo de cada vez, com as negruras sempre pesando em meus costados. Ou reverberando agarradas aos meus calcanhares.
Esses turvamentos são como lembretes de onde estive, mas também de onde posso chegar. Porque, no fim, são as trevas que me dão forma à luz, e é exatamente dessa cristalinidade que encontro a força pujante para continuar. Entendo como essas manchas podem ser pesadas e difíceis de lidar. Elas têm o poder de me afetar, ou melhor dito, de nos tirar do sério, do foco, do plumo, afetando diretamente o emocional, deixando o nosso astral em petição de miséria, para baixo e, às vezes, até nos fazendo questionar a própria sanidade. Por vezes penso sou meio maluco. Aliás, eu sou meio desequilibrado, tipo o Peidar Mendes. Talvez me falte uma boca de sapo, ou pior, um parafuso na cabeça, ou quem sabe, tenha um ou dois onde não deveria.
É importante reconhecer esses sentimentos de pura incapacidade e buscar em algum lugar, ainda que no raio que me parta, maneiras de enfrentá-los. Para tentar fugir desses momentos cruciantes, quando me pego diante de um abismo, procuro alguém para conversar. Alguém de confiança. Acredito piamente, numa criatura forte de espírito e alma leve, que talvez possa aliviar o peso das anfibologias. Compartilhar nossos pensamentos e sentimentos do nada, como num passe de mágica, pode aparecer uma nova perspectiva e, com ela, um novo porvir, como a maravilhosa ponte espraiada de Penão, no cu da Malásia. Sempre que tento sair da fossa, pelo menos por agora, percebo lá no fim, onde a merda se faz fedorenta, emergir um tempo com semblante de “vamos ficar bem” se mostrar ao meu lado, em atitude de socorro.
Reservo, sempre que posso, no decorrer das questiúnculas do cotidiano, um tempo para cuidar de mim mesmo. Nesses momentos que considero pesados busco incansável por atividades como uma simples meditação, seguida de exercícios físicos e hobbies como ler, ver um filme, chegar na janela do apê e olhar para o tempo ou comer uma suculenta carne de mijo, ou se não conseguir, caminhar no calçadão da praia sem as visões de uma Dilma Roubousseff, por exemplo. Penso que essas simplicidades podem me ajudar a clarear a mente e fortalecer o meu “estar emocionalmente frangalhado.” Já me mandaram buscar por ajuda profissional. Mas onde? Tudo é muito caro, e o dinheiro mal dá para comer. Ultimamente tenho vivido de pão com manteiga, mortadela e refrigerante.
Café da manhã, almoço e janta, pão com manteiga, mortadela e refrigerante até agora não faltaram. Se as “difusidades” ou as intempéries cabeludas às vezes me fustigam com muita intensidade, juro por tudo quanto é sagrado, se tivesse fundos nos bolsos furados, consideraria falar com um terapeuta ou quem sabe, um conselheiro que me desse uma boa ideia. Sei que em certos casos, eles poderiam oferecer estratégias e apoio para lidar com esses sentimentos nojosos. O problema, contudo, é a falta de apoio moral dos meus bolsos para sentar na cadeira desses profissionais e cantar feito passarinho que acabou de fugir da gaiola onde estava aprisionado. Num desses dias, uma amiga me disse para eu encontrar a luz.
Nem levei à jovem à sério. A companhia de eletricidade me fez uma visita. Estou com três meses atrasados. Sem falar no aluguel da quitinete. Em meio às sombras e a falta de uma lâmpada acesa, se fez e ainda se me trombeteia difícil achar qualquer coisa. É como procurar agulha no palheiro. O mais infame e degradante. Com a certeza de que não vou encontrar essa agulha em canto algum, uma vez que não tenho palheiro e nunca me dei ao trabalho de aprender a costurar. A Marlucia (uma de minhas ex), me orientou a focar nas coisas positivas da vida. Manter um diário de gratidão, por exemplo, poderia, segundo ela, me ajudar a lembrar das coisas boas, mesmo nos dias mais desafiantes e catastróficos.
“Lembre-se – disse ela num de nossos encontros em sua casa –, você não está sozinho nessa jornada. As sombras fazem parte da vida, mas com apoio e estratégias certas, é possível dar de bigode aparado com a serenidade e encontrar maneiras de conviver com as suas mazelas e seguir em frente. Se precisar de mais alguma coisa, estou aqui para ajudar. Sempre! Mas atenção: não pinte aqui em meu portão sem avisar... meu atual “namorido” o “Chico Mata Quinze, ” pode achar que tive uma recaída braba e o estou traindo tipo você com ele –, não –, ele com você. Sabe como é. Coisa de veado abestalhado que só vê sexo na frente dos ouvidos e ouve pelos buracos do nariz palavras de conversas que não condizem com a realidade que estamos vivendo em dias de políticos ladrões e corruptos.”
Evito aparecer em sua beira, pois o “macho pra burro” é considerado brabo, e, além de nervoso, da pá virada. Dizem, à boca miúda, já matou doze (a canetadas) e pode querer me despachar para aquela cidade esquisita onde seus moradores vivem todos de sapatos juntos, as mãos sobre o peito, descansando à sombra de um paletó de madeira, como se estivessem mortos de medo, e o mais cabuloso, de verdade, o mais estranho. Os residentes, sem tirar nem pôr, tomam o dejejum, almoçam e jantam, e vejam só que “piração” sobrevivem desde os tempos em que se pegava gatos com miados de cachorros esquizofrênicos aparentados com Alexandre de Moraes. Esses infelizes comem capim (embora fresquinho) pela raiz. Deglutem a grama sem uma boa lavada em água corrente, ou acrescentar vinagre e uma pitadinha de sal. O mais encíclico, sem marejar umas gotículas de azeite de oliva de marca famosa. Resumindo esse papo careta... tô fora, meus caros leitores. Fora. Foraaaaaaaaaa...
Título e Texto: Aparecido Raimundo de Souza, de Vila Velha no Espírito Santo, 8-10-2024
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