Valdemar Habitzreuter
Perguntaram a Einstein se
acreditava em Deus e sua resposta foi: acredito no Deus de Spinoza... Para o
filósofo Spinoza, Deus é a Natureza (Deus sive Natura), a única Substância
existente, o Uno vertendo-se para fora (daí universo), a Realidade Absoluta de
infinitos modos de existir e de infinitos atributos (senão não seria Absoluto),
dos quais, dois nós conhecemos: a extensão e o pensamento, que também são
prerrogativas nossas, como modos que somos desses dois atributos; portanto,
somos um corpo pensante. Nós e as coisas não somos substâncias, mas modos dessa
Substância única.
Querer saber o que é Deus,
portanto, é só olhar, conhecer e amar a Natureza na qual nos movemos e vivemos
como expressões ou modos de Deus ser. Dessa perspectiva espinosiana, o ser humano,
inserido na Natureza como ser pensante, é propenso a paixões e emoções pelas
afecções que sofre do exterior. Portanto, nada mais natural ter toda sorte de
sentimentos ou emoções, tanto positivos como negativos (amor, alegria,
tristeza, depressão, compaixão, raiva, ódio, vingança, inveja, etc.). Essas
emoções fazem parte de nossa natureza. Em vão, pois, a tentativa de
erradicá-las. A alternativa é saber conviver com elas e estar no controle
delas.
O que se esconde por detrás de
nossas emoções e paixões é o desejo - apetite conscientizado - de obter algo
pelo qual ansiamos. O que se segue ou é alegria ou tristeza. Nem sempre aquilo
que desejamos nos traz alegria, pode ser o contrário, nos traz tristeza. Assim,
o desejo, a alegria e a tristeza são as emoções basilares das quais todas as
outras derivam. Da alegria provém o amor e seus congêneres, da tristeza, o ódio
e sua parentela; pois, quando conquistamos o objeto desejado e nos dá alegria,
amamos esse objeto, quando, ao contrário, nos traz tristeza, passamos a
odiá-lo.
O desejo, por assim dizer, é a
essência do ser humano; é o que desperta aquela força (conatus) que nos faz
lutar pela autopreservação. Mas, quando o desejo nos proporciona afetos de
tristeza a força perde sua potência e podemos ser dominados por emoções
negativas (depressão, raiva, inveja, ódio, etc.). É a razão, portanto, que deve
entrar em cena e se aliar ao desejo para que este seja orientado e conquiste
afetos de alegria e, assim, aumente sua potência de luta. O desejo, assim,
transforma-se em razão para estar no controle no que as afecções podem nos
proporcionar, se afetos de alegria ou de tristeza.
A razão, quando tem iniciativa
própria de a partir do interior dela criar desejos, abre caminho para o
conhecimento adequado de alcançar a alegria, embora não tenha poder absoluto
frente às afecções negativas que vem de encontro e querem se impor. Mas podemos
avançar em conhecimento de como chegar à alegria se deixarmos a razão tomar as
rédeas para equilibrar o que nos afeta de positivo e negativo até alcançar o
conhecimento por excelência que nos leva a nos inserir na totalidade da
felicidade.
Spinoza nos apresenta três
graus de conhecimento na senda da felicidade: primeiro, temos um conhecimento
subjetivo das coisas, um conhecimento calcado em opiniões, sem consistência,
não dá conta de nos fazer feliz, geralmente somos joguetes das paixões;
segundo, temos um conhecimento racional que nos dá ideias claras das coisas e
do que somos, é um conhecimento que se apoia na lógica matemática, e através
dele temos condições de como agir adequadamente para tornar-nos felizes;
terceiro, além do conhecimento racional que nos dá o sentido da vivência ética,
temos o conhecimento intuitivo que nos mergulha definitivamente na
Natureza/Deus. Neste estágio conquistamos, pois, o ‘amor intellectualis Dei’, o
conhecimento absoluto que nos garante a felicidade completa, nada mais nos
perturbando. Mas poucos o conseguem, nos avisa Spinoza, é preciso de muito
esforço...
Pois então, não é fácil estar
no controle de nossas paixões e emoções, mas se soubermos nos deixar guiar pela
razão no que concerne ao segundo estágio de conhecimento – ideias claras e
evidentes das causas do que nos afeta -, já é um grande avanço para estar no
controle de nossas paixões e emoções...
Título e Texto: Valdemar Habitzreuter, 4-1-2017
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O Deus de Spinoza,é o Deus que sempre persegui. Estou com ele a todo o momento e em tudo o que faço
ResponderExcluirRejeito catedrais como seus templos
Eu sou o seu templo
Parabéns por ter escolhido este tema para iniciar a sua coluna.
José Manuel
AOS "CRENTELHOS"(neologismo meu),
ResponderExcluirJá escrevi aqui no "saite"(neologismo já existente).
Devolvamos o deus de hoje à MITOLOGIA.
DESENVOLVAMOS, UMA TESE DIFERENTE DE SPINOZA, podem até chamá-la de TESE do Rochinha.
Sejamos nós nossos próprios deuses, esqueçam a morte, e valorizam a vida.
Nascemos para pecar ou errar, e aprender com pecados e acertos.
Respeitemos a moral conveniente e a ética concernente.
Vivamos para o outro sem desistir de nós mesmos.
Spinoza, Nietzsche e tantos outros apenas filosofaram em cima dos textos de Epicuro 1000 e tantos anos depois.
Fui pela direita...