domingo, 7 de junho de 2020

Um país às avessas e na linha

Não, não é um vírus. É um processo de discriminação em curso. Não, não é antirracismo. É manipulação. Não, não é austeridade. É pobreza seletiva. Não, não é uma bazuca. É o tacho do costume.


Helena Matos

Tudo é definido pelo seu contrário.

Não, não é antirracismo. É a manipulação do costume. E o paternalismo de sempre. 
Um cidadão de São Tomé foi assassinado no Seixal, o seu pai ficou gravemente ferido. Amigos, vizinhos e familiares das vítimas fizeram uma manifestação no bairro da Cucena onde vivem os agressores que são apresentados como ciganos. Pediam justiça e falavam de racismo. Reportagens sobre a manifestação no bairro da Cucena? Ora, ora, manifestações contra o racismo só podem ser as corretas, aquelas que a esquerda-ativista autoriza, patrocina e organiza.

Um ucraniano morre em Lisboa segundo tudo indica em consequência de violência policial. Manifestações? Indignações?… Ainda se o governo fosse outro. Agora com um executivo tão progressista é tão mais fácil gritar contra o Trump!

O combate ao racismo justifica tudo e o seu contrário neste momento. Querem fazer uma tese que ninguém critica? Falem de racismo. Fazer um anúncio fofinho? Falem de racismo. Um argumento para um filme?… Desde claro que seja o racismo de que se pode falar: o exercido pelos brancos sobre os negros.

Provavelmente veremos aparecer nas próximas legislativas um movimento – liderado por Joacine Katar Moreira? – que vai fazer da cor da pele o seu programa político. Sobretudo veremos o epíteto racista ser usado para neutralizar qualquer um que tenha um pensamento discordante ou que questione o ativismo dito antirracista. Um ativismo que acentua a vitimização e não a autonomia e que promove o ressentimento em vez do conhecimento. E sobretudo um ativismo que não quer cidadãos, mas sim comunidades das quais eles, os ativistas, são os mediadores com o mundo.

Não, não é um processo exemplar. É um processo que correu mal. 
A técnica é simples: à primeira evidência de falhanço grita-se milagre. Ao primeiro sinal de que vem aí um problema garante-se que foi feito tudo o que se podia fazer. Perante o descalabro garante-se que foi um processo exemplar. Os ventiladores que estavam sempre a chegar e afinal ainda não chegaram não são nesta lógica um procedimento que correu mal, mas sim “um processo exemplar”

A 23 de março, o Governo comprou à China 500 ventiladores. Custaram 9,3 milhões de euros. António Costa anunciou que 500 ventiladores chegariam da China até 14 de abril. A 17 de abril, só tinham chegado 65 ventiladores. Como se perceberá posteriormente, neste caso receber não é sinónimo de chegar.

Os jornais fazem títulos com “Portugal recebe”, mas uma coisa é recebê-los na China outra bem diversa é fazê-los chegar a Portugal.

A 7 de maio, já íamos em 1151 ventiladores comprados à China, mas dos tais ventiladores que estavam sempre a chegar, a ser entregues e a ser recebidos, tinham chegado 73.

A 3 de junho, o Correio da Manhã diz que dos ventiladores comprados à China, 887 estão por chegar e a 6 de Junho anuncia-se que os ventiladores chegarão a 8 de Junho.

O embaixador de Portugal em Pequim diz então que o processo foi exemplar. Certamente um exemplo do que não devia ter acontecido.

Não, não é uma bazuca. É o tacho do costume para os rapazes do costume. 
O imaginário pátrio em relação aos fundos europeus oscila entre as almofadas e as bazucas. Agora estamos na fase da bazuca. Ou seja, um dinheiro que vem não se sabe de onde vai ser distribuído em rajada pelas clientelas do regime, em adjudicações agora até devidamente isentadas do visto do Tribunal de Contas.

Os apoios anunciados por Bruxelas irão permitir ao PS continuar a protelar as reformas necessárias enquanto promove os mecanismos para se perpetuar no poder, como é o caso da regionalização que voltou à agenda mal se percebeu que ia haver dinheiro. A bazuca dos fundos da UE vai traduzir-se em países como Portugal e Espanha numa política ativa de compra de eleitores-clientes por parte dos governos socialistas.

Não, não é um vírus. É um processo de discriminação em curso.
Os nadadores salvadores não devem entrar na água passando o socorro a ser efetuado preferencialmente por instruções transmitidas à distância aos náufragos (como se sabe uma pessoa a afogar-se é um ouvinte atento!)

As aldeias ficam sem arraiais nem procissões. O santuário de Fátima foi cercado pelas autoridades.

Em Lisboa, os centros comerciais continuam fechados. Nas lojas de bairro contam-se as pessoas que podem entrar. Os restaurantes parecem um tetris entre as mesas que se podem ocupar e as que garantem o distanciamento. O tal que é só para alguns.

O distanciamento obrigatório tornou-se em Portugal uma marca de classe ou mais propriamente da pertença à classe errada. Ao mesmo tempo que os ajuntamentos estão proibidos o PCP faz comícios e o Campo Pequeno enche-se com os bonzos do regime a sorrir do pimba, agora devidamente editado pelo progressismo culto que à falta doutra inspiração canta Quim Barreiros.

A CGTP e uns autodenominados antirracistas infringem as regras (para os outros) do distanciamento social numas manobras-manifestação na Alameda… O que há uns anos teria motivado pedidos de desculpa agora normalizou-se. O vírus institucionalizou os privilégios da casta. E a casta vai lutar tenazmente para os manter.

Não, não é um passozinho. É uma negociata para que não exista referendo à regionalização. 
«Costa acelera regionalização» anunciava o Expresso (os governantes do lado bom aceleram, os do lado mau atropelam). Esse acelerar vai passar pela eleição indireta dos presidentes das Comissões de Coordenação e Desenvolvimento (CCDR). De imediato o Presidente da República veio explicar “que o Governo não está a fazer uma regionalização: «”É um passozinho no sentido de aproximar os autarcas das Comissões de Coordenação e Desenvolvimento (CCDR), mas isso é uma coisa, regionalizar é outra coisa”, afirmou Marcelo Rebelo de Sousa aos jornalistas na praia da Ericeira, concelho de Mafra (Lisboa), onde foi dar um banho de mar, na abertura da época balnear


Traduzindo, ficamos com o pior dos dois mundos: esta eleição indireta, agora apresentada desta forma tão inócua, vai dentro de um ou dois anos transformar-se num facto que implica a passagem para a fase seguinte. E como então nos explicarão, não só já não faz sentido equacionar o referendo à regionalização como convocá-lo choca com todos os “passozinhos”, entretanto dados. Marcelo numa outra praia qualquer explicará então que o passozinho de 2020 não foi no sentido que ele tinha combinado, mas de qualquer modo, e antes pelo contrário, como disse que tinha dito, por sua vez e na medida em que… agora vou ali mergulhar.

Não, não é austeridade. É pobreza seletiva. 
A ministra da Administração Pública, Alexandra Leitão, veio declarar a governamental recusa das políticas de austeridade. A senhora ministra é uma pessoa dada às contradições:  nos tempos em que teve responsabilidades na Educação amava tanto a escola pública, mas tanto que colocou as filhas no ensino privado. Agora declara recusar a austeridade num país que a está a viver. Desde que dentro da bolha da Administração Pública continue a rotina das progressões, dos aumentos e dos empregos vitalícios não há austeridade.

Não, não eram túmulos. Eram e são berçários de intolerantes. 

O retrato está certo à excepção do detalhe daquilo que Rui Ramos retrata como “túmulos universitários”: não eram nem são túmulos. Eram e são chocadeiras, berçários, estufas… ou como se quiser chamar aos ambientes devidamente protegidos onde é suposto conseguir-se o sucesso da reprodução.

Durante anos e anos, as universidades encheram-se de observatórios, gabinetes e institutos onde os líderes de extrema-esquerda se cobriram de títulos acadêmicos e aumentaram a sua influência. Pior, onde antes havia conhecimento eles colocaram a ideologia. Temas de investigação, atribuição de bolsas, conferências… tudo passou a estar subordinado à sua visão do mundo.

Atribuem-se bolsas em função do sexo ou da cor da pele. Discute-se se a matemática tem género e proíbem-se conferências de autores não alinhados. Não, não eram túmulos. Eram e são berçários de intolerantes. E de ignorância.
Título e Texto: Helena Matos, Observador, 7-6-2020, 7h52

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