quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

A missão impossível de alterar as cabeças

Reduzir o défice e o Estado é possível. O pior é mudar as mentalidades da gentinha
António Ribeiro Ferreira
Dois exemplos da maneira de estar e pensar de muitos responsáveis pela desgraça deste país. O director do Instituto Superior Técnico, uma instituição de grande prestígio e qualidade em Portugal e no mundo, que não se compara com as muitas chafaricas montadas no ensino superior nos últimos anos, veio alertar a opinião pública para o risco de ter de suspender por tempo indeterminado grande parte da actividade científica. Num país de muitas queixas e queixumes, podia pensar- -se que o problema do IST resultava de cortes orçamentais ou reduções forçadas no pessoal docente, especialmente o afecto à investigação. Nada disso.

Instituto Superior Técnico, foto: DR
O problema do Técnico, segundo o seu director, deve-se às restrições do decreto-lei de execução orçamental em que os organismos abrangidos pelo Orçamento do Estado estão proibidos de assumir compromissos sem que para tal exista disponibilidade financeira. O diploma de Vítor Gaspar impede mesmo os organismos e os serviços públicos de fazerem despesas com base em meras expectativas de receitas. Isto é, só com dinheiro garantido para se pagar aos fornecedores sem os atrasos do costume são permitidas as despesas. E quem violar a lei pode ser punido civil e criminalmente, além de os serviços incumpridores serem fortemente penalizados nas transferências previstas no Orçamento do Estado. Ora bem, um diploma que para o cidadão comum revela bom senso e visa pôr cobro à desbunda do Estado, que compra acima das suas possibilidades financeiras e acumula calotes sobre calotes a empresas privadas, pondo em risco a sua sobrevivência e os postos de trabalho de muita gente, é visto pelo IST como um entrave à investigação científica.

Eurodeputado Nuno Melo, foto: Leonardo Negrão
Num outro universo, o eurodeputado Nuno Melo está possesso por a União Europeia ter aberto as portas aos têxteis e ao vestuário do Paquistão. O centrista, que conhece muito bem a indústria nacional, quer que a Comissão Europeia e o Conselho Europeu repensem rapidamente esta decisão. Nuno Melo diz que será letal para muitas empresas e postos de trabalho. Porque terão de concorrer com empresas que recorrem ao trabalho infantil, não suportam custos sociais, ambientais e utilizam matérias-primas proibidas na Europa. Uma desgraça, portanto, esta concorrência de países que não cumprem com os dogmas e a bíblia europeia, que não respeitam tanta regra estúpida imposta pela eurocracia europeia, sempre baseadas no politicamente correcto e nunca na realidade de cada país. Ainda por cima, é justo dizer-se, este discurso catastrofista e passadista já foi há muito ultrapassado pelos industriais do sector. Hoje as empresas têxteis exportadoras já não apostam nos produtos baratos, sem valor acrescentado. Pelo contrário. Vendem bom e caro para mercados exigentes e com poder de compra, porque o tempo da mão-de-obra barata e das fábricas de vão de escada já passou.
Mas estes dois exemplos mostram bem como é difícil mudar o país. As mentalidades estão formatadas para modelos de vida em sociedade caracterizados por uma grande irresponsabilidade e por um proteccionismo salazarento que ninguém quer erradicar deste desgraçado país.
Título e Texto: António Ribeiro Ferreira, jornal “i”, 16-02-2012

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