Portugal tem vários países dentro de si. A espuma dos dias, o frenesim da comunicação social, o stress da imprensa, das televisões, das redes sociais, das notícias ao minuto passam ao lado de um Portugal profundo, rural, pacato e sereno que vive esta crise com a mesma postura com que sempre viveu. Sempre que regresso às raízes percebo-o e eu próprio abrando. Só nesse Portugal profundo, que a cidade não compreende e que a geração que tem tanto mundo mas que não conhece o seu país e a sua gente, é possível ouvir algumas coisas. Foi por entre baldes de couves que ouvi um comentário político que nos escapa diariamente. Sobre a crise, explicaram-me que "isso existe lá em Lisboa, em crise sempre nós vivemos aqui". Sobre a reforma da Segurança Social e o sistema de pensões, disseram-me que "agora até nos pagam para não fazer nada e a gente ainda se queixa?". E sobre o desemprego, disseram-me que ali só havia desemprego para quem não queria fazer nada. "O Estado paga-lhes para ficarem em casa e a gente quer alguém para ajudar a lavrar e não tem ninguém." Isto não explica coisa alguma, nem pretendo aqui negar evidências. O país vive uma crise económica e financeira profunda, que, apesar dos sinais positivos, continuará a exigir muito de todos nós. O desemprego, ainda que em queda, é uma calamidade social. Mas há um Portugal que desconhece isto. Há um Portugal que nos olha, aos meninos urbanos, cosmopolitas, dos hashtags e do Instagram, de forma estranha. E, em parte, é justo que olhem.
Título e Texto: Nuno Gonçalo Poças, Estado-Sentido, 14-05-2014
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