“Não podemos permanecer em
silêncio”, esse é o título de um comunicado à imprensa com a qual os bispos
italianos convidam à dedicação do dia 15 de agosto, solenidade da Assunção da
Virgem Maria, como um dia para se rezar pelos cristãos perseguidos,
especialmente aqueles no Iraque. É um compromisso ao qual nós aderimos com
convicção, pois o que está acontecendo é uma tragédia talvez sem precedentes em
toda a história. É verdade que nas últimas semanas foi varrida do Iraque a
presença de uma das mais antigas comunidades cristãs, uma comunidade que por
quase dois mil anos sobreviveu incólume à quase todas as vicissitudes da
história. Além disso, também trata-se de comunidades que ainda falam a mesma
língua de Jesus, o aramaico, de modo que a expulsão também assume um valor
simbólico adicional.
Portanto, aderimos com
convicção. Mas enquanto agradecemos à Conferência Episcopal por nos oferecer
esta oportunidade, não podemos deixar de sentir um certo desconforto ao lermos
esse comunicado por causa do título inicial. O “não podemos permanecer em
silêncio” é flagrantemente desmentido pelo conteúdo, que reflete um terrível
mal-entendido, do qual não só a Igreja, como a maior parte do mundo ocidental,
parece ter se tornado refém.
Simplesmente se cala sobre a
identidade dos perseguidores, não querem admitir quem são realmente os
carniceiros e por que agem de tal maneira. É uma espécie de denúncia sobre
autores desconhecidos, mesmo tendo todas as ferramentas e o conhecimento para se
identificar os culpados. No comunicado se fala de cristãos perseguidos,
expulsos, mortos; se fala em Iraque e Nigéria; mas, então, refere-se a
terroristas sem especificá-los e, mais adiante, fundamentalistas e só. Mas quem
são eles? Quem quer a eliminação dos cristãos no Iraque, Nigéria e na maioria
dos países onde os cristãos estão sendo perseguidos?
Eis aqui o problema: se tem
medo de dizer que se trata do Islamismo, que os terroristas são muçulmanos. E
isso não diz respeito apenas à Conferência Episcopal Italiana, é um fato
generalizado em toda a Igreja e em todo o mundo ocidental. Um exemplo: há dois
anos, na Inglaterra, descobriu-se que os fundamentalistas islâmicos
desenvolveram uma estratégia, já em fase avançada, para tomar o controle – ou
islamizar – algumas escolas estaduais de Birmingham. A partir daqui, soou o
alarme, mas o fato é que, em seguida, saiu a notícia de que as autoridades
locais haviam descoberto há muito tempo o que estava acontecendo, mas
preferiram se calar nada pra não ofender os muçulmanos.
Eis aqui o drama: o medo de
ofender os muçulmanos. E quando se vêem obrigados a dizer que os assassinos são
muçulmanos, imediatamente se apressam em ressaltar que se trata de extremistas
que estão traindo o verdadeiro Islã, o qual seria uma “religião de paz”. E aqui
está o equívoco em que se encontra mergulhada a opinião pública ocidental:
estão tentando fazer com que se creia que a tragédia no Iraque, Síria, Nigéria,
é obra de grupos totalmente circunscritos, que usam a religião contra o próprio
Islã. E para este fim estão dando um destaque desproporcional a casos isolados
de muçulmanos que defendem os cristãos ou que tomam uma posição contrária ao
que o Isis está aprontando no Iraque. É justo que se publique tais histórias e
que as valorizem, mas não às custas da realidade.
É verdade que há muitos
muçulmanos que desejam apenas viver em paz, que há alguns que até pagaram com a
própria vida para defender os cristãos no Iraque, e que são muitos que não
querem nem o Isis e nem os nigerianos do Boko Haram. Mas não dá pra fazer de
contas que não existe um problema sério com o Islã.
É uma abordagem errada seja do
ponto de vista conceitual ou histórico. Erro conceitual é sustentar que “o
verdadeiro Islã rejeita a violência”. Essa é uma quimera e não a realidade.
Como já havia escrito o especialista em estudos islâmicos Padre Samir Khalil
Samir, “que a maioria dos muçulmanos seja contrária à qualquer tipo de
violência, pode até ser. Mas dizer que o verdadeiro Islã se opõe a qualquer
tipo de violência, não me parece verdadeiro: a violência está no Alcorão”. E
ele explica: “Em sua vida, Maomé fez mais de 60 guerras. Ora, se Maomé é o
modelo por excelência (como diz o Alcorão 33:21), não é de se estranhar que
alguns muçulmanos também façam uso da violência como imitadores perfeitos do
fundador do Islã. “
O fundamentalismo que domina
hoje no mundo islâmico, ainda que em diferentes versões, é, portanto,
simplesmente uma reproposição do modelo maometano. É verdade que há no mundo
islâmico estudiosos e intelectuais que propõem uma reinterpretação do Alcorão
segundo a chave espiritual, enfatizando a historicidade de certos conteúdos
relacionados ao mundo árabe no momento histórico em que o Islã nasceu, mas se
trata de um fenômeno significativamente minoritário. De qualquer maneira, não
se pode continuar a fingir que isso tem alguma coisa a ver com um Islã que na
verdade não existe.
Uma segunda questão que está
sendo subestimada é a falta de autoridade no Islã. Cada imã, cada mufti, no
fundo representa a si mesmo e quem o segue. Não existe um interlocutor que
possa falar em nome de pelo menos uma parte reconhecível do mundo islâmico.
Isso torna irrealista qualquer tentativa de um “diálogo” com o Islã, o diálogo,
como é vulgarmente entendido, é simplesmente impossível. É possível, em vez — e
desejável –, um relacionamento com muçulmanos individuais, e isso pode ser
constatado pelos casos citados de muçulmanos iraquianos que defenderam as casas
dos cristãos. Mas de qualquer modo é uma realidade que joga por terra um certo
irenismo que está em moda nos círculos católicos.
A ausência de uma autoridade
religiosa reconhecida dentro do mundo muçulmano, permite relações de poder
decisivas entre diferentes correntes. E hoje o que predomina são os grupos
fundamentalistas, graças à sua capacidade de organização.
E aqui chegamos ao erro
“histórico” que até dentro da Igreja se comete: o fundamentalismo islâmico que
vemos em curso no Oriente Médio e na África afeta não apenas aquelas regiões,
mas também nosso próprio país onde ele se encontra em franco crescimento. A
prova maior está nos inúmeros casos de combatentes no Iraque e na Síria que são
oriundos da Europa. Não se iludam: tão logo a situação se estabilize nessas
regiões, eles se voltarão para a Europa para prosseguir com a mesma guerra.
Não somente isso, pois existem
outras associações islâmicas, vinculadas ou próximas da Irmandade Muçulmana,
que apesar de se apresentarem de modo diferente, compartilham o mesmo projeto
do Califado. Elas chegam até nós a partir das periferias, de baixo e
gradualmente, mas o objetivo é o mesmo. Conquistar a Europa é um objetivo que
eles estão declarando publicamente com cada vez mais frequência. E as
personalidades e associações que eles escolhem como interlocutores são justamente
aquelas do mundo eclesiástico e civil. Na prática, estamos escancarando as
portas para aqueles que esperam apenas o momento certo para nos eliminar. Além
disso, a cegueira para a realidade do Islã fez com que a Europa e os EUA, com
suas opções políticas nefastas, facilitassem a ascensão da al-Qaeda e dos
salmistas nos países do Norte de África (ver a Líbia) e Oriente Médio, isso pra
não falar da gestão ou não da imigração.
Gostem ou não, o Islã
representa uma ameaça grave para a nossa civilização e uma oração para os
cristãos perseguidos que não leve em conta essa realidade corre o risco de ser
apenas mais uma demonstração de piedoso sentimentalismo.
Título e Texto: Riccardo Cascioli – La Nuova Bussola
Quotidiana, 11 de agosto de 2014. Tradução: Gercione Lima – Fratres in Unum.com, 14-08-2014
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