Num dia especialmente
desocupado, ocupei-me com os nomes das ruas em São Paulo. No território
frequentado pelas más línguas, consta que a única função dos vereadores é
escolher nomes para as ruas. Quem o afirma não sou eu, e sim essa entidade
anônima e inescrupulosa que se oculta sob a fórmula “todo mundo sabe”. E não vá
o leitor concluir precipitadamente que pretendo candidatar-me a vereador, ou
algum cargo importante num departamento de denominação de logradouros públicos.
Fi-lo porque qui-lo, como diria um ex-presidente que também transitou pela
vereança em São Paulo. E qui-lo por quê?
Por simples curiosidade. Se
não houvesse utilidades maiores nesse trabalho intelectual, bastaria dizer que
me possibilita comparar sistemas de denominação antigos com os atuais. Nomes
antigos surgiam de pontos de referência escolhidos pelo povo, como nestes
exemplos de São Paulo e alhures: Rua do Gasômetro, Rua dos Trilhos, Rua dos
Oratorianos, Rua do Sapo, Largo das Batatas, Rua do Gato que Pesca, Praça do
Pelourinho, Rua do Ouvidor, Rua do Ourives, Rua dos Estudantes, Rua do
Lava-pés. Seria fácil informar a turistas a origem de nomes assim.
Nomes de pessoas nas ruas
constituem uma forma de reconhecimento, uma honra como a que foi concedida a
Paulo Bregaro. De quem era este nome? Nada a ver com o qualificativo brega — um
desses que entram e saem do vocabulário quotidiano, sem que se saiba por que
entraram nem por que saíram. Nas minhas andanças pela História do Brasil, fui
apresentado a esse mensageiro que trouxe do Rio a São Paulo, em viagem a
cavalo, cartas que conduziram D. Pedro I a proclamar a Independência.
Caminhando pelo bairro Ipiranga, onde o brado Independência ou morte decidiu o
futuro do Brasil, alegrou-me encontrar uma rua homenageando-o por aquele feito
importante, talvez o único de toda a vida. Mesmo sendo poucas as informações
sobre o mensageiro, e também poucos os que as conhecem, é fácil compreender a
importância de memorizar desta forma pessoas de mérito como ele.
Parece que está se esgotando o
estoque de personalidades disponíveis para denominar ruas. Um indício é que até
parentes de vereadores vêm recebendo essa homenagem; reforçando-lhes a base
eleitoral, é claro. Até viadutos estão sendo enfeitados com sobrenomes deles.
Não sei se isso rende votos.
Pensando bem, provavelmente
ajuda, pois querem deletar o Presidente Costa e Silva do elevado que o
homenageia. É claro que não vão deixá-lo sem um substituto, embora a
criatividade popular já o substitua sugestivamente por Minhocão. Se os atuais
terroristas enfeitados substituírem Costa e Silva por um Marighella qualquer, o
povo sensato vai insistir em Minhocão. Mas uma ideia melhor é trocar por uma
minhoca venenosa, como urutu, cascavel, jararaca, sucuri. Se a escolha recair
num terrorista desses, contem comigo para emplacar lá a minhoca venenosa.
No meu levantamento das cerca
de 150.000 ruas de São Paulo, constatei que mais da metade dos 365 dias do ano
mereceram a “honra” de constar em uma rua, e muitos até se repetem. Quais foram
os critérios para comemorar uns 200 dias do ano? Deve ter havido motivos
legítimos, mas poucos moradores dessas ruas os conhecem, excetuando
naturalmente as datas históricas nacionais.
Qual o melhor sistema para nomes
de ruas? Não sei, mas é impossível deixar unicamente ao sabor da criatividade
popular, pois as cidades grandes virariam bagunça. E um sistema
despersonalizante, como o de Brasília, desvia a criatividade pública para
outras atividades. Nesse centro político e administrativo do País, já se sabe
onde a criatividade vem aterrissando e fazendo lamentáveis progressos.
Em tempo: Tive também a
curiosidade de constatar em São Paulo uma rua homenageando a data do meu
nascimento. Não conheço nenhum outro fato digno de nota nessa data, portanto…
Título e Texto: Jacinto Flecha, ABIM,
02-08-2014
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Não publicamos comentários de anônimos/desconhecidos.
Por favor, se optar por "Anônimo", escreva o seu nome no final do comentário.
Não use CAIXA ALTA, (Não grite!), isto é, não escreva tudo em maiúsculas, escreva normalmente. Obrigado pela sua participação!
Volte sempre!
Abraços./-