Cesar Maia
1. As reações de parlamentares e dirigentes do PT – Lula incluído –
contra as medidas do chamado ajuste fiscal indicam, claramente, que o PT está
disposto a perder o governo, mas não quer correr o risco de perder em médio
prazo a hegemonia da esquerda. As mudanças políticas na Espanha, com as
vitórias de candidatas às prefeituras de Madrid e Barcelona, fermentadas pelas
redes sociais e apoiadas em novos movimentos sociais sem os sindicatos, usando
os tradicionais chavões da esquerda, servem como referência para este novo
ciclo que o PT inicia.
2. A convenção do PT já sinalizou para 2016 que não há alianças
preferenciais pragmáticas (PMDB...), mas alianças orgânicas ideológicas. Seus
intelectuais – incluindo economistas próximos – já começaram a usar a
artilharia de esquerda contra Levy e desvios neoliberais do governo Dilma. O
Instituto Lula está servindo de cenário, com Lula como mestre de
cerimônias.
3. Até uns poucos anos atrás a CUT continha a radicalização em nome
do emprego e de seu intenso entrelaçamento com as multinacionais do setor
metalúrgico. Essa foi a base de pacificação no governo Lula. Mas a democracia
direta associativa foi atropelada pela democracia direta desierarquizada,
desideologizada, horizontalizada das redes sociais. O escritor Humberto Eco, ao
receber mais um prêmio semana passada – nessa mesma linha –, disse que “as
redes sociais estão dando voz aos imbecis”. Qual o problema? Elitismo do
escritor.
4. O que políticos, sindicalistas e intelectuais de ontem não
aceitam é uma interlocução sem uma cara explícita, sem líderes e sem
assembleísmo. Perdendo o controle dos ditos movimentos sociais, o caminho tem
sido atacar as redes sociais como fascismo e populismo de direita, com
referências aos anos 20 e 30.
5. O fracasso do PT no governo está servindo de pretexto para
voltar à vocalização dos discursos da esquerda do século 20. Dizem alguns:
“Vamos perder o governo. É a alternância democrática. Mas o que não podemos
perder é a hegemonia na esquerda.” Na edição de maio-2015 do Jornal dos
Economistas do conselho regional RJ, desfilam vários economistas atacando a
política econômica atual. Reparem no final do texto abaixo, que Porchman não
fala em maioria eleitoral ou parlamentar, mas de maioria política. Hummmm... Na
marra?
6. Márcio Porchman, intelectual e ex-secretário municipal do PT em
SP, ex-ministro da educação de Lula, candidato a prefeito de Campinas e agora
integrado ao Instituto Lula, em uma entrevista ao Jornal dos Economistas de
maio diz com todas as letras.
7. É um começo de um governo enfraquecido, que tenta se recompor
aceitando diagnósticos que anteriormente não eram seus, que vêm do mercado
financeiro. A eleição passada não produziu uma maioria e, portanto, gerou uma
crise política. E essa crise política vem sendo enfrentada nessa modalidade. Eu
particularmente acredito que não vai produzir resultados efetivos para o país.
A minha percepção é de que as medidas tomadas respondem a um problema político.
Não acredito que essas medidas que estão sendo tomadas produzam resultados
melhores. No meu modo de ver, elas agravam a crise política.
8. De um lado você toma medidas que enfraquecem sua base social sem
trazer o apoio da oposição. A tentativa era, do ponto de vista político, tomar
medidas que pudessem trazer ou dividir a oposição, ou seja, buscando
reconstituir uma maioria política que passasse pela divisão da própria oposição
– porque você trouxe gente do outro lado, trouxe para Ministro da Fazenda quem
havia sido um dos formuladores do plano do candidato derrotado. O ajuste das
finanças públicas está sendo feito no controle dos recursos na boca do caixa.
Essa é a pior forma de fazer ajustes porque é um corte linear, e você está
tendo resultados inquestionáveis. Está começando a parar o governo, a parar
obras.
9. De um lado você corta gastos de custeio, mas de outro aumenta o
gasto financeiro (juros). O gasto de custeio gera emprego e renda. O gasto
financeiro gera concentração de renda, não gera empregos, e sim os destrói. E
eu nem acredito que a taxa de juros tenha a ver com o problema inflacionário.
Tem a ver com a fragilidade das contas externas. Nós temos um déficit em conta
corrente entre quatro e cinco por cento do PIB. Mais uma vez, estamos usando o
diferencial entre a taxa de juros real nacional e a internacional para poder
atrair capital especulativo para fechar as contas.
10. Há um realismo de parte do PT (o que não reduz os erros), mas é
preciso ter uma visão um pouco mais ampla, que é o seguinte: com quem você pode
contar para fazer medidas mais ousadas, num Congresso, num sistema político
fracassado como o que temos hoje, em que as eleições não produzem maiorias
políticas? Sem maioria política não se faz um governo.
Título e Texto: Cesar Maia, 17-6-2015
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