Manuel Villaverde Cabral
Enquanto prossegue – e
provavelmente prosseguirá – o psico-drama helénico, vale a pena debruçar-nos
sobre as emoções desencadeadas pela última sondagem conhecida, a qual colocava
a actual coligação no poder, PSD+CDS, marginalmente à frente do PS. Um jornal
da nossa praça aproveitou para perguntar pela enésima vez a «vários
especialistas» se «as sondagens influenciam os eleitores»? Claro que
influenciam! Resta saber de que modo exercem essa influência. E se é verdade
que há modos de o saber, isso custa demasiado dinheiro aos «especialistas»,
pelo que ficamos na mesma. O problema é este. Quanto às demais incógnitas do
exercício são infinitas, sobretudo num caso como este em que os potenciais
vencedores estão estatisticamente empatados.
A primeira dessas incógnitas,
que permanecerá até à contagem dos resultados, é a abstenção, que os
«especialistas» têm muita dificuldade em captar porque é um comportamento
sancionado negativamente pela «nossa pele social», como lhe chama Elizabeth
Noelle-Neuman, a autora do melhor livro sobre o tema, e por isso fica também por apurar. Portanto, a única
coisa que podemos prever é que a abstenção será maior, em princípio, do que os
«especialistas» pensam e é provável que seja influenciada pelas sondagens, mas
ficaremos sempre sem saber se os eleitores potenciais, perante o risco de
abstenção, correrão em favor dos presumíveis perdedores ou dos vencedores.
Porém, a grande pergunta que
fazem os dois potenciais vencedores diz respeito às motivações do voto e da sua
evolução. Para falar claro, os dirigentes do PS e toda a comunicação social que
anda com António Costa ao colo há perto de um ano perguntam-se como é que,
tendo eles, o PS e os media bem-pensantes, decidido uma vez por todas que o
país se opunha em massa às políticas ditadas pelo memorando de 2011, como é que
os eleitores não dão ao PS maioria absoluta nas sondagens e acabam de o colocar
marginalmente atrás da coligação?
E como não percebem porquê,
têm de arranjar respostas extrínsecas, que não ponham em causa o partido nem as
suas propostas. Por seu turno, os comentadores de serviço mandam bitates
parecidos. Por exemplo, um especialista de generalidades como o antigo ministro
Marques Mendes aventa que é uma mistura da Grécia e do «preso 44» … Por outras
palavras, a desapontadora performance do PS nada tem que ver com Costa. A culpa
é de factores externos que talvez desapareçam por encanto. Se Sócrates saísse
da cadeia e fosse considerado inocente, o PS daria imediatamente um salto em
frente. Quanto ao imbróglio grego, se desaparecesse por milagre, idem.
Ora, a verdade é que há
factores intrínsecos de que o PS e os comentadores não querem lembrar-se.
Primeiro: o papel que o dito PS teve, perante os olhos de todos nós, na virtual
bancarrota do país e nas medidas de ajustamento que o próprio partido negociou
com os credores. Acerca disso, António Costa tem resistido a dizer uma frase
tão curta como: «Desculpem, mas prometemos nunca mais levar o país à
bancarrota». Faz o inverso: nega a evidência passada e fala para o eleitorado à
esquerda do PS na esperança que este venha apoiar o clássico partido estatista
e clientelar que o PS nunca deixou de ser. Veremos como é que esta propaganda
será sancionada.
Em contrapartida, daquilo que
mais interessa à maioria do eleitorado, ou seja, a performance efectiva da
coligação, tanto na gestão do memorando assinado pelo PS como na evolução
financeira e económica posterior à saída da «troika», António Costa e a
comunicação social de serviço repetem à exaustão os mesmos slogans populistas.
Nem tudo é falso no que dizem, mas não é isso que os eleitores querem conhecer.
Querem saber se o pior do legado socialista já terá passado e se o país está,
neste momento, melhor ou não do que todos temíamos quando Sócrates e os seus
fiéis foram afastados do poder.
Ora, há mais de um ano para
cá, todas estatísticas evoluíram favoravelmente a Portugal. Devido à acção
governativa ou à evolução da conjuntura internacional, a verdade é que tem sido
assim. Apesar do seu legado de bancarrotas, o PS não costumava ser insensível a
este tipo de sinais. Agora, porém, agarra-se a todos os problemas que
evidentemente subsistem, muitos aliás por responsabilidade do próprio PS, como
o desemprego, e omite todos os indicadores favoráveis ao país. E não estou a
falar apenas dos indicadores que a comunicação esconde nas páginas interiores,
mas sim daquilo que eles traduzem em termos de comportamentos concretos da
maioria da população. Para além de algum crescimento económico e de muitas
reformas que começam a ter efeitos positivos, alguns desses indicadores, como
as vendas de automóveis ou o facto de «o dinheiro rolar nos casinos», só mostram aliás que nem
todos os portugueses perceberam que a crise ainda não ficou para trás e que
falta muito para tal acontecer, mas isso não faz deles eleitores de esquerda…
Quer então dizer que a
coligação tem a vida facilitada? Certamente que não! Veremos para a próxima
vez.
Título e Texto: Manuel Villaverde Cabral, Observador,
22-6-2015
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