Comecei a escrever este texto
num pernoite no Porto, escrevi-o como uma merecida e singela homenagem às
Comissárias e Comissários de Voo que se aposentavam. Na época, eu estava em
plena ativa, é claro.
O artigo ‘Adeus – E obrigado!’ foi
publicado em 1993 no jornal ‘A Bússola’, do SNA - Sindicato Nacional dos
Aeronautas. Anos depois também foi publicado na revista “speech”, da ACVAR –
Associação dos Comissários da Varig. E aqui na revista saiu nos anos 2010 e
2011 (31 de maio).
Anos mais tarde, em 2005, já
aposentado como “eles”, fiz um e-mail bonitinho. A formatação foi, mais ou
menos, essa mesmo, letras brancas sobre fundo lilás escuro. O Arco do Triunfo à
noite era a ilustração. Com a música La
vie en rose (instrumental) como fundo musical. (No final deste post está um
vídeo de Albert Armen, executando-a no acordeão.)
Por duas vezes, até aonde vai
a minha lembrança, recebi na minha caixa de entrada este texto dado como
apócrifo. A remetente escrevia que o encontrou nos seus antigos e-mails, well…
Adeus
- e obrigado!
...nós continuamos por aqui.
Eles têm vinte e poucos, trinta
e tantos, quarenta ou cinquenta e alguns anos de idade. Vieram de quase todos
os estados brasileiros e até mesmo de países amigos. Alguns, têm três ou quatro
anos de voo. Outros, começaram ainda ontem. Mas também há aqueles com mais de
trinta anos em rota. E muitos que sonham em começar...
Muitos deles têm cursos
superiores que os habilitam ao exercício das mais variadas profissões. A grande
maioria fala, pelo menos, um idioma estrangeiro - e há quem domine mais de
dois!
Muitos também já estavam bem
instalados profissionalmente, mas deixaram tudo o que faziam antes. Desistiram
de concorrer a empregos melhores, interromperam estágios, cancelaram projetos,
adiaram noivados, alguns talvez tenham até brigado com a família, enfim,
deixaram tudo de lado para abraçarem o que consideraram uma experiência única:
voar servindo.
Atenderam a milhões de
viajantes, sem nem lhes saber o nome. Cansaram-se em plantões noturnos
intermináveis. Cochilaram em seus incômodos lugares de descanso. Lidaram com o
público e desempenharam muitas outras tarefas, registrando queixas e críticas,
desaforos, inconveniências.
Organizaram galleys, carregaram
e guardaram embrulhos, sacos e malas. Atenderam doentes. Trabalharam com
equipamentos sofisticados e, também, com peças obsoletas, ferramentas
enguiçadas, improvisadas, quebradas, inadequadas. Tiveram que mostrar sempre
boa vontade e um sorriso cordial.
Aturaram bêbados,
desequilibrados, arrogantes e prepotentes. Atenderam a diretores, presidentes,
gerentes, chefes, assistentes, "olheiros", pilotos, mecânicos de voo,
colegas mil. Vips, Cips, assessores, empresários, "celebridades"...
E, não raro, depararam-se com os "amigos" de "alguém
importante", reivindicando tratamentos especiais e complicando-lhes o
trabalho até o desespero?
Enfrentaram as emergências
"naturais" e as mais imprevistas e delirantes. Continuaram mostrando
boa cara e um sorriso bem-disposto. Aguentaram o frio e o calor, e
"multidões" indisciplinadas. Prepararam-se intensamente para
servir, agir, atuar. Guiaram viajantes, dando-lhes informações sobre tudo...
Importava que explicassem, dessem a conhecer, contassem do seu país.
Como tal, cada um deles é um
embaixador "full-time". E souberam recepcionar grupos de todos os
quadrantes, cores, formas e feitios... Ajudaram idosos e deficientes, tiveram
paciência com imbecis e difíceis ao trato. Trataram toda a gente com gentileza
e afabilidade. Mesmo quando as crianças se tornaram insuportáveis, em sua
"natural" indisciplina e falta de educação. Mesmo quando os viajantes
eram grosseiros, estúpidos, perfeitos cretinos com o "rei na
barriga". Eles sorriam da mesma forma, amavelmente, controlando com
eficácia as situações difíceis e tensas, mesmo que estivessem à beira de um
ataque de nervos.
Venderam a volta.
Certamente, alguns sofreram e
outros tiveram saudades de casa. Alguns adoeceram, e houve até quem fosse
embora e não mais voltou.
Ajudaram-se mutuamente nas mais
diferentes tarefas. E também andaram na "maior". Estabeleceram
cumplicidades esfuziantes. E, decerto, dançaram e namoraram. Organizaram
jantares, "happy hours" e festinhas de aniversário. Passeios, farras
e noitadas. Houve abstêmios e quem ficasse de pileque. Andaram em bando por
esquinas, largos, catedrais, de noite, madrugada ou de dia, em mil lugares do
mundo.
Riram solto. Contaram a vida uns
aos outros. Falaram de suas terras, famílias, amigos, amores e desamores.
Alegrias, vibrações, hesitações e inseguranças. Falaram de injustiças,
combinaram viagens e visitas. Choraram sozinhos em quartos internacionais.
Passaram dez, vinte, trinta e
poucos anos juntos, um tempo que ninguém pode tirar dessas Comissárias e
Comissários de Voo. E, ao se aposentarem, "malgré tout", brilha em
seus olhos uma experiência diferente e inesquecível, a certeza de uma
aprendizagem do mundo absolutamente incrível e radiosa. As lágrimas se
aproximam, já com saudades... Isso é uma coisa que eles, as Comissárias e Comissários,
não trocariam por nada.
Adeus e obrigado. Nós
continuamos por aqui, no ano que vem.
Edição: JP
abril 2005
Dentro da minha filosofia, sei que poucos as entendem, eu comparo um avião à musica HOTEL CALIFÓRNIA.
ResponderExcluirNossas "hostess" de bordo à música "SHE".
Nossos colegas à bordo os nossos "Guitar man".
E a nossa vida apenas "uma velha roupa colorida.
abraços e fui,,,
[Discos pedidos] “Eu comparo um avião à música ‘Hotel California’”
ExcluirCaro Editor, o texto sempre será atual! Verdadeiro!
ResponderExcluirHomenageando a todos Profissionais , Cmros e Cmras. Pelo tempo citado, a redação ocorreu no Ipanema Porto ou em Povoa do Varzim, lembro bem dessa época.
Feliz dia do Comissário!
Heitor Volkart
Foi no Ipanema ;)
ExcluirQuando faço minhas imprecisas comparações, levo em conta o que diz a letra.
ResponderExcluirDentro de um avião durante várias noites em dormir direito é como:
Last thing I remember
I was running for the door
I had to find the passage back
To the place I was before
Relax, said the night man
We are programmed to receive
You can check out any time you like
But you can never leave!
As nossa colegas são sem dúvidas:
She may be the face I can't forget
The trace of pleasure or regret
May be my treasure or the price I have to pay
She may be the song that summer sings
Maybe the chill that autumn brings
Maybe a hundred different things
Within the measure of a day
She may be the beauty or the beast
May be the famine or the feast
May turn each day into a Heaven or a Hell
She may be the mirror of my dreams
A smile reflected in a stream
She may not be what she may seem
Inside her shell
She, who always seems so happy in a crowd
Whose eyes can be so private and so proud
No one's allowed to see them when they cry
She may be the love that cannot hope to last
May come to me from shadows in the past
That I remember 'till the day I die
She maybe the reason I survive
The why and wherefore I'm alive
The one I'll care for through the rough in many years
Me, I'll take her laughter her tears
And make them all my souvenirs
And where she goes I've got to be
The meaning of my life is
She,
Os homens a bordo trabalhando como uma pequena banda de música, os homens que muitos gostariam de ser:
Then the lights begin to flicker and the sound is getting dim
The voice begins to falter and the crowds are getting thin
But he never seems to notice he's just got to find
Another place to play,
(Anyway got to play, anyway got to play)
(Neither way got to play, neither way got to play)
E por fim nos dias de hoje nossas velhas roupas coloridas já não nos vestem, servem mais.
Por fim para quem assistiu o filme FERNÃO CAPELO GAIVOTA.
DESEJO À TO UM LONELY LOOKING SKY
https://www.youtube.com/watch?v=zthqLVeyjOA