Carina Bratt
Dias atrás, em visita à casa do
Eliseu, um amigo meu que se acidentara com a sua moto, passei, antes na padaria
do bairro para comprar uns pães, leite, queijo e mortadela. Claudia, a mulher,
igualmente minha amiga, me dissera que estavam à espera, com um cafezinho feito
na hora. Pai de três meninas nas idades de oito, nove e dez, achei melhor pôr
em prática uma boa ação, tendo em vista que o Eliseu em decorrência do ocorrido
tomara um belo pé no meio do traseiro e perdera o emprego. Além disso, andava
mais duro que pau de tarado.
Eliseu era motoqueiro e, como
tal, entregador de pizzas, fazia bem uns cinco anos. Tinha, contudo umas manias
esquisitas de querer se mostrar aos colegas de serviço. E o fazia de uma forma
desgraçadamente perigosa. Adorava empinar com a motocicleta, pelas ruas,
promovendo um furdunço entre os colegas que, boquiabertos e pasmos, por mais
habilidosos que fossem com suas máquinas, não chegavam aos pés do engraçadinho.
Eliseu, na hora de se aventurar nessas idiotices sem pé nem cabeça se esquecia
da vida, da mulher dos filhos a tal ponto de se transformar num louco
desmioladamente desvairado.
Lado outro, com tais manobras,
um descuido pequeno que fosse, poderia o doidivanas ficar paralítico para o
resto da vida. No pior dos mundos, se meter num paletó de madeira indo parar,
de mala e cuia, no cemitério local. Não fora falta de avisos e clamores. Numa
dessas, o infeliz caiu como um saco bêbado, com tudo, em plena rodovia,
perdendo a moto, se arranhando todo dos pés a cabeça, além de meia dúzia de
pedidos que transportava para clientes que ligaram para o estabelecimento
procedendo às respectivas solicitações.
Em casa de meu amigo, todos
sentados à mesa enorme (menos ele, o Eliseu que tivera que se adaptar a uma
cama-maca alugada de hospital, cama esta paga pela mãe e pela sogra em rótulo
de vaquinha), atravancada num canto da sala, ao me servir de um pão, deparei,
no anverso da embalagem com uma mensagem interessante: “A ESTÁTUA E O AZULEJO
DE MÁRMORE”. Achei interessante. Ipsis
litteris, resolvi reproduzir. Dizia o seguinte: Havia um museu, com o piso
completamente coberto por belíssimos azulejos de mármore e com uma estátua,
também toda trabalhada nesse material.
A colossal ficava exposta à
visitação pública exatamente no meio do salão principal, de frente para a entrada.
Nos finais de semana pessoas vinham passear e traziam seus filhos para
admirarem as obras de arte existentes no complexo, todavia, o que de fato
chamava a atenção, sem dúvida alguma, a bonita estátua de mármore. Uma noite,
depois de cessada a movimentação, um dos azulejos (o que parecia ser o mandão
do pedaço), se aproximou da beldade e começou a falar e não só a falar, a
reclamar com a estátua em nome dos demais companheiros de infortúnio:
– Estátua, minha amiga, isso
não é justo, não é justo! Por que vem gente de todos os quadrantes dessa cidade
e aqui dentro, numa imoralidade pisa e repisa em todos nós, só para admirá-la?
Não acho correto!
Ao que a estátua respondeu,
sem perder a pose:
– Meu querido amigo azulejo de
mármore. Vamos voltar no tempo. Você se lembra de quando estávamos, de fato, na
mesma caverna?
– Sim! É por isso que eu acho
tudo muito desleal. Nós nascemos no mesmo berço e, agora, recebemos tratamento
diferenciado. Não é digno de nossa estirpe!
– Então, você ainda se recorda
do dia em que o artista tentou trabalhar em você – seguiu em frente à
intocável, mas seu corpo franzino não resistiu às ferramentas que ele usava?
– Sim, claro que eu me lembro.
Eu odiei aquele sujeito! Como ele pode fazer uso daquelas ferramentas em mim? –
Doeu muito! Até agora ainda me apoquentam algumas partes de meu pobre
esqueleto.
– Isso é certo! Em vista
disso, ele não pode fazer nada em você, porque você resistiu em ser trabalhado.
– Sim, querida estátua. E daí?
Aonde quer chegar?
– Em lugar nenhum. O que
desejo deixar claro é muito simples. Quando o artista desistiu de você, veio
para cima de mim. Ao invés de fugir, eu soube imediatamente que me tornaria
algo diferente depois dos esforços daquela criatura. Por essa simples razão eu
não debandei. Ao contrário, me dei me doei. Suportei bravamente todas as
ferramentas estranhas que ele usou em meus costados. Foi um inferno, um Deus
nos acuda, mas não me fiz de rogada...
– Mmmmm… – Resmungou o
azulejo.
– Meu caro amigo azulejo,
entenda. A coisa é simples. Há um preço para tudo na vida. E nem sempre é fácil
ou justo esse valor. Às vezes é muito penoso e doloroso –, seguiu conjecturando
a estátua de cima de seu suporte. – Mas temos que aprender a aguentar os
sofrimentos, procurando crescer para nos transformarmos em algo mais delicado,
mais belo e formoso. Uma vez que você jogou a toalha desistindo de tudo no meio
do caminho, acredite piamente, você não pode culpar, jamais, as pessoas que
passam por cima de você. Elas não têm culpa. Naquela ocasião, você se alienou a
essa condição de coitadinho, quando bem poderia ter sido transformado em alguma
coisa mais edificante aos olhos de todos que por aqui se aconchegam.
Moral da história
Na vida, passamos por
sofrimentos e provações para crescermos e nos tornarmos testemunhas vivas da
ação de Deus. Para que isso aconteça é necessário lançarmos fora o medo e
deixarmos que Jesus nos molde conforme a Sua vontade. Ele quer fazer de nós, ou
melhor, de você, em particular, uma bela obra prima, uma obra em que deixe a
vida de todos exposta a grandiosidade do Seu Amor.
OBS: A embalagem (dos pães) da
qual reproduzi esta cópia, não trazia o nome do autor. Caso os meus caríssimos
leitores se deparem com seu criador, por favor, solicito que me informem
imediatamente. Quanto ao meu amigo Eliseu, está se recuperando num processo
lento e bastante penoso. Sobrevivendo com doações de parentes e amigos. Os
médicos que o assistem informaram que logo ele voltará a caminhar normalmente,
podendo, pois, dentro de mais uns três meses, regressar às normalidades do
cotidiano.
Entretanto, atentada, de
chofre, numa dessas visitas, não resisti e mandei bala:
– E quanto à moto? Pretende adquirir outra, ou mandará arrumar a
antiga? Eliseu me respondeu, meio que
brabo e enfezado:
– Cara, esse tipo de
transporte, NUNCA MAIS!
Título e Texto: Carina
Bratt, de Curitiba, no Paraná. 11-8-2019
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