Paulo Hasse Paixão
A prova provada que a lógica corporativa do
Estado Português pouco mudou entre a Segunda e a Terceira repúblicas está
estampada no caso dos Certificados de Aforro.
Até o infeliz ministro das
finanças, Fernando Medina, reconheceu que a consequente corrida aos Certificados
de Aforro
“decorre da livre escolha
que os portugueses têm feito por não encontrarem no mercado uma oferta do ponto
de vista da poupança, que seja compatível com uma remuneração adequada.”
Este reconhecimento não impediu porém o governo de ceder às pressões do todo poderoso sector bancário. A insaciável ganância dos acionistas da banca privada não só impede justas retribuições nas linhas de poupança das entidades de que são investidores como se recusa a aceitar as mais elementares regras do mercado de capitais. E se os bancos querem manter, em uníssono e contra todo e qualquer princípio ético que possa sobreviver à imoralidade dos mercados financeiros contemporâneos, as taxas de juro baixas nos produtos de poupança, nem o Estado parece ter poder para oferecer uma alternativa: o governo poderá avançar para alterações na taxa de rentabilidade de futuras subscrições dos Certificados de Aforro, ou emitir novas séries com outras condições e remuneração mais baixa.
Para além da óbvia batota – o Estado não deve alterar as regras a meio do jogo quando as condições deixam de ser favoráveis para o emissor – a cartelização dos interesses entre as elites políticas e financeiras em continuado desfavor das massas está à vista de toda a gente.
Dado o desavergonhado conluio
entre os sectores públicos e privados, os portugueses são assim condenados a
pagar altas taxas de juro em crédito, mas a não beneficiar dessa conjuntura em
aforro, num contexto que é, ainda por cima, inflacionário e, o que é mais,
recessivo.
Ao baixar a rentabilidade dos
Certificados de Aforro, o Estado Português, com o explícito intuito de garantir
altos dividendos aos acionistas da banca privada, prefere aumentar a dívida
soberana, pedindo dinheiro emprestado a instituições financeiras internacionais
e fundos de grandes investidores, em vez de recolher o investimento dos seus
próprios cidadãos, para benefício de ambos.
A filosofia política do ContraCultura
é libertária e não tem por isso qualquer simpatia por regimes ditatoriais, mas
uma coisa tem que ser dita: Nem o Estado Corporativo de Salazar foi draconiano
como draconiana é esta atual República, espécie de sindicato criminoso em que
os dirigentes políticos colaboram ativamente com o grande capital e os
interesses instalados para empobrecer os cidadãos de todas as maneiras
possíveis, seja através de cargas fiscais absolutamente destruidoras de
qualquer hipótese de florescimento da classe média e das pequenas e médias
empresas, seja pela transferência de privilégios e riqueza para aqueles
parasitas que monopolizam o poder económico do país.
Não é nada que não aconteça
por todo o Ocidente, claro. Mas é sempre doloroso ver como Portugal está hoje
perfeitamente enquadrado nas lógicas e nas narrativas e na práxis das elites
globalistas sediadas em Wall Street, Davos, Bruxelas etc.
Um país que historicamente
sempre se atrasou em relação aos progressos civilizacionais, teima em chegar
cedo aos seus retrocessos.
Triste sina.
Título e Texto: Paulo Hasse
Paixão, ContraCultura,
2-6-2023
Governo anuncia a criação de novos Certificados de Aforro. Ficam disponíveis na segunda-feira
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