quarta-feira, 12 de julho de 2023

[Língua Portuguesa] Tem que ou Tem de?


Flávia Neves 

As locuções ter que e ter de estão corretas e são sinônimas. Indicam o ato de ter obrigação ou necessidade de fazer alguma coisa. 

Diversos dicionários atestam que essas duas expressões são equivalentes. Os falantes podem, assim, utilizar as duas locuções porque ambas são muito usadas e socialmente aceitas.

Exemplos com ter de

·         Eu tenho de comprar ovos para fazer um bolo de chocolate.

·         Você tem de ajudar seu pai na loja nos fins de semana.

Exemplos com ter que

·         Eu tenho que comprar ovos para fazer um bolo de chocolate.

·         Você tem que ajudar seu pai na loja nos fins de semana.

A aceitação dessas duas formas como sendo equivalentes é, contudo, controversa. Enquanto alguns defendem que houve uma generalização do significado das duas expressões pelo uso, outros defendem que existem pequenas diferenças no seu significado.

Ter de é a forma preferencial?

Diversos gramáticos privilegiam o uso da expressão ter de, considerando-a a forma preferencial. Defendem que a estrutura ter de é anterior à estrutura ter que, tendo-a como a mais culta.

Exemplos com ter de:

·         Você tem de aprender isso tudo até amanhã.

·         Tenho de me ir embora agora.

Ter que tem um significado diferente?

Os estudiosos que fazem distinção entre essas duas expressões, afirmam que se deve usar a expressão ter que para referir que há algo ou alguma coisa para ser feita, sendo geralmente acompanhada de um advérbio.

Exemplos com ter que:

·         Tenho muito que trabalhar até ao meio-dia.

·         Teria algo que comer se você não tivesse comido tudo.

Flávia Neves, Dúvidas de Português

 

Eu tenho mesmo de deixar aqui um breve comentário sobre esta coisa! Na realidade nem os mais doutos que se propõem ensinar o bom português têm o cuidado de conjugar devidamente o ter de. Para ser franco começo mesmo a duvidar sobre a forma correta. 
Por favor ajudem-me! 
Cláudio Sousa

Utilizar a construção «ter que» em vez de «ter de» é, efetivamente, uma incorreção muito vulgar. E de tanto se ouvir e ver escrita, pode acontecer até que alguém que domine a língua cometa essa incorreção. Não foi o caso do consulente, que utilizou adequadamente a construção «ter de», já que quis dizer «vejo-me na obrigação de», «assumo o dever de».

No Ciberdúvidas há já várias respostas sobre este assunto [Os erros de Marcelo, Ainda os erros de Marcelo, Ter que e ter de, Ter que e ter de]. No entanto, como o consulente pretende um texto que afaste completamente as suas dúvidas, vou proceder a uma sistematização.

1. Ter de

Ter de é uma expressão utilizada quando se pretende dizer que se tem o desejo, a necessidade, a obrigação ou o dever em relação a uma qualquer ação: «tenho de me ir embora» (= sou obrigado a ir-me embora, devo ir-me embora, tenho necessidade de me ir embora), «ele tem de arrumar o quarto» (= ele deve arrumar, tem o dever de arrumar o quarto), «temos de nos ouvir uns aos outros» (= temos o dever ou a obrigação de nos ouvir).

Nesta situação, o verbo «ter» é um verbo auxiliar da conjugação perifrástica: auxiliar ter + preposição de + verbo no infinitivo. Assim, «ter de», por si só, significa «ter necessidade de», «precisar de», «ser obrigado a», «dever», designando, pois, a necessidade de praticar a acção expressa pelo verbo que se segue, que é o verbo principal.

2. Ter que

Nesta situação, o verbo «ter» não é um auxiliar; é um verbo com a plena significação de «possuir», «ser detentor de», «estar na posse de», «desfrutar», «usufruir», «poder dispor de».

Por exemplo, se alguém quiser dizer que «tem muito trabalho», poderá utilizar a expressão «que fazer» para substituir a palavra «trabalho»: «Tenho muito que fazer.» Do mesmo modo, se quiser dizer que tem uma série de histórias ou aventuras para nos contar, pode utilizar a expressão «que contar» para referir esse conjunto de relatos: «Ele viveu muito, tem muito que contar.» Se quiser, ainda, dizer que tem em casa muita matéria para estudar, assuntos sobre os quais se debruçar, poderá utilizar a expressão «que estudar»: «Tenho tanto que estudar!» E também podem surgir frases sem esse antecedente, subentendendo-se «coisas», «alguma coisa», «algo» (na negativa, «nada») a que o relativo se refira: «ele não tem que fazer» (= não tem coisas que fazer, não tem nada que fazer), «ele não tem que comer» (= não tem nada que comer), «ele não vai ter que dizer» (= não vai ter nada que dizer).

Por outro lado, esses sintagmas «que fazer», «que contar», «que estudar», «que comer», «que dizer» assumem, pois, força substantiva, como se pudessem ser substituídos por «trabalho» ou «afazeres», «relatos», «estudo», «comida», «palavras», etc.: «ele tem que fazer» = ele tem trabalho, tem afazeres; «ele tem que comer» = ele tem comida; «ele não tem que dizer» = ele não tem palavras. E entre o verbo «ter» e o pronome relativo «que» poderá ser colocado um indefinido (tanto, muito, pouco).'

Ciberdúvidas da Língua Portuguesa

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