Flávia Neves
As locuções ter que e ter
de estão corretas e são sinônimas.
Indicam o ato de ter obrigação ou necessidade de fazer alguma coisa.
Diversos dicionários atestam
que essas duas expressões são equivalentes. Os falantes podem, assim, utilizar
as duas locuções porque ambas são muito usadas e socialmente aceitas.
Exemplos com ter de
·
Eu tenho de comprar ovos para fazer um bolo de
chocolate.
·
Você tem de ajudar seu pai na loja nos fins de
semana.
Exemplos com ter que
·
Eu tenho que comprar ovos para fazer um bolo de
chocolate.
·
Você tem que ajudar seu pai na loja nos fins de
semana.
A aceitação dessas duas formas
como sendo equivalentes é, contudo, controversa. Enquanto alguns defendem que
houve uma generalização do significado das duas expressões pelo uso, outros
defendem que existem pequenas diferenças no seu significado.
Ter de é a forma
preferencial?
Diversos gramáticos
privilegiam o uso da expressão ter de, considerando-a a forma preferencial.
Defendem que a estrutura ter de é anterior à estrutura ter que, tendo-a como a
mais culta.
Exemplos com ter de:
·
Você tem de aprender isso tudo até amanhã.
· Tenho de me ir embora agora.
Ter que tem um significado
diferente?
Os estudiosos que fazem
distinção entre essas duas expressões, afirmam que se deve usar a expressão ter
que para referir que há algo ou alguma coisa para ser feita, sendo geralmente
acompanhada de um advérbio.
Exemplos com ter que:
·
Tenho muito que trabalhar até ao meio-dia.
·
Teria algo que comer se você não tivesse comido
tudo.
Flávia Neves, Dúvidas de Português
Utilizar a construção «ter
que» em vez de «ter de» é, efetivamente, uma incorreção muito vulgar. E de
tanto se ouvir e ver escrita, pode acontecer até que alguém que domine a língua
cometa essa incorreção. Não foi o caso do consulente, que utilizou
adequadamente a construção «ter de», já que quis dizer «vejo-me na obrigação
de», «assumo o dever de».
No Ciberdúvidas há já várias
respostas sobre este assunto [Os erros de Marcelo, Ainda os erros de Marcelo,
Ter que e ter de, Ter que e ter de]. No entanto, como o consulente pretende um
texto que afaste completamente as suas dúvidas, vou proceder a uma sistematização.
1. Ter de
Ter de é uma expressão
utilizada quando se pretende dizer que se tem o desejo, a necessidade, a
obrigação ou o dever em relação a uma qualquer ação: «tenho de me ir embora» (=
sou obrigado a ir-me embora, devo ir-me embora, tenho necessidade de me ir
embora), «ele tem de arrumar o quarto» (= ele deve arrumar, tem o dever de
arrumar o quarto), «temos de nos ouvir uns aos outros» (= temos o dever ou a
obrigação de nos ouvir).
Nesta situação, o verbo «ter»
é um verbo auxiliar da conjugação perifrástica: auxiliar ter + preposição de +
verbo no infinitivo. Assim, «ter de», por si só, significa «ter necessidade
de», «precisar de», «ser obrigado a», «dever», designando, pois, a necessidade
de praticar a acção expressa pelo verbo que se segue, que é o verbo principal.
2. Ter que
Nesta situação, o verbo «ter»
não é um auxiliar; é um verbo com a plena significação de «possuir», «ser
detentor de», «estar na posse de», «desfrutar», «usufruir», «poder dispor de».
Por exemplo, se alguém quiser
dizer que «tem muito trabalho», poderá utilizar a expressão «que fazer» para
substituir a palavra «trabalho»: «Tenho muito que fazer.» Do mesmo modo, se
quiser dizer que tem uma série de histórias ou aventuras para nos contar, pode
utilizar a expressão «que contar» para referir esse conjunto de relatos: «Ele
viveu muito, tem muito que contar.» Se quiser, ainda, dizer que tem em casa
muita matéria para estudar, assuntos sobre os quais se debruçar, poderá
utilizar a expressão «que estudar»: «Tenho tanto que estudar!» E também podem
surgir frases sem esse antecedente, subentendendo-se «coisas», «alguma coisa»,
«algo» (na negativa, «nada») a que o relativo se refira: «ele não tem que
fazer» (= não tem coisas que fazer, não tem nada que fazer), «ele não tem que
comer» (= não tem nada que comer), «ele não vai ter que dizer» (= não vai ter
nada que dizer).
Por outro lado, esses
sintagmas «que fazer», «que contar», «que estudar», «que comer», «que dizer»
assumem, pois, força substantiva, como se pudessem ser substituídos por
«trabalho» ou «afazeres», «relatos», «estudo», «comida», «palavras», etc.: «ele
tem que fazer» = ele tem trabalho, tem afazeres; «ele tem que comer» = ele tem
comida; «ele não tem que dizer» = ele não tem palavras. E entre o verbo «ter» e
o pronome relativo «que» poderá ser colocado um indefinido (tanto, muito,
pouco).'
Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
O que significa “distopia”?
Tráfego ou tráfico
Círculo virtuoso ou Ciclo virtuoso?
Abreviatura de atenciosamente e atentamente: Att. ou At.te?
Havai ou Havaí?
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