Há muitas razões para o descontentamento
e acredito que os partidos pró-europeus serão duramente penalizados no domingo
por um invulgar voto de protesto. O povo arrastou um pesado fardo.
Por outro lado, parte da elite
nacional com acesso aos meios de comunicação tem repetido a crítica à Europa e
muitos intelectuais entraram numa deriva populista de ataque sistemático ao
projecto europeu, à moeda única e até ao sistema partidário. Segundo estas
visões, os políticos nunca foram tão maus e os partidos tradicionais são
incapazes de resolver os problemas do País. A moeda única foi uma cedência de
soberania que nada trouxe de bom e que está na origem da falência de 2011. A
Europa, tal como existe, não promete nada e deve até acabar em breve.
Na realidade, o euro trouxe
inflação baixa e o acesso fácil a um mercado gigantesco; a economia não
aproveitou estas vantagens, mas isso foi devido a erros estratégicos, o atraso
nas reformas e a falta de compreensão da exigência de competitividade. A saída
do euro, agora, daria liberdade monetária, mas seria um recuo político de vinte
anos, implicava o isolamento e tinha graves riscos. Abandonar a União Europeia
seria um outro erro histórico: desde a adesão, o País teve estabilidade
política e apoios financeiros equivalentes a 3% do PIB por ano. A não-Europa,
para nós, era um desastre sem precedentes. Apesar dos mitos persistentes sobre
a crise, Portugal nunca foi tão desenvolvido e moderno como agora. O País não
tem hipótese nesta Europa? Claro que tem, desde que regresse à convergência com
o rendimento médio europeu.
Os partidos tradicionais estão
sob pressão em todos os países com problemas económicos. Sobre a Europa tombou
uma cortina de pessimismo. E, no entanto, os europeus nunca foram tão prósperos
e as suas sociedades jamais tiveram o actual grau de segurança e estabilidade.
No final das contas, os europeus não quererão trocar a sua riqueza por
aventuras retóricas. Os populistas, à esquerda e à direita, não têm uma
verdadeira alternativa à actual Europa.
Alguns analistas defendem a
tese de que a União Europeia evoluiu para um directório de potências, que de
facto existiu durante a crise do euro. As potências têm mais poderes, pois a UE
cresceu, mas o que me parece verdadeiramente novo é o mecanismo emergente da
responsabilização dos países que fazem parte da moeda única. Em Portugal, todos
falam muito da solidariedade europeia, mas ninguém menciona a responsabilidade
de cada um e, no entanto, a crise das dívidas soberanas teve na sua origem não
a falta de solidariedade mas os comportamentos irresponsáveis de alguns países,
que arrastaram os restantes para uma região demasiado perto do abismo.
É sempre possível recusar esta
Europa da responsabilidade, mas o isolamento não será a melhor opção. Os
partidos têm defeitos, mas não se vislumbra nada melhor. E os políticos parecem
hesitantes e não citam os clássicos, mas não há grandes diferenças em relação
aos tribunos que no passado nos levaram a outras bancarrotas, quando não
existia a desculpa da moeda única. Em Portugal, todas as gerações cometeram os
erros crónicos do excesso de despesa pública. Aderir à Europa da
responsabilidade podia mudar isso.
Título, Imagem e Texto: Luís Naves, Fragmentário,
20-05-2014
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