Aparecido Raimundo de Souza
“A
Justiça é uma puta bem safada, tão envergonhada de si mesma, que esconde os
olhos numa venda”.
(‘Pachá’ - Pensador de Rua – Praça da Sé –
São Paulo)
Diz um provérbio árabe que o
homem, para ser totalmente realizado, necessita dar existência a três coisas
consideradas fundamentais: ‘plantar uma árvore, escrever um livro e ter um
filho’. Com todo o respeito, desculpem a intransigência, ou a intolerância, mas
a elas tomaríamos a liberdade de acrescentar mais três itens distintos, claros,
não no sentido de deturparmos o anexim ou discordarmos de quem quer que
seja. Seria, na verdade, unicamente para
trazermos à baila a extensão dos nossos sonhos. Devaneios, temos certeza,
também presentes na cabeça de muitos milhões de brasileiros.
Dirão os pacóvios, à boca
miúda, que ‘esses desejos’ não passam de loucuras inventadas por meia dúzia de
debilóides. Bobos da corte, ou ‘chínfrios filósofos’ de meia tigela, iguais
aos da Idade Média, que viviam nos palácios dos príncipes e nobres, divertindo
os bens nascidos com momices e ditos chocarreiros. O fato é que do alto dos
nossos sessenta e três anos, escrevemos filhos, plantamos livros e tivemos uma
manada (manada?!) de árvores. Sistematicamente nessa desordem...
Em nenhum momento desse mais
de meio século, é bom que deixemos registrado, nos julgamos efetivamente donos
da situação, ou seja, não fomos, ou não somos felizes. As senhoras e os
senhores, perguntarão: o que faria de nós, ilustres idiotas nos sentirmos
plenamente realizados para partirmos daqui alegres e saltitantes se, claro,
batêssemos hoje, com as caçoletas do destino no cais onde a barca de Caronte
nos espera ancorada?
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Caronte, ilustrado por Gustave Doré, para a Divina Comédia |
Se não botarmos fora esses ‘encobertos’
que fluem de dentro do nosso âmago, como bombas prestes a explodirem -, ainda
que, para alguns, possam parecer contrários e pecaminosos à moral, a ética e
aos bons costumes – ficaríamos entalados como se tivéssemos com dois ovos
quentes na boca. Os prezados que nos leem alguma vez na vida passaram pelo
ridículo de terem as bocas entupidas com dois ovos quentes engasgados na linha
da garganta? Deveriam experimentar!!!
Sempre achamos, continuamos
com a ideia fixa na cabeça e vamos morrer pensando dessa forma: o homem que não
é ignavo e preza, acima de qualquer filosofia, a sua honradez, deve fazer e
falar o que bem entende. Expressar, sem medo de represálias seus pensamentos,
convicções e anseios, sem se acovardar diante das leis, da ordem, da moral, da
ética e da sociedade. A sociedade que vá para a casa do caralho.
Que tudo mais voe pelos ares junto com aqueles afetados pela hipocrisia, pelas ‘caras fingidas’, fulanos que têm sangue de baratas correndo nas veias. Igualmente, que parem nos quintos, de braços dados com o capeta, os boçais e cagarolas, que se julgam amordaçados, ou que preferem, na hora ‘H’ calarem seus bicos e silenciarem a voz, ao invés de abrirem o peito e liberarem todo o gás venenoso que corrói o íntimo.
Que sumam os covardes que se
negam a se livrarem, de vez, daqueles entraves presos sufocando as goelas,
impedindo que os direitos da livre expressão batam asas e a vontade de serem
autênticos enfraqueça ou se esgote, juntamente com o ilimitado arbítrio,
esbofeteando, a duros golpes, o bom senso, permitindo que o ridículo crie
forças e se agigante.
Resumindo: os atolados de
espírito que temem a censura e abaixam a cabeça diante da sua presença, que
enfiem o dedo no rabo e façam como o velho Abelardo Chacrinha Barbosa ensinava:
‘rodem, rodem, rodem, até o medo fazer biquinho e feder’. Pronto. Vomitamos as
substâncias nodosas que teimavam em fazer germinar os embriões de uma nova leva
de otários que, mormente aos anteriores, insistiam em permanecerem
enclausurados dentro de nossas almas.
Vamos abrir um parêntese para
detalharmos sobre nossos sonhos secretos e, no mesmo impulso dissertarmos sobre
as ‘tais aspirações maiores’ que se estendem aquém do simples gesto de
plantarmos uma árvore, escrevermos um livro e darmos vida a um filho. O que
seria, então, mais gratificante que o belo gesto de cultivar uma árvore? O que
daria mais prazer em escrever um livro, ou ter um filho?!
Com a árvore cuidaríamos para
que a natureza fosse preservada e mantida a zelo, e num futuro próximo nossos
descendentes respirassem um ar livre de impurezas. O livro legaria à
posteridade todas as experiências de uma trajetória de vida, com lições diárias
de um aprendizado meticuloso, sofrido na carne e sentido na pele.
E o filho? O filho perpetuaria
a espécie, propagaria a raça. Manteria viva a ramificação do tronco
genealógico. Imortalizaria a linhagem dos futuros consanguíneos que dele
surgissem tornando, sobretudo, imorredoura e perdurável a vitalidade da
estirpe.
Porém, tudo o que até agora
alinhavamos, serviria tão somente para levantarmos a moral decaída do cidadão
pacato, acomodado, tranquilo e idiotamente bocólisado. Jamais, para nós, que
pensamos adiante do que vislumbramos além do céu que nos contempla. Em nada do
que aqui elencamos, se situaria as ‘nossas aspirações’. Tampouco as nossas
‘fantasias de consumo’, as ‘raridades’ de um ser humano ‘trivialmente incomum
dentro do politicamente usual’. Não saberíamos explicar os ‘por quês de nos
assistirem honrarias que, de certa forma, excedem o impossível, sem querermos
parecer pedantes ou melhores que ninguém.
Ora, senhoras e senhores,
muitos certamente se perguntarão: se plantar árvore, escrever livro e gerar um
filho nunca fizeram e nem farão a felicidade dessa criatura pacata, que
pretende, afinal? Quais suas ânsias e ambições? Suas aspirações e cobiças, num
país onde prolifera o caos total e a anarquia dos baderneiros? A resposta é simples. O que almejamos é muito
comum e igualmente de facílima compreensão.
Talvez até mais corriqueira
essa compreensão, que a moral embutida no provérbio árabe citado no início de
nosso artigo. São, portanto, nossos desejos, livres de ornamentos
afrescalhados, elevados, porém, distintos e cheios de virtudes e
magnanimidades.
Oxalá, que desejos seriam
esses? Vamos lá. Primeiro desejo:
darmos uma escarrada bem dada no rosto do nosso querido presidente quando esse
infeliz vem a público com palavras ensaiadas engambelando os trouxas. ‘não
existe carestia, não existe inflação, não existe estado paralelo. O País está nos
trilhos, o real é forte como um touro, o fantasma do desemprego é pura intriga da oposição, a segurança caminha
impecável, o povo não passa fome, a seca do Nordeste foi dizimada e os
Zés-Dos-Anzóis esparramados por aí não
morrem nas mãos de bandidos e fora-da-lei’.
Segundo desejo: obrarmos (para aqueles que não sabem, ‘obrar’ é o
mesmo (que cagar, evacuar, bater uma laje, soltar um barro, passar um
telegrama) na Constituição Federal depois de mandarmos para o papo, uma boa
feijoada com tudo que tivéssemos direito. Essa suposta Lei Maior, essa porra de
Carta Magna que os grandalhões tanto dizem acatar, respeitar, estimar e
considerar, não passa de um conjunto de
deveres malsucedidos. Não trafega além de normas regulamentadoras de uma
instituição falida, fracassada, frustrada, mal gerada. Na prática, só existe bonitinha e
cheirosinha no papel.
Terceiro desejo: limparmos o traseiro emerdado (cheio de bosta) na
Bandeira Nacional, símbolo que outrora tremulava imponente com o verde das
nossas matas, o amarelo do nosso ouro, e o indiscutível azul do nosso infinito
e porque não, com o branco e sem manchas da paz que restou nodoada e manchada.
Esses seriam nossos três desejos.
Diante do que trouxemos à
baila, que atire a primeira pedra (e aqui fechamos o parêntese aberto) aqueles
pais de famílias, os assalariados, os aposentados, os pensionistas, os
policiais, os professores, os médicos, enfim, cada representante da sua
categoria, que aqui se veja ou se sinta enquadrado, como também aqueles pacatos
e singelos homenzinhos de vergonha e caráter, que não comunguem ou não
compartilhem conosco, da vontade doída e ardente que chega a dar cócegas nos
nervos, de realizarem (mesmo que depois apodreçam atrás das grades), com
regozijos plenos, essas três proezas.
Acaso alguém teria dúvidas em
responder se o brasileiro, de um modo geral é feliz? Se realmente se sentisse
despreocupado e alegre, por que nas festas populares as pessoas saem às ruas
caracterizadas de Bin Laden? Por que na malhação de Judas a população não castiga
a criatura que, segundo a Bíblia, teria traído Jesus? Por que ao invés dele,
malham os políticos?
Os jornais de todo o país
publicam, diariamente charges e comentários
que, se estivéssemos no tempo da ditadura, os seus autores estariam
vendo o sol nascer quadrado. Não queremos falar nos humoristas do antigo
Casseta&Planeta, da Rede Globo, a cada novo programa mostravam, com
estardalhaços cada vez mais achincalhantes a pouca vergonha dos nossos
políticos, bem como a falta de respeito pelos cidadãos comuns e, quando
mencionamos comuns referenciamos a
enorme legião de famintos, esfarrapados, humilhados e injustiçados que
sobrevivem nas periferias deste imenso rincão.
Nossos desejos representam,
pois, acima de tudo, a vontade desse povo sofrido, a consciência de uma geração
aflita, de uma plebe posta de lado, rejeitada, abandonada à sorte. Muitos não
falam porque temem os ‘rigores podres das leis’. A justiça é implacável com os
humildes, com os negros, com os favelados. Sabemos, por baixo dos panos, protege
os poderosos e acoberta as suas falcatruas. Vivemos num País onde o Chefe da
Nação sustenta que a justiça é uma caixa preta. Todos temos consciência plena de que a justiça é, de
fato, uma enorme caixa preta.
Mais especificamente, um saco
de gatos, um covil de malfeitores, um ninho de cobras. O Senhor Lula quando
brincava de presidente, dizia isso e
meia dúzia de figurinhas intocáveis o interpelaram através de processos
judiciais. Fizeram, aconteceram, espernearam e qual foi o resultado? Pizzas! Dilma
Roubousset também fez e aconteceu e não deu em nada. Agora Temer arma o jogo,
promete, despromete, e o cenário é o
mesmo de quinhentos anos atrás.
No Brasil, desde o
descobrimento, tudo acaba em pizzas. Sabores os mais variados. Pizzas servidas
em mesas enormes, regadas com muito vinho e pinga (pelo amor de Deus, nenhum
afronto aos ‘cachaceiros’ em serviço) bem ainda refrigerantes, para ajudarem a
descer melhor e não engasgarem nos gogós dos que pregam um moralismo deturpado,
inconsistente, sujo, nojento, lambrecado de repugnâncias mesquinhas e
desprezíveis.
Todos nós temos dentro do
coração um pouco de Bin Laden, de Bush, de Saddam, de Hitler, do motoqueiro do
parque, do bandido da luz vermelha, dos irmãos Cravinhos e das Suzane Richthofens
da vida. Adoraríamos, nem que fosse por um milésimo de segundo estarmos na pele
dos comandantes do PCC e outras facções para comandarmos o tráfico de dentro
dos presídios de segurança máxima, de podermos matar os desafetos, atearmos
fogo nos ônibus, atirarmos contra policiais, passearmos para cima e para baixo
em aviões da FAB e da Polícia Federal, cercados por fortíssimos esquemas de
segurança, tudo em nome dos nossos sonhos e desejos e, claro, o mais
importante, em nome da desmoralização, da esculhambação, dos estardalhaços e
atropelos do nosso Brasil sem porteiras.
Em igual trilhar, gostaríamos
de derrubar os prédios públicos de Brasília, ver transformado num monte de
escombros o Senado, a Câmara, os ministérios, os palácios suntuosos, as mansões
com seus terrenos a se perderem em metros quadrados, onde vivem as turminhas
dos intocáveis dos terninhos de grife, dos putatos (‘putatos’, a mesma coisa
que filhos da puta) de sapatos bem engraxados, dos que andam em carrões com
motoristas de quepes e luvas brancas, dos que transgridem os sete pecados
capitais multiplicados setenta vezes sete. Também nos faria um bem enorme
massacrarmos, nas pedradas, nos socos e pontapés, essas criaturas zelosas que
elegemos para cuidar dos nossos anseios e objetivos mais prementes.
Por extremo, acalentaríamos
mostrar a nossa outra face, a oculta, ou seja, aquela área sombria e
apavorante, a que não aflora porque o sistema coíbe, pune, prende, retalha.
Alguns dos senhores se
recordam de terem visto ricos nas cadeias? Deputados atrás das grades? Senadores da República prestando depoimentos
em delegacias? Por favor, apontem um só (tirando o Eduardinho Cunha)
personagem, um só do governo, ou ligado a ele, que esteja mofando no xilindró.
Em contrapartida, o homem do dia a dia, o infeliz, o Zé Bozó, o pretinho que
mora lá no alto da favela, com certeza, em algum cubículo, estaria pagando a
sua pena. Para ele a justiça existe.
Existe no sentido de fritar a sua carne e arrancar seus ossos.
Os que têm dinheiro, senhoras
e senhores, compram a liberdade, acoitados pela justiça, os que não têm, mofam
nas masmorras do Estado, e sofrem as piores penas de restrição à liberdade, ou
dito de outra maneira, a caixa preta, vem para cima deles como presente de
grego. Todos nós temos dentro do coração e isso é sempre bom repetir, repetir,
repetir, indefinidamente, um pouco de Bin Laden, de Bush, de Saddam, de Hitler,
e de todos os outros ilustres anarquistas e terroristas que deixaram marcas na
humanidade.
Gostaríamos de guerrear com as
coisas que estão erradas e fogem aos padrões legais. Afinal de contas, tirando
esses párias que vemos todos os dias por aí, que abundam no Epicentro Brasília
indagaríamos: essa gentalha serve para quê?
Será que esses nossos ilustres companheiros carregam, no peito, a
intenção de acabar com o amontoado lixo, com a podridão, com os ratos, as
lacraias e as baratas de esgoto?
Em paralelo, todos nós
adoraríamos fazer uma reforma, não da previdência, ou do judiciário. UMA
REFORMA no grande circo de palhaços que comandam o espetáculo, que tomam conta
do picadeiro. Uma reforma nos que escrevem os capítulos dessa novela chata,
repetitiva e agastada. Mudarmos os diretores, os roteiristas, os iluminadores,
os contrarregras.
Substituirmos o elenco de
artistas que já nos encheram bastante o saco e cujas fuças estamos cansados de
ver na telinha de nossos aparelhos de tevê e, pior, em horário nobre. No meio
dessa balbúrdia toda, meus caros, duas coisas são certas como a morte de Cristo
no Calvário e o continuísmo da podridão que nos assola:
1ª) querer nunca deixou de ser
sinônimo forte de poder e,
2ª) o brasileiro não pensa
forte, não é decidido não vai à luta. Acostumou há tempos, trocar seu voto por uma cesta básica e a
vergonha pelo pagamento de uma conta de luz.
Enquanto essa reforma política
(que tanto alardeiam os safados e ladrões que vivem na Capital Federal) não se
realizar - primeiramente na cabeça de cada cidadão de bem, de cada homem
honrado que não tenha sangue de veado com prostituta nas veias, evidentemente
acompanhada de uma CPI do Bom Senso, o Brasil que vemos aí - continuará ao deus
dará, ao salve-se quem puder. Um quadro lastimoso que, a cada dia, nos trará à
memória uma frase bastante oportuna (mencionada aqui em outros artigos) da
Revolução dos Cravos, acontecida em 1974. ‘TODO O PODER ÀS PUTAS, QUE SEUS FILHOS
JÁ LÁ ESTÃO’.
AVISO AOS
NAVEGANTES:
SE O FACEBOOK, PARA LER E PENSAR, CÃO QUE FUMA OU OUTRO SITE QUE REPUBLICA
MEUS TEXTOS, POR QUALQUER MOTIVO QUE SEJA VIEREM A SER RETIRADOS DO AR, OU MEUS
ESCRITOS APAGADOS E CENSURADOS, PELAS REDES SOCIAIS, O PRESENTE ARTIGO SERÁ
PANFLETADO E DISTRIBUIDO NAS SINALEIRAS, ALÉM DE INCLUI-LO EM MEU PRÓXIMO LIVRO
“LINHAS MALDITAS” VOLUME 3.
Título, Imagens e Texto: Aparecido Raimundo de Souza, jornalista, São Paulo, 17-1-2017
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