Maria João Marques

Apesar do tema pesado, o livro
está bem escrito e permite uma leitura fluída. E, sendo um livro de História de
um académico reconhecido, é também uma viagem ao absurdo e não se consegue ler
sem esboçar uns tantos sorrisos de incredulidade. A adopção de métodos
agrícolas não científicos mas ideológicos (porque as adoptadas pelos camponeses
e testadas pelo tempo eram métodos direitistas indignos de um país socialista)
que levaram a uma quebra na produção agrícola. As fundições nas traseiras que
permitiriam que a China produzisse mais aço do que a Grã-Bretanha em quinze
anos (e, depois, em três ou quatro), que consumiu todos os produtos metálicos
das zonas rurais, incluindo as ferramentas agrícolas (ooops), desviou milhões
de camponeses dos trabalhos nos campos para as fundições e que terminou com
quebra abrupta na produção agrícola e produziu toneladas de aço de má qualidade
não usável. As colossais obras de irrigação feitas à pressa e em locais errados
que findaram abandonadas ou com efeitos contrários aos inicialmente planeados,
com destaque para a barragem que iria tirar o lodo ao Rio Amarelo mas levou a
que o lodo duplicasse. Um regime comunista a usar os camponeses como trabalho
escravo (sem comida, sem horas de descanso, sem acomodações adequadas ao clima,
sem cuidados médicos, com espancamentos, com humilhações públicas…) nas obras
de irrigação, nas comunas agrícolas ou nas fundições matando, por esta via,
milhões de camponeses.
As sucessivas rondas de purgas, que puniram sobretudo os
quadros do PCC (Partido Comunista Chinês) que tentaram proteger as populações
dos efeitos das políticas do Grande Salto em Frente e aqueles que denunciaram a existência de fome generalizada quando o
topo do PCC considerava a situação excelente e as mortes ocorridas ‘uma lição
com valor’, destacando-se o purgado ministro da defesa Peng Dehuai (que
morreria, ainda como castigo por ter falado verdade em 1959, durante a
revolução cultural). A protecção da imagem internacional da China, doando
toneladas de alimentos a países como a Albânia enquanto nos campos a fome
matava a eito. As sempre “sábias” citações de Mao, ora questionando-se sobre
que destino daria aos excedentes que o GSF produziria, ora exortando os
camponeses chineses (famintos) a tornarem-se vegetarianos para que se pudesse
exportar a carne chinesa, ora afirmando que mais valia que metade da população
morresse para que a outra metade tivesse a sua porção de comida. Os elaborados
esquemas que levaram à criação de um complexo mercado de sucessivas trocas
directas, etc., etc., etc.. E, claro, as mortes. Está tudo no livro de
Dikotter, que recomendo vivamente.
![]() |
Imagem: Wang Bing |
Título e Texto: Maria João Marques, O Insurgente
Mao’s Great Famine
“Between 1958 and 1962, China
lived through tragedy on an epic scale. The “Great Leap Forward” – conceived by
Mao so that China could drive industrial output ahead of Great Britain and
achieve autonomy from the might of the neighbouring USSR – led to a
catastrophic famine resulting in the death of between 36 and 55 million people.
“Three years of natural
disasters”: it is in these terms that the Chinese Communist Party today
justifies this terrible outcome. But the tragedy was masked by an official lie,
because while China was starving to death, the grain stores were full.
Based on previously unheard
testimony by survivors, rare archive footage, secret documents and interviews
with the leading historians on this catastrophe, this film provides, for the
first time, an insight into the folly of the “Great Leap Forward”. It examines
the mechanisms and political decisions that led to famine, stripping away the
incredible secrecy surrounding the campaign, and exposing the lie which
continues even today as to who was responsible, and the true human cost.”
Vídeo: docoman86
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Não publicamos comentários de anônimos/desconhecidos.
Por favor, se optar por "Anônimo", escreva o seu nome no final do comentário.
Não use CAIXA ALTA, (Não grite!), isto é, não escreva tudo em maiúsculas, escreva normalmente. Obrigado pela sua participação!
Volte sempre!
Abraços./-