Luciano Henrique
Se há um tema que já citei
várias vezes e para o qual não fiz ainda um texto detalhando-o é este: o
pragmatismo político. Como consequência, já fui mal compreendido diversas
vezes. Por isso é hora de tratar o pragmatismo político.
Aqui está uma boa definição,
que não tem como pretensão encerrar a discussão: “a ação política orientada
principalmente a resultados, ainda que orientada por princípios e valores
sólidos”. Isto é, não significa que o pragmático não tem valores, mas que
busca “negociar” em prol de ações que gerem resultados contínuos que, pouco a
pouco, vão se encaixando com nossos princípios e valores.
O pragmatismo político seria
oposto ao purismo político. E, para esclarecer um ponto essencial
(antes que os mais puristas fiquem ofendidos), tanto pragmatismo como purismo
são questões de grau. Ninguém é 100% pragmático e ninguém é 100% purista. Mas é
muito fácil definir quem tende mais ao pragmatismo que ao purismo, e
vice-versa, como diria o ex-atacante Jardel, do Grêmio.
Vejamos um exemplo óbvio. É
fácil definir o PT como um partido essencialmente pragmático, especialmente
pelas alianças que fez. E isso é respaldado por uma multidão de petistas
militantes que também são pragmáticos.
Hoje temos muitos petistas
reclamando a torto e a direito da indicação de Kátia Abreu ao Ministério da
Agricultura. Mesmo reclamando, quase todos os petistas não abandonarão o
partido. Longe disso, eles irão pressionar o PT como se estivessem em uma
negociação. Quase que dizendo: “Ok, vocês querem nomear Kátia Abreu. Então
queremos (x)”. Tal comportamento é pragmático até a medula.
À medida que víamos petistas reclamando
do próprio PT enquanto faziam pressão positiva (e construtiva), era possível
observar alguns leitores de direita reclamando de meu apoio ao PSDB,
dizendo coisas como:
·
O PSDB não reclamou das urnas eletrônicas, então
está mancomunado com o PT
·
O PSDB assinou o Pacto de Princeton, logo é
“brother do PT”
·
O PSDB aprovou conselhos soviéticos recentemente
em São Paulo
· Aécio Neves e Aloysio Nunes não votaram contra a
Lei do Calote (nota: é claro que não, pois eles estavam obstruindo a votação)
·
O PSDB não quis o apoio de Jair Bolsonaro
·
O PSDB votou pelo Marco Civil
E a lista pode seguir ad
aeternum e sempre é preenchida por diversas fontes. As demandas são
diversas e até díspares entre elas:
·
Pedidos de desistência dos políticos em geral
para pedidos por intervenção militar
·
Pedidos de desistência da democracia por
soluções diferentes e “inovadoras”
·
Pedido de desistência do PSDB para votar em Jair
Bolsonaro para presidente em 2018
·
Pedido de desistência do PSDB para focar talvez
no DEM mas preferencialmente no NOVO
·
Pedido de desistência do PSDB e do DEM para
focar no NOVO
·
Pedido de que todos adotem o niilismo político
·
Pedido para que todos fujam do Brasil
Só que isso não é novidade e
também existe do lado de lá. Veja o texto Política e Fé, de André Falcão, publicado no Pragmatismo
Político (blog petista):
Tenham dó! Política não é
profissão de fé, tampouco fé tem alguma coisa a ver com política ou o que mais
da vida mundana. No exercício da minha fé em algo que acredito ser Maior — a
que, particularmente, chamo Deus —, peço-Lhe, entre outras coisas (sou nada
econômico nesse quesito, diga-se), para me dar compaixão, generosidade, saúde,
luz, tolerância, humildade, coragem, força, fé. No exercício da luta política,
que já é naturalmente outra coisa, esforço-me por um mundo melhor, com as armas
que acredito sejam as possíveis e, dentre essas, as melhores. É simples assim.
Vez por outra sou abordado por
gente dizendo-se decepcionada porque “acreditava” no PT, e em Lula, até
em Dilma (apesar de muitos a terem considerado um poste; poste de muita luz,
diria eu), mas que agora estaria estarrecida com a roubalheira que estaria
sendo patrocinada por aquele partido, de que é exemplo mais recente a Lava-Jato e,
mais famoso, o Mensalão.
É, pois, o momento de pelo menos exercitar a tolerância, a compaixão e a humildade
concedidas.
Política não
é profissão de fé! Quando muito é mera fonte e arcabouço de expectativas.
Expectativas não são pra quem quer ter, mas pra quem pode. Expectativas ajudam
a viver, mas são terríveis quando frustradas. E elas não raro o são porque a
gente não sabe lidar com elas, já que toda expectativa pode trazer em si mesma
dolorosa frustração, mais culpa nossa do que dela.
Porém, até pra tolice há
limite. Sabe-se que os desvios de dinheiro público — notadamente aqueles para
proveito particular — não são privilégio dos governos do PT ou de seus aliados.
E você sabe que por mais que existam padres pedófilos, tarados ou predadores da
fortuna do Vaticano; empresários corruptores, sonegadores, escravagistas e
exploradores da mão-de-obra; milicos assassinos, covardes, torturadores,
ladrões; juízes vendedores de sentença e da própria alma, não se pode
confundi-los com a Igreja Católica, com o empresariado inteiro, com nossas Forças
Armadas, tampouco com o Poder Judiciário. E ao que se saiba, você continua
catolicozinho-da-silva…
Você sabe. Então, se por
tolice você se diz decepcionado e desacreditado, receba essas palavras e minha
compaixão. Depois analise, leia, investigue, acresça outras leituras às suas já
costumeiras (e parcialíssimas) fontes de manipulação. Mas se o que você quer
mesmo é arranjar um pretexto pra estar do lado do que de pior existe na
política, faça “bom” proveito.
Eu não concordo com a ética
petista, e sei que as argumentações de defesa do PT, usadas por Falcão, estão
mais furadas que tábua de pirulito. Mas a argumentação dele em prol do
pragmatismo político está correta. De acordo com o sistema moral dele, é
razoável que ele apoie o PT.
Ele definiu suas prioridades,
e sabe que há “titãs” na política, que hoje são o PT e o PSDB. De acordo com
suas prioridades e objetivos, ele sabe que tratar PT e PSDB “como se fossem
farinha do mesmo saco” prejudicaria os seus interesses. Ele é bem claro e até
agressivo ao tratar os mais puristas como pessoas querendo “arranjar um
pretexto pra estar do lado do que de pior existe na política”.
Para o purista, é muito fácil
sentenciar que “não há diferenças entre opções (x) e (y) ”, mesmo quando essas
duas opções não são viáveis. Porém, quando olhamos planos, consequências,
habilidade, alinhamento com coletivos não-eleitos, etc… sempre vemos que não dá
para supor essa similaridade de opções.
Ainda que eu não tenha o PSDB
como o partido preferido, vejo que a mente purista tende a descartá-los de uma
vez por todas. A partir daí, quando perguntarmos quais os próximos passos
para as próximas votações, quais as ações de pressões a serem exercidas e qual
a carga de esforço na comunicação com os partidos, sempre em direção
de irmos obtendo resultados, não vejo respostas concretas, apenas
manifestações vagas sem conexão com resultados.
No fim das contas, aquele mais
focado no purismo sempre irá arrumar algum motivo para não tomarmos nenhuma
opção dentre aquelas mais próximas a nós. Os mais pragmáticos serão muito mais
críticos nas alegações tentando igualar duas opções.
Eu, como pragmático, defendo
que devemos ter objetivos, e entendo que os próximos objetivos devem ser
derrubar os projetos totalitários do PT. Voto pela criação de uma completa
rejeição social a esses projetos, conversando com as pessoas a respeito dos
danos que isso pode causar. Assim, a derrubada do Decreto 8243, se ocorrer,
será uma conquista em relação a esse objetivo maior (salvar a democracia
brasileira). O pronunciamento de um deputado do PSDB, do DEM ou mesmo do PMDB
ou do PP, contra um projeto de censura de mídia é também um resultado. Ou seja,
existem sempre possíveis resultados em direção a objetivos. E adianto para
dizer que isso não exclui o fato de que eu acho a possível aprovação do NOVO
uma das ideias mais interessantes da política nacional.
Alguém defende outro objetivo?
Ok, que o faça. Mas que o apresente à mesa para discussão, sempre pautada em
resultados, de preferência que sejam factíveis e rápidos de serem conseguidos.
Isso é pensar pragmaticamente. Dessa forma, eu não quero reduzir o pragmatismo
às minhas demandas, mas até mesmo abrir a discussão para outras solicitações,
diante de outros objetivos (desde que distantes dos objetivos do PT,
evidentemente), mas sempre com o foco em resultados.
Foi com esse tipo de foco que,
mesmo tendo sido um crítico forte das alternativas escolhidas pelo Revoltados On-line,
os elogiei pelos resultados (materializados na pressão lançada sobre o PT
e seus aliados, mesmo com a aprovação da Lei do Calote) das manifestações
diante do Congresso.
Hoje em dia os petistas são
muito mais seletivos no momento de afirmar “tanto faz um quanto faz outro”.
Eles sabem que, independente de alguma insatisfação com o PT, eles tem um
objetivo, um caminho, e precisam escolher dentre as opções.
O pragmatismo entre os
petistas é muito maior do que em qualquer outro partido. Entre os adeptos da social-democracia,
também há algum pragmatismo. Entre os direitistas, no entanto, é possível notar
o ainda emergente interesse por posições mais pragmáticas. Um exemplo foi a
manifestação do dia 06/12, com uma agenda muito mais inclusiva do que seria de
se esperar de uma direita mais tradicional.
A demanda por um pragmatismo
na direita existe. É um fato. Os puristas devem aprender a conviver com
isso, pois, dialeticamente, a visão pragmática não exclui os puristas, mas
dialoga com eles.
Em tempo: qual o meu partido?
Eu não tenho nenhum, mas tenho gostado muito das posturas mais incisivas de
Aécio, Aloysio e outros do PSDB, embora esteja muito decepcionado com Alckmin.
O pessoal do DEM tem me surpreendido ainda mais. E estou empolgado
para ver o surgimento do NOVO, pois é dali que parecem surgir novidades.
Se alguém não concordar,
dizendo que o PSDB deve ser “abandonado” em prol de alguma outra coisa, eu,
como pragmático, ficarei muito feliz em ouvir alternativas. Pragmaticamente, é
claro.
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