Paulo Hasse Paixão
O jornalista
independente Glenn Greenwald resumiu na semana passada a forma como
as falsas narrativas da imprensa corporativa são formadas e disseminadas, e
que, enquanto os jornalistas que questionam o processo acabam por ser um alvo
de destruição pelos poderes instituídos, aqueles que mentem são recompensados
pelo sistema.
Durante uma emissão do seu “System Update” na
semana passada, Greenwald observou assertivamente:
“Os jornalistas que
divulgam as teorias da conspiração que a CIA quer que sejam divulgadas são
promovidos e os jornalistas que questionam as teorias da conspiração da CIA são
destruídos.”
E de seguida, insistiu:
“Não é interdito ao
jornalismo corporativo americano espalhar histórias falsas e teorias da
conspiração. De facto, é a única forma de prosperar na imprensa. As pessoas que
mais mentiram e que mais espalharam teorias da conspiração são as que são
promovidas e que enriqueceram através do jornalismo.”
Glenn Greenwald highlights the irony of the editor-in-chief of The Atlantic being the journalist primarily responsible for deceiving the American public into the Iraq War:
— KanekoaTheGreat (@KanekoaTheGreat) May 23, 2023
"Let's remember that the journalist who did the most to convince Americans of the vital lie that Saddam… https://t.co/NzCOx584DT pic.twitter.com/sEXY59inmJ
É por isso que é livre para
dizer isto:
“Desde que as teorias da
conspiração que um jornalista dissemine e as histórias falsas que publica
estejam alinhadas com o que a CIA, o Pentágono e todo o resto dos media
corporativos, ele ficará bem. De facto, ficará melhor do que bem. Vai receber
todo o tipo de recompensas”.
Referindo-se à reportagem de
Seymour Hersh, já documentada pelo
Contracultura, sobre a responsabilidade direta dos EUA na destruição do
gasoduto russo Nord Stream, que o veterano e prestigiado jornalista afirma ter
sido uma operação montada pelos serviços secretos norte-americanos, Glenn
afirmou:
“O que não se pode fazer,
foi o que Hersh fez e que o levou a ser expulso do jornalismo, é divulgar as
chamadas teorias da conspiração que são contra a narrativa das forças de
segurança dos EUA, que prejudicam a política externa dos EUA. Essa é a única
coisa que é proibida. É isso que faz com que sejas expulso do jornalismo”.
Mais à frente, Greenwald
ilustrou as suas legítimas acusações com o comportamento de apparatchik do
editor-chefe do The Atlantic, Jeffrey Goldberg:
“Fez mais do que ninguém
para espalhar as falsas teorias da conspiração que levaram à Guerra do Iraque,
e às fraudes do Russiagate.
Foi depois recompensado como resultado das mentiras que publicou em nome dos
serviços de segurança dos EUA”.
Num outro episódio do seu
programa no Rumble, o jornalista aprofundou a análise do lamentável estado do
jornalismo americano, demonstrando simultaneamente que não se trata de um
fenómeno novo, recorrendo ao caso dos ataques com Antraz a gabinetes do governo
federal em 2001, que foram completamente manipulados em função de uma narrativa
imposta pelo Pentágono, pela CIA e pelo complexo militar-industrial americano,
com a ativa colaboração dos media.
“As pessoas na CIA, no FBI
e no Departamento de Segurança Interna sabem que podem mentir aos media de
propósito e impunemente, porque são protegidas pelo anonimato. Mesmo que se
saiba que mentiram, os meios de comunicação social protegem estes mentirosos,
pessoas que estão a enganar a América de propósito através da utilização das
suas plataformas de comunicação social.”
Vale a pena ver este monólogo
de Glenn Greenwald:
A ironia de tudo isto é que,
às páginas tantas, as únicas teorias da conspiração que se comprovam falsas são
aquelas veiculadas pela imprensa corporativa, que ao mesmo tempo se apresenta
como verificadora de factos e adversária da ‘desinformação’. Ao contrário, as
teorias da conspiração libertadas por aqueles que se recusam a alinhar com as narrativas
regimentais mostram-se amiúde, e muitas vezes de forma até assustadora,
completamente corretas.
Comparados com um noticiário
da CNN, qualquer post do 4chan, qualquer página do Reddit, qualquer grupo do
Facebook, constituirão, muito provavelmente, conteúdos informacionais mais
fidedignos.
E o que é mais: a esmagadora
maioria das pessoas que publicam ou partilham falsos factos na web fazem-no
involuntariamente, por ignorância ou credulidade. O impacto destas mentiras é
grupal, no máximo. Estas pessoas não têm credibilidade, nem poder, nem
audiências para alterar seja o que for no grande esquema das coisas. A imprensa
corporativa, ao contrário, sempre que mente fá-lo em plena consciência da
vilania. Mente de propósito. Mente com fins políticos. Mente para mudar o
mundo. E ao serviço daqueles que o querem transformar num inferno.
E é assim.
Título e Texto: Paulo Hasse
Paixão, ContraCultura,
31-5-2023
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