terça-feira, 27 de fevereiro de 2024

[Aparecido rasga o verbo] Poeira em alto mar

Aparecido Raimundo de Souza

AS VELAS ENORMES rechinavam, como se temessem o desafio do vento pesado e traiçoeiro que soprava sem dó nem piedade. O veleiro, um gigante de madeira e ferro, cortava as águas revoltas do oceano incomensurável. A tripulação, com olhos cansados de medo e angústia, as mãos calejadas de tantos anos encarando águas inquietas e conturbadas, enfrentava a imensidão azul daquele mundo de horizonte incerto com coragem e determinação. Havia, entretanto, algo mais forte no ar, além do cheiro de maresia e do balanço constante e tresloucado. Se fazia hiante uma poeira fina, quase imperceptível, um pó que se infiltrava em todos os cantos do navio.  

Os marinheiros a chamavam aquele evento de “poeira vinda dos confins do reino de Poseidon.” Poseidon, segundo a falsa meteorologia, perdão –, segundo os livros enganosos de história, se fazia conhecido também por Netuno (filho de Cronos, “Rei do Tempo” e da sua bela e esfuziante esposa, a estonteante “Réia (sem “Gono”), ou a “Deusa da Fertilidade”.) A tal poeira acima citada, provocava uma inusitada cerração que se erguia das profundezas, como se o próprio oceano estivesse exalando a sua alma em cubos de vapores espessos, o que aliás, daria no mesmo. O fato real, é que ninguém sabia ao certo a origem daquela poeira de camada fina tipo cocaína.

Alguns dos presentes diziam que não se tratavam de partículas de sonhos perdidos. Outros acreditavam que o troço não ia além de fragmentos de histórias esquecidas de velhos livros sobre piratarias dos tempos de Johnny Depp. Mas todos concordavam num ponto, ou seja, que aquela (poeira) trazia consigo um mistério meio que impérvio. Não um “secreto,” de deixar todo mundo doidão, vendo, por exemplo, as caravelas de Pedro Álvares Cabral transportando um Lula cagando Brasil em golfadas, como se expelisse uma canja de galinha estragada numa bacia de privada sem descarga), apenas uma sensação de que algo maior acontecendo mais para lá do que poderia ser alcançado “Além do horizonte,” bailando, aos propósitos saborosos daquela melodia cantada pelo Roberto Carlos.

Bruna Surfistinha, a jovem marinheira que se escondia sob roupas largas e cabelos encaracolados, sentia o pó como uma atropina agindo em toda a sua pele de bronzeado perfeito. Ela olhava para o céu estrelado, imaginando o que estaria ocultado das ondas que se quebravam contra o casco do imponente “Poderoso.” (“Poderoso” é bom que se esclareça, não outra coisa senão o nome de batismo do veleiro.) “Poderoso” lembrava a ela, uma monóxila –, aquela canoa de pau único, embora a sua história relatasse acúmulos de gostos por “lascas” capazes de tirarem qualquer cristão do sério. Apesar dos pesares, seu coração pulsava em compasso “descadenciado” com o abalo sísmico das águas insondáveis. A beldade se perguntava se algum dia encontraria respostas objetivas para as suas próprias metonímias.

Gelmar Boca de Sapo, o imediato de olhos profundos e sorriso enigmático (lembrava o falecido Mendes.) Esse sujeito, de uma forma mais STF, sentia a presença da poeira. Ele observava Bruna Surfistinha de longe, admirando a sua coragem e determinação. Sabia que aquela moçoila de dotes pecaminosos escondia segredos, assim como ele próprio. Talvez a “sujidade oriunda de alto mar” formasse o elo de ligação que os unia, uma aliança invisível que transcendia os dedos das mãos, não somente no sentido de tempo e espaço. Enquanto o veleiro avançava, a imundície se tornava mais densa. Bailava nos moldes das guerras Israel–Lamas (perdão, Hamas), apelidadas carinhosamente de Israel–Gaza–Israel–Palestina–A Puta que Pariu–Ucrânia.

Por conta, todos os marinheiros, sem exceção, tossiam e esfregavam os glóbulos oculares, como se tentassem afastar algo que não podiam ver. E então, três dias depois, exatamente à meia noite em ponto, noite de lua cheia, o inesperado aconteceu. Um forte clarão iluminou todo o convés, lançando Bruna Surfistinha e Gelmar Boca de Sapo ao chão. Quando abriram os esbugalhos, estavam em uma ilha deserta, cercados por palmeiras e areia branca. O cisco soprado do mar encarniçado os havia levado para lá, como se tivesse escolhido aqueles dois corações perdidos para desvendarem seus mais intrincados segredos. No centro da ilha, um cidadão que atendia pelo nome de Robinson Cruzoué Deuofora os recepcionou.

Robinson Cruzoué Deuofora com o passar dos dias, revelou aos novos amigos, que havia uma grana enterrada escondida numa determinada parte daquela porção de terra cercada por águas de feições fleumáticas. Se não lhe falhava a memória, ouvira, na voz de um papagaio tagarela que se tratava de uma fortuna desviada do Fundo Penitenciário do Presídio Fedemal (desculpe, Federal) de Segurança Máxima, conhecido hoje como o Parque de diversões de Mossoró, no Rio Grande do Norte. Bruna Surfistinha e Gelmar Boca de Sapo se olharam espantados, sabendo, todavia, que aquela seria, ou pelo menos parecia se ajustar com a resposta que tanto buscavam.

A tal “bufunfa” –, a que Robinson Cruzoué Deuofora fizera menção, havia desaparecido pelo fato de, pelo tempo em que ele vivia na ilha, a sua mente envelhecida não lhe deixava prognosticar com o lugar certo onde a “baba” havia sido enterrada. Por assim, entre suspiros e risos, Bruna Surfistinha e Gelmar Boca de Sapo, dia seguinte bem cedo se puseram em marcha em busca ferrenha da tal sacola, desafiando o sol escaldante, e, de roldão, alguns espertalhões que também haviam sido trazidos pela névoa inexplicável, entre eles dois possíveis suspeitosos, um tal de “Tatu–Carapaça” e “Deisinho–Tromba de Elefante.”  A dita “coisa em alto mar” ou “escrevinhado” de forma mais elogiosa, a “poeira” os guiou até a longínqua ipuã.  Por sorte de Bruna Surfistinha e Gelmar Boca de Sapo, os facínoras Tatu–Carapaça e Deisinho–Tromba de Elefante rumaram para lados opostos e se infiltraram por outras bandas.

Todavia, foi o amor de Bruna Surfistinha pelo pançudo Gelmar que os manteve juntos, unindo as suas histórias para sempre naquela ilha abandonada no meio do oceano. Quando finalmente encontraram o local exato, Bruna Surfistinha olhou para um ponto na amplidão, onde as ondas quebravam em espumas brancas. Ela sabia que o seu presente estava entrelaçado ali, justamente naquele lugar mágico onde a poeira repentina se misturava com o sal do mar. Com um sorriso nos lábios, ela se entregou à Gelmar Boca de Sapo, tendo Robinson Cruzoué dormido essa noite ao relento, exatamente por ter emprestado a palhoça.

Bruna Surfistinha, em agradecimento ao evento que lhe acontecera de modo casual e extemporâneo, três meses longe de qualquer tipo de civilização, se ajoelhou junto com seu amor e o saco de dinheiro debaixo de uma “Pata de Vaca” (árvore da família da Bauhinia Variegata). Compenetrada, fez uma oração, e, ao final dela disse, os olhos cheios de lágrimas:

“Obrigada, minha querida poeira em alto mar. Agradeço por nos trazer a este lugar tão especial, e, sobretudo, por nos dar a esperança do encontro de nossas almas em festa meu e deste (abaixou a voz e sussurrou para que ele não a ouvisse) deste merda do Gelmar Boca de Sapo, num mesmo pensar. Seria melhor se fosse o Flávio Pino de Dentadura, mas na falta de um prato mais suculento, vai este sujeitinho chato mesmo.”

Antes de fazer o sinal da cruz e se levantar, acrescentou, enquanto abraçava o mais novo dono do seu esqueleto, o barrigudinho Gelmar:

“Eu tinha certeza que um dia, chegaríamos aqui e o senhor, meu Pai Maior me daria, como de fato me presenteou com o amor verdadeiro, o amor que agora me vejo envolta em seus braços. Por favor, meu Deus de Todo Sempre, me permita, mais –, antes de ir embora deste lugar que me deixou rica, arranjar um cobertor de orelha para o Robinson. Repare nele. A criatura vive triste, cabisbaixa, pensativa –, que apareça por aqui um Daniel, não um metido a senhor do pedaço, mas um gato machão, um apessoado de “para choque duro,” que lhe tire da secura, que lhe bote para cima e que o faça verdadeiramente se sentir uma mulher no cio, de verdade.” Em seguida, entraram num helicóptero particular que, de passagem voando baixo pela ilha, resolveu dar uma paradinha e depois seguiu viagem.  

Título e Texto: Aparecido Raimundo de Souza, da Lagoa Rodrigo de Freitas, no Rio de Janeiro, 27-2-2024  

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3 comentários:

  1. ESCLARECIMENTO NECESSÁRIO:
    Na crônica acima, faço referência a fatos importantes. O Daniel, por exemplo, não outro senão o escritor Londrino DANIEL DEFOE (1660-1731) e seu famoso "As AVENTURAS DE ROBINSON CRUZOÉ," e seu estonteante romance publicado pela Editora L&PM POCKET, de Porto Alegre. Os suspeitosos espertalhões que vieram juntos, para a ilha, não outros fugitivos da Prisão de Segurança Máxima da Polícia Federal de Mossoró, os sujeitos Rogério da Silva Mendonça e Deibson Cabral Nascimento. Até o presente momento estão dando um banho de perícia e esperteza na Polícias Federal e Civil, daquele Estado, bem como em toda as tropas de soldados postas em seus calcanhares, como em paralelo um cardume de cachorros da raça Robalo treinados em Caetés, na psicodélica Pernambuco, além de drones espiões, helicópteros com sensores para cabritos com caganeiras, aviões da Força Aérea Brasileira que são tão rápidos que conseguem chegar em qualquer lugar antes mesmo de deixarem o solo. Também na cola dos fugitivos, o destemido He-Man, o poderoso Super Homem, o Batman e Robin, o Falcão Negro, o Zorro, O Homem de Ferro, a Mulher Maravilha, a destemida Xena, a Princesa Guerreira, o curioso Sherlock Holmes e seu amigo, o inseparável doutor Watson, o The Flash e até o engraçado e criativo Tenente da polícia de Los Angeles, Peter Falk, o (Columbo), um detetive porreta que vai ao ar toda segunda feira as vinte e duas horas, pela Rede Brasil de Televisão. Bruna Surfistinha e Gelmar Boca de Sapo, dispensam comentários. Até onde sei, já prenderam várias pessoas que ajudaram Rogério e Deibson, sendo eles um casal de Porcos que cantavam nas dependências do Terminal Rodoviário de Mossoró, na Estrada do Contorno, um Camaleão conhecido como "Zoião", uma girafa de pescoço esticado que vigiava a entrada e a saída do aeroporto de Mossoró, o aeródromo Dix-Sept Rosado que depois da fuga, (mudou de cor, agora está vermelho de tanta raiva) além de um bando de gatos e gatas abandonados de becos estranhos que resolveram procriar dentro das dependências do presídio, e pasmem, nada mais, nada menos que 6.300 moradores de rua e desocupados que passaram perto do presido dois dias antes da fuga espetaculosa. Até agora os buracos por onde os dois se evadiram, não foram ouvidos, tampouco o alicate. A policia deve ouvir à portas fechadas os cadeados que guarneciam os acessos principais de acesso ao Cadeião.
    Aparecido Raimundo de Souza
    da Lagoa Rodrigo de Freitas, no Rio de Janeiro

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  2. Vc é uma gracinha. Amo vc até as ilhas de Cruzzoé. Bom texto.

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  3. Obrigado luzia. Gosto das duas intervenções. Amo você tamvem. Fica bem e em paz.
    Aparecido Raimundo de Souza
    Da Lagoa, Rio de Janeiro.

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