sábado, 17 de fevereiro de 2024

O meu voto vai para…

Telmo Azevedo Fernandes

O meu artigo de hoje para a coluna da Oficina da Liberdade no Observador pode ser lido aqui ou na transcrição abaixo.

Estou convencido de que uma esmagadora parte do eleitorado de Direita deseja um resultado das próximas eleições legislativas que permita cumprir três grandes objetivos:

·        Tirar o PS do poder.

·         Manter o PS afastado do poder.

·         Reduzir a intervenção do Estado nas nossas vidas.

A questão é que entre os não-socialistas nem todos concordam com os melhores caminhos para que estas vontades se concretizem. Ainda assim, será consensual neste campo político a constatação de que para impedir Pedro Nuno Santos de ganhar as eleições e afastar o PS do poder por tempo higienicamente recomendável, importa desde logo convencer os Portugueses a fazerem opções eleitorais que retirem o maior número possível de votos ao PS e que sejam criadas condições que permitam a manutenção de um governo de Direita cuja sustentabilidade política seja tanto mais facilitada quanto maior for o universo de eleitores que o suporte.

Por mim, gostaria que a Direita se afirmasse simultaneamente com medidas consistentes para redução de despesa pública e com uma postura que não cedesse ao wokismo ou ao desenho da sociedade por via legal. Mas para este desiderato não vislumbro no atual panorama partidário qualquer agremiação que mereça o meu voto.

Contudo, first things first, e baseando-me nos dados de uma recente sondagem política elaborada pela Universidade Católica (UCP) e na minha própria análise da dinâmica eleitoral, concluo que para tirar o PS do poder o ideal é que cresça o abstencionismo dentro das hostes socialistas e diminua no campo não-socialista. Segundo a UCP, mais do que a Aliança Democrática (AD), é a Iniciativa Liberal (IL) e o Chega (CH) que vão buscar votos à abstenção. Verifica-se também que, hoje, a maior transferência de votos socialistas (do PS em 2022) para Direita, tem como destino a AD e o CH, por esta ordem. Sucede que tanto o CH como IL tiram relativamente mais votos à AD do que ao PS, mas apesar de tudo o CH tira mais votos ao PS do que a IL. Aliás, a IL não tira votos ao PS, segundo o relatório da Católica. O voto na IL apresenta-se assim como “inútil”.

Por outro lado, embora não bem formuladas, das perguntas usadas pela UCP para sondar os inquiridos sobre quais os arranjos parlamentares e de governo melhores para o país pode inferir-se que o eleitorado AD tem clara preferência por um governo minoritário com apoios à sua Direita. A abertura para negociar que o eleitorado AD sugere dá, no entanto, primazia à IL, mas não rejeita alargar conversações ao Chega se necessário for para a maioria parlamentar. Ou seja, aparentemente o «não-é-não» é uma linha mal sintonizada com as preferências do eleitorado da Aliança Democrática.

Claro que para aumentar a probabilidade de a AD vencer as eleições em vez do PS, nada como votar na coligação. Apesar do facto de, infelizmente, as políticas do PSD e PS não serem substancialmente distintas, já seria positiva a mudança de protagonistas e de decisores políticos. Se bem que Luís Montenegro garante alguma dignidade institucional, coisa que não acontece com Pedro Nuno Santos.

Mas quem como eu viu a intervenção de Paulo Portas na apresentação da coligação e os entusiasmados aplausos dos dirigentes da AD aos dislates desprezíveis, mentirosos e repugnantes que nesse momento ecoaram na sala, sente-se moralmente impedido de colocar na urna um voto numa agremiação que tem uma criatura politicamente sórdida como sua eminência parda e que durante dois anos foi um dos mais destacados evangelistas de uma sociedade fascisto-sanitária, bio-totalitária, repressiva, segregadora, permissiva de abusos de poder de toda a ordem e privadora das mais elementares liberdades e direitos básicos das pessoas. Ainda para mais, sendo eu eleitor no círculo do Porto, torna-se visceralmente impossível votar no respectivo cabeça de lista da AD, por razões semelhantes.

A Iniciativa Liberal seria à partida a minha escolha pelo mal menor. O seu cabeça de lista revelou-se um dos nossos melhores deputados, admiro-o pela sua inteligência, e é alguém em quem já votei mais do que uma vez. Porém, esteve publicamente silencioso durante o período do maior ataque à Liberdade e Democracia que o nosso país viveu nos últimos 50 anos – os chamados “tempos da pandemia” – quando espantosamente não estava sequer condicionado por qualquer espartilho partidário (e ainda que estivesse!), já que à altura era responsável por um ThinkTank chamado +Liberdade.

Uma omissão que seria relevada não fosse o caso de a Iniciativa Liberal evidenciar cada vez mais traços da sua génese e essência fundadora, ou seja, seguindo ativamente toda e qualquer agenda dita progressista, sinalizadora de suposta virtude, fazendo concessões morais em troca de ser aceite pelo bem-pensismo urbano-relativista em questões como o aborto ou a eutanásia, ou alimentando fantochadas e folclore da cultura woke, importando para o nosso país os piores e mais reles preceitos que se vão adoptando noutras sociedades podres e enfermas.

Na área económica a IL continua também sem perceber que antes da baixa de impostos é preciso reduzir a despesa pública. Não só em termos relativos, mas sobretudo em valor absoluto. A liberdade das pessoas aumenta não pela maior eficiência da utilização de verbas provenientes do roubo fiscal nem pela competência no uso do dinheiro dos impostos, mas pela inequívoca e corajosa redução estrutural e permanente do tamanho e âmbito do Estado. Objetivo este de que continuamos sem ouvir palavra relevante da IL.

Sabe-se que é da natureza dos partidos querer transpor os seus programas para letra de Lei e, por isso, só a acne dos hiperbólicos ativismos políticos e fantasias adolescentes impedem constatar que a liberdade das pessoas tende a ser inversamente proporcional ao número de ideias que os partidos têm para a sociedade.

Não obstante, ao Chega não faltam ideias e propostas. Tantas que se contradizem entre si num emaranhado de promessas para todos os gostos e grupos de interesses, revelando a inconsistência doutrinária deste partido e o desvio cada vez mais acentuado de uma rota populista que, assim, provavelmente já vai tarde demais para se orientar num caminho de verdadeira direita conservadora e nacionalista (que em todo o caso não é da minha preferência). O estatismo do CH é sobretudo claro na área económica e surpreende-me até quem só recentemente disso se apercebeu. É pena que assim seja porque como comentou em Novembro Pedro Passos Coelho além de não ser antidemocrático o Chega tem trazido para o debate temas muito relevantes esquecidos pelas restantes formações políticas e tem dedicado uma atenção especial à chamada “guerra cultural” contra o wokismo, é apologista de um travão à agenda globalista das sinistras elites internacionais e partilha de um sensato e necessário eurocepticismo nas questões que envolvem o posicionamento nacional no quadro da União Europeia. Ao invés, o Chega resolveu vender banha-da-cobra durante esta campanha eleitoral, apresentando um conjunto de medidas contraproducentes e demagógicas que repelem gente como eu, pouco dada a lirismos económicos neomarxistas.

Em eleições não se pretende escolher amigos nem convivas para jantares. A cada um assiste o direito de excluir de sua casa visitas por quem não tem especial simpatia. Mas isso é bem diferente da antidemocrática indisfarçável repugnância e apartheid que dirigentes e formadores de opinião da nossa Direita querem que se faça a uma parte dos Portugueses que votam, representem eles 20% ou 2% do eleitorado. Além de tristes reminiscências trotskistas de uma Direitinha serventuária da Esquerda, as «linhas vermelhas» replicam o mesmo e exato desumano esquema mental em que histérica e facilmente se pretendeu segregar, castigar e quiçá eliminar os «negacionistas» e não- “vacinados” contra a covid19.

Este precedente de excluir o Chega do diálogo, compromissos e acordos com outras forças políticas, além de hipócrita e contraproducente é uma atitude assente num plano inclinado que vê críticos e desalinhados como gente deplorável, algo cuja sequência lógica e rapidamente resvala para uma sociedade fechada e uma distopia totalitária. Somos todos Charlie Hebdo. Somos todos Ucrânia. Somos todos Chega?

Basta esta circunstância para desejar que o Chega tenha uma grande votação nas eleições legislativas de 10 de março. Já agora, suficientemente elevada para ser incontornável, ajudando a forçar o espaço da Direita a reformar-se e a encontrar lideranças adultas, recuperando a maturidade democrática e o respeito pelo voto livre de Portugueses. Até porque, como escrevi em julho passado, o melhor que poderia acontecer ao PSD e à IL seria o Chega integrar um governo de Direita. E o pior que poderia acontecer ao Chega seria fazer parte do Executivo.

Então, no fim de contas, não havendo um Javier Milei português, qual a opção de quem considera um imperativo categórico tirar o PS do poder? Em que partido vota alguém que por razões tácticas é incapaz de subverter os seus princípios morais votando AD, mas simultaneamente não quer tirar votos à coligação para evitar o mal maior?

Não vota em nenhum.

Título e Texto: Telmo Azevedo Fernandes, Blasfémias, 16-2-2024

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