domingo, 11 de fevereiro de 2024

[As danações de Carina] Carnaval, a eterna válvula de escape dos que não têm onde cair vivo. O morto, esse tomba em qualquer lugar

Carina Bratt 

O CARNAVAL, essa festa exuberante e pulsante, a meu entender, uma desgraça vinda dos quintos do inferno, para muitos é um turbilhão de cores, ritmos e emoções. Suas raízes remontam à Antiguidade, quando povos celebravam os deuses com orgias e subversões temporárias de papéis sociais. Hoje, no Brasil (no nosso Brasil sofrido, onde a cada dia aumenta os moradores das ruas, os que têm fome e sede (principalmente de justiça) tentam sobreviver nas esquinas) ele, o carnaval, se tornou uma explosão de alegria, uma paleta de tons vibrantes que pinta as ruas e corações. Uma pena, infelizmente. 

Na Babilônia, os Sacéias e seus prisioneiros temporários, vestidos como reis, dançavam iguais putas entre o êxtase e a tragédia. O rei, humilhado diante da estátua de Marduk, simbolizava a submissão à divindade. Hoje nós somos esse rei e a estátua de Marduk, tanto pode ser o nosso governo faminto por dinheiro, como nossos ministros do STF, ou os (SAFADOS TROMBANDO OS FAMIGERADOS), via outra, os nossos ladrões de colarinhos brancos chafurdando no Senado e na Câmara. Toda essa galera de vigaristas e safardanas não vai além da essência da transformação, ou melhor dito, no sustentáculo da inversão de papéis. 

Por conta dessa balbúrdia, ecoa nas fantasias e máscaras do nosso Carnaval, a degenerescência de uma nação inteira à beira de uma tragédia anunciada. O Brasil é um câncer sem cura anunciado. Adversidade sem cura, sem antídoto, sem amanhã. Os bacanais greco-romanos, dedicados a Dionísio (ou Baco), eram festas de vinho e prazeres carnais. A putaria corria à solta. Pior que na Cracolândia, centro de São Paulo. A embriaguez e a entrega aos sentidos encontravam ou ainda encontram subsídios inquestionáveis nos desfiles, nos beijos roubados e nas batidas do samba. O Carnaval pode até ser o momento em que o mundo vira de cabeça para baixo, e a ordem social se dissolve em desordem social usque risos, pilantragens e abraços. 

No Brasil de um tal de Pedro Alvares Cabral, o Carnaval chegou com os seus descendentes portugueses e suas brincadeiras de entrudo. Água, farinha e tinta voavam pelas ruas, e todos se entregavam à folia. Com o tempo, o samba, o frevo e o maracatu se entrelaçaram nessa dança satânica, criando uma sinfonia orquestral única que todos os anos, pulsa nos quatro cantos do país. As escolas de samba, verdadeiras constelações de paixões e farta criatividades, desfilam com suas alegorias e enredos. As ruas se enchem de blocos, e os corações se inflamam. A plebe se esquece da fome, da pobreza, do trabalho, dos políticos, do voto errado que vendeu em troca de um prato de comida ou de um copo de cerveja acompanhado de uma picanha. 

O Carnaval sem sombra de dúvida, é o momento de extravasar, de ser quem somos ou quem queremos ser. E quem deveríamos ser? Pois sim!  Kikikikikiki. É a celebração da vida, da carne, da putaria, da luxúria, da música e apregoam alguns, do amor. Dessa forma, entre tapas e beijos, confetes e serpentinas, nos perdemos e nos encontramos. Somos todos foliões, dançando na mesma melodia de todos os pecados existentes, pintando o mundo com nossos sorrisos comprados numa birosca de esquina. O Carnaval é a lembrança negra, escura, embaciada de que, por alguns dias, podemos ser reis, rainhas ou simplesmente nós mesmos, sem julgamentos. 

Então, que as plumas e os tambores nos levem para os quintos, além das degradações e dos desdouros do cotidiano. Que o Carnaval seja a nossa tela em branco, onde pintaremos os nossos sonhos e desejos de um futuro que nunca chegará, pelo menos até que tomemos consciência da nossa total imbecilidade.  E que, ao final da festa, guardemos no coração a certeza de que a vida é uma dança sem lógica, e nós (todos nós) somos os protagonistas dessa história colorida que deixa de ser florida e alegre, saltitante e esperançosa na manhã da QUARTA-FEIRA DE CINZAS. 

Título e Texto: Carina Bratt, da Lagoa Rodrigo de Freitas, no Rio de Janeiro, 11-2-2024  

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Um comentário:

  1. Beleza de texto. O Cão que fuma e seus escritores como a Carina andam sumidas e fazem falta.
    Voltem mais vezes pois fazem falta.
    José Manuel

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